terça-feira, 15 de novembro de 2016

REFLEXAO SOBRE A GUERRA CIVIL NO SRI LANKA, EM “LIVRE DOCÊNCIA” DO MAJOR DE INF SILVA ANLI, NO ISEDEF, 2016. Caros colegas do ISEDEF, Académicos e Similares, ao estudarmos a “guerra civil no Sri nnLanka” queremos nos propor uma pesquisa que nos permita perceber as motivações das guerras civis, embora este caso não seja de África, pois é da Ásia, mas nos estudos seguintes procuraremos trazer um “estudo do caso africano”. Caros colegas, os estudos sobre as guerras civis são úteis, porque nos permite procurar um entendimento universal das suas motivações, e isso ajuda-nos a potenciar o nosso reportório de conhecimento aqui no ISEDEF. Caros colegas, começamos por fazer uma breve caraterização do país e uma resenha histórica do mesmo, com o objetivo de enquadrar o conflito no respetivo contexto de decorrencia da guerra civil. Para melhor detalhe iremos abordar algumas especificidades da guerra civil, que nos ajudarão a compreender o contexto da guerra, designadamente o tipo de estratégia/geoestratégia utilizada pelo Governo e pelos rebeldes de “Liberation Tigers of Tamil Eelam” (LTTE), as possíveis causas da guerra e a influência exercida por outros fatores exógenos ou mesmo endógenos, como a diáspora e as grandes potências mundiais e demais atores substantivos, (…)! Ainda assim, caros colegas, descreveremos depois a intervenção da ajuda internacional durante a guerra e debateremos a sua possível influência sobre o desenrolar do conflito em si mesmo no terreno. Para o efeito, fazemos uma caraterização geral da ajuda, traçamos as suas principais estratégias e revemos algumas posições sobre a influência da ajuda em geral em certas ONGs, caros colegas. Uma breve caracterização do país, caros colegas A República Socialista Democrática do Sri Lanka situa-se numa das ilhas do Oceano Índico, na Ásia, a sul da Índia. Tem uma área total de 65.610 Km2, sendo 64.740 Km2 de terra e 870 Km2 de mar, com uma faixa costeira de 1.340 Km. É um país essencialmente plano, embora tenha montanhas na parte centro-sul do interior. O ponto mais alto é Pidurutalagala com 2.524m. Veja esta caraterização do Sri Lanka na fonte The world factbook no site: www.cia.gov/cia/publications/factbook/geos/ce.html. Representação topográfica do Sri Lanka Os principais recursos naturais são a pedra calcária, grafite, minerais, pedras preciosas, argila e energia hidráulica. Relativamente ao uso da terra, 13,43% é arável, 15.78% são produções permanentes e 70.79% tem outro tipo de uso. A capital é Colombo. No entanto, a capital legislativa é Sri Jayewardenepura. Em termos administrativos, o país está dividido em oito províncias: Central, Centro- Norte, Sabaragamuwa, Sul, Uva, Ocidental, Norte e Leste. No Sri Lanka, existem vários grupos étnicos que se dividem em budistas cingaleses (74%), hindu Tamil (18%), Moor (7%) e Burgher, Malay e Vedda (1%). Tem um total de 19.742.439 habitantes, segundo o recenseamento de 2003. Porém, desde o rompimento das hostilidades, muitos civis Tamil abandonaram a Ilha, sendo que, em 2000, cerca de 65.000 foram realojados em campos de refugiados no sul da Índia, 40.000 passaram a viver noutros campos fora da Índia e mais de 200.000 procuraram abrigo em diversas regiões do Mundo, com particular destaque nas zonas ocidentais. O Sri Lanka alcançou a independência a 4 de Fevereiro de 1948. É uma República, cujo Chefe de Estado é também o Chefe de Governo, apesar da existência de um primeiro-ministro. O parlamento é unicameral com 225 lugares, sendo os seus membros eleitos por voto popular. A nível político-económico, o país alterou as suas políticas estatais e a respetiva estratégia de industrialização por substituição de importações por novas políticas orientadas para o mercado e para as exportações. Os setores mais dinâmicos são a produção de bens alimentares e bebidas, têxteis, telecomunicações, seguros e a banca. Em 1996, a produção agrícola representava apenas 20% das exportações (em comparação com os 83% registados em 1970), enquanto o setor têxtil e o vestuário constituíam 63%. O PIB teve um crescimento anual médio de 5.5% no início da década de 90 até que a seca e a deterioração da segurança interna diminuíram esse valor para 3.8% em 1996. Entre 1997 e 2000, a economia teve um crescimento médio de 5.3%, mas, em 2001, assistiu-se à maior retração económica na história do país (1.4%), devido a questões políticas, a problemas orçamentais, ao abrandamento global e ainda ao continuado ambiente de conflito interno. Esse valor voltou a recuperar para 3.2% em 2002. As exportações do país movimentaram, em 2002, 4.6 mil milhões de dólares, sendo os principais parceiros os EUA (39,1%), o Reino Unido (12.9%), a Bélgica (4.7%) e a Alemanha (4.5%). Quanto às importações, movimentaram 5.4 milmilhões de dólares e os principais parceiros de importação foram a Índia (11%), Hong Kong (7.6%), Singapura (7.1%), China (6.3%), Taiwan (5.9%), Coreia (5.7%), Japão (5.3%) e Irão (4.2%). Caros colegas, o Sri Lanka tem um rendimento per capita de 814 USD, colocando-se em nonagésimo primeiro lugar num total de 175 países. Quanto ao Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), era 0.697 em 1990, tendo evoluído para 0.719 em 1995 e para 0.741 em 2000. Segundo dados de 1998, o Sri Lanka recebeu 577 milhões de dólares de ajuda económica, sendo a sua dívida externa de 9.8 bilhões de USD. Por último, a nível militar, o país tem despesas no valor de 719 milhões de USD, que representam 4.2% do PIB. Caros colegas, apesar do país ter alcançado sempre bons resultados em termos de desenvolvimento social, com um taxa de literacia adulta de 91%, a performance económica do Sri Lanka tem sido inferior à de outros países do Sul e do Sudeste Asiático. Uma das principais razões apontadas para esta discrepância, é, segundo GOODHAND & ATKINSON (2001:24-28), a guerra civil. Caros colegas, agora vamos discutir a breve história do país Remontando ao século XVI, refira-se a chegada dos portugueses a Ceilão (antiga designação do Sri Lanka) em 1505 ou 1506, na sequência de uma forte tempestade no mar e de ventos adversos que os levaram a atracar. A presença portuguesa em Ceilão levou à assinatura de um acordo com o Rei de Ceilão, a partir do qual a Ilha foi dividida em quatro reinos: Kotte (o mais importante), Sitawaka, Kandy e Jaffna. Em 1518, os portugueses construíram um forte em Colombo, que seria depois invadido pelos cingaleses. Em 1524, acabaram por destruí-lo e retirar-se da Ilha, mantendo apenas um representante sob a proteção do reino cingalês em Kotte. A retirada portuguesa de Colombo levou à conquista do reino de Kotte pelos mercadores muçulmanos e à reconquista do comércio de canela. No entanto, estes foram vencidos pelos poucos portugueses ainda presentes na Ilha. Nessa altura, os “Mappillas” (os muçulmanos “malabar”), que alimentaram um conflito dinástico nos reinos de Sitavaka e Kotte até 1539, opuseram-se àpresença portuguesa, que conseguiu novamente vencê-los em 1538 e 1539, permanecendo na Ilha e dando início a uma missão de evangelização Já em 1550, 500 soldados portugueses chegaram a Ceilão para ocupar Kotte e saquear Sitawaka. Desde então, a presença portuguesa foi-se acentuando e, em 1556, cerca de 70.000 pessoas pertencentes a uma comunidade de pescadores da costa sul de Colombo foram convertidas ao Cristianismo, bem como os reinos de Kotte, Dharmaopala e “Queen”, além de serem adoptados alguns títulos de nobreza e a língua portuguesa. Veja in: www.worldstatement.org/Sri_Lanka.html, RAMERINO (1999), OFSTAD (2000), ou Ver RAMERINO et al (2001). Até ao final do século XVII, os portugueses foram os senhores de Colombo, Galle, Kalutara e Negombo e continuaram a marcar presença em Jaffna e Nallur. Depois da morte do Rei D. João Dharmaopala em Colombo, sem herdeiros, foi acordado que o reino seria doado ao Rei de Portugal. O então Rei D. Filipe de Portugal e Espanha foi proclamado Rei de Ceilão, estando todo o território do reino de Kotte sob o controlo português, excepto Kandy. Em 1602, chegou a Ceilão a primeira expedição holandesa, que atracou num porto de Batticaloa que nunca havia sido ocupado pelos portugueses, tendo aí estabelecido boas relações com o Rei de Kandy contra os portugueses. A presença portuguesa terminou definitivamente em 1658. Nesse ano os holandeses tomaram Colombo e Ceilão tornou-se uma colónia holandesa. Mais de um século depois, em 1796, a Ilha foi ocupada pelos ingleses, tornando-se uma colónia do Reino em 1802 e sendo unida pela lei britânica em 1815. Durante o “British Raj” isto é, entre 1858 e 1947, a minoria Indú tamil da colónia de Ceilão apoderou-se de parte significativa dos postos governamentais que era superior à sua percentagem de população e extremamente desproporcional entre os homens de negócios. Pouco tempo após a independência do Sri Lanka, em 1948, esta vantagem étnica provocou um certo clima de ressentimento. Aquando das eleições de 1956, ambos os partidos cingaleses prometeram que o cingalês seria a única língua oficial. A plataforma do partido vencedor chamava-se “Sinhala Only”. Nessa altura, o principal partido Tamil veio pedir uma região independente da língua Tamil e um Sri Lanka federal. Não tendo sido aceite tal reivindicação, a violência eclodiu em 1958 após terem surgido rumores de que um Tamil tinha morto um cingalês. Ocorreu sob a forma de motins inter-comunas e provocou centenas de mortes, principalmente entre os Tamils. Caros colegas, segundo a WIKIPEDIA, o “British Raj” é a designação informal do período de mandato britânico no sub-continente indiano, actualmente Índia, Paquistão e Bangladesh. Durou de 1858, quando a Companhia Britânica das Índias de Leste passou para o comando da coroa, até 1947, aquando da independência da Índia e do Paquistão. No início da década de 60, surgiu uma nova vaga de violência inter-comunas na altura em que as políticas do partido “Sinhala Only” foram implementadas. Mais tarde, durante as eleições de 1977, o principal partido Tamil voltou a exigir a independência, tendo sido iniciada uma onda de terrorismo pelos “Tigres para a Libertação da Pátria Tamil” (LTTE) , mais conhecidos por “Tigres Tamil”, que teve como primeira ação o assassinato do presidente de Jaffna. Logo após as eleições, surgiram novos rumores de que os rebeldes Tamil tinham morto um polícia cingalês, o que provocou novo motim do qual resultaram 300 mortes. Em 1983, morreriam mais de 400 pessoas às mãos dos Tamil. Os acontecimentos que marcaram o Sri Lanka entre 1977 e 1983 conduziram ao início de uma guerra civil. Em 1983, os Tigres Tamil desencadearam ataques suicidas bombistas em larga escala, que tiveram como reação do Governo o desenvolvimento do uso de pelotões de choque espalhados por todo o território Tamil. Desde então, verificaram-se alguns períodos de cessar-fogo e de negociações para a paz, mas, em todas as ocasiões, o processo foi quebrado pelo LTTE, como afirma OFSTAD (2000:1-6). Em 1987, a Índia mediou um acordo de paz que foi aceite por outros grupos militantes Tamil também envolvidos na luta armada, que passaram, desde então, a colaborar com as forças governamentais contra o LTTE. No original, “Liberation Tigers of Tamil Eelam”. LTTE é a sigla inglesa, como acima demonstramos. Em 1990, o LTTE tomou controlo físico sobre a Península e a cidade de Jaffna, que é a capital tradicional e cultural da comunidade Tamil no Sri Lanka, e ainda sobre a maioria dos distritos do norte - na região de Vanni, - e sobre grandes áreas nas províncias de leste. Depois de subir ao poder em 1995, o Governo da Aliança Popular apresentou um pacote de medidas políticas que incluía a reforma constitucional e a reformulação do Sri Lanka de Estado único para uma república soberana constituída por uma união de regiões, (OFSTAD, 2000:1-2). Todavia, este pacote chumbou no Parlamento e, após as eleições parlamentares de 2000, a coligação governamental tornou-se ainda mais frágil. Na primeira metade de 1996, as forças governamentais voltaram a ganhar controlo sobre a península de Jaffna, mas, em meados de 2000, o LTTE já tinha voltado a recuperar uma parte da Península, desencadeando fortes conflitos nos arredores da cidade. Finalmente, em Fevereiro de 2002 e após quase duas décadas de guerra, o Governo do Sri Lanka e os Tigres Tamil assinaram um Memorando de Entendimento sobre o cessar-fogo. O primeiro tinha ocorrido em 1995, mas durou apenas 4 meses. O Governo norueguês mediou as negociações até que, quando se discutiam algumas partes do acordo na Tailândia em Novembro de 2002, um tribunal em Colombo determinou uma sentença in absentia de 200 anos de prisão para o líder dos Tamil, Vellupillai Prabhakaran, por conspiração no ataque bombista que havia morto 100 pessoas em 1996. Nessa altura, temeu-se que a Presidente do Sri Lanka – ela própria gravemente ferida pelos Tamil – tentasse impedir o Primeiro- Ministro (do partido cingalês da oposição) de continuar com as negociações, mas não aconteceu. A guerra civil no Sri Lanka provocou pesados custos humanos e económicos, causando a morte a mais de 70.000 pessoas, na sua maioria combatentes, e implicou o deslocamento de mais de 1 milhão de pessoas ao longo do tempo. Caros colegas, vejamos agora as especificidades da guerra civil e as estratégias do Governo e do LTTE Caros colegas do ISEDEF, o caso do Sri Lanka pode ser resumido, recorrendo à descrição de TOMMASOLI (2003:8-119), como o exemplo de um país com uma democracia já estabelecida há algum tempo, onde a guerra não terminou com um acordo de paz, tendo a violência continuado de uma forma ou de outra e onde o Governo não controlava uma parte do território. OFSTAD (2000:18-23) distingue quatro zonas de conflito: 1. as áreas sob controlo do LTTE, principalmente Vanni e as zonas a leste; 2. as áreas anteriormente sob controlo do LTTE, mas que foram recapturadas pelas forças governamentais, principalmente a Península de Jaffna desde 1996; 3.as áreas fronteiriças com grandes riscos de insegurança, em que as lutas ocorreram nas partes a leste, em Vanni e nos distritos vizinhos; 4. o resto do país, que não foi directamente afetado pela guerra e onde vive cerca de 85% da população. O autor resume a estratégia do Governo do Sri Lanka em três objectivos: 1. isolar o LTTE da população Tamil e usar os militares para reduzir a capacidade de luta do LTTE, de forma a obrigá-los a negociar um acordo de paz; 2. negociar uma solução política baseada numa forte devoção ao poder nas províncias e outras reformas que assegurassem oportunidades iguais e o respeito pelos DH e 3. viabilizar a reabilitação económica e a reconstrução nas áreas afetadas pelo conflito após a restauração da paz. Além das políticas levadas a cabo para alcançar estes objetivos, a política governamental foi também, segundo OFSTAD (2000:2-8), influenciada pela ajuda internacional, o que se reflectiu na preocupação em reduzir a internacionalização do conflito e limitar a presença das organizações humanitárias nas zonas de conflito, através da imposição de uma série de restrições à presença das mesmas. O Governo tomou medidas para ostracizar o LTTE e para reduzir todas as ligações internacionais que pudessem ser vistas como forma de reconhecimento. OFSTAD (2000:3-9) refere ainda o fato de o Governo ter utilizado uma política dupla no que concerne ao desenvolvimento e à reconstrução de Jaffna e da zona Leste. Ao mesmo tempo que manifestou interesse em reconstruir e desenvolver essa região, mantinha as sanções e um rígido controle militar, o que dificultava a concretização desses objetivos. O LTTE, por sua vez, tinha o objetivo de estabelecer um Estado independente para a comunidade Tamil no norte e no leste, o que implicava eliminar os opositores políticos dos Tamil e fazer uma limpeza étnica nas suas áreas de controlo. Ao mesmo tempo, afirma OFSTAD (2000:3-9), queria assumir-se como força política e militar aceite internacionalmente, que representasse e protegesse a comunidade Tamil e que aplicasse as normas internacionais em tempo de guerra sempre que possível. Para levar a cabo o seu objetivo, caros colegas, o LTTE implementou uma estratégia de controlo militar sob determinados territórios, constituindo uma administração civil de facto nessas áreas e efetivamente declarando o “Tamil Eelam”. Caros colegas do ISEDEF, o LTTE manifestou também vontade em negociar politicamente com o Governo do Sri Lanka, preferencialmente através de uma terceira parte intermediária, o que viria a concretizar-se através dos esforços noruegueses para facilitar as negociações desejadas. Nessa altura, caros colegas, foram feitas várias propostas no sentido de fortalecer o poder das unidades regionais ou de estabelecer uma forma de federalismo ou confederalismo. De sublinhar que, segundo OFSTAD (2000:3-9), enquanto o Governo foi eleito numa base de eleições parlamentares multi-partidárias e eleições presidenciais, o LTTE nunca participou nas eleições e nunca aceitou partidos alternativos ou movimentos nas suas áreas de controlo. Uma das principais particularidades da guerra civil no Sri Lanka é que o Governo manteve a sua presença nas áreas controladas pelo LTTE, assegurando às populações dessas regiões os serviços básicos como escolas, centros de saúde, estradas locais e sistemas de água. Para o efeito, os funcionários públicos continuaram a receber os seus salários e pensões e o Governo continuou a dar alimentos aos deslocados e outras vítimas da guerra. No entanto, quer o LTTE, quer as forças governamentais, cometeram sérios abusos de desrespeito dos DH, incluindo desaparecimentos, torturas e assassinatos, como afirma OFSTAD (2000:3-18). Ambos foram acusados de não aderirem às Convenções de Genebra sobre Proteção de Civis durante a Guerra. Apesar disso, diz o autor, é de consenso geral que o Governo melhorou o seu respeito pelos DH na segunda metade da década de 90, comparativamente com os finais dos anos 80 e início dos anos 90, (OFSTAD, 2000:3-19). Já o LTTE é responsável pelo assassinato de vários líderes políticos (incluindo presidentes, ministros e membros do Parlamento) e por colocar bombas contra alvos civis em Colombo e noutras cidades. O LTTE é mesmo “reconhecido como uma das mais sofisticadas e mortíferas organizações rebeldes no mundo”, afirmam BYMAN et al. (2001:41-97), aplicando métodos como o assassínio seletivo e atos de terrorismo indiscriminados. Caros colegas do ISEDEF,vejamos agora as causas da guerra civil neste debate FEARON (2002:11-58) caracteriza as guerras civis na Ásia como sendo das mais longas do mundo e como tendo uma dinâmica similar: o Estado é dominado por um grupo étnico maioritário, cujos membros enfrentam a pressão popular nas suas áreas de agricultura tradicional. Em resultado, muitos migram para outras zonas menos povoadas e menos desenvolvidas do país, habitadas por minorias étnicas, designadas por “filhos da terra”. Estas, por vezes, desencadeiam rebeliões contra os migrantes e contra o apoio do estado aos mesmos. Foi o que aconteceu aos Tamils no norte e no ocidente do Sri Lanka, bem como na China, no Paquistão, na Papua Nova Guiné e noutras regiões. A causa mais importante da guerra no Sri Lanka será a composição étnica da sociedade. Como já tínhamos referido e de acordo com COLLIER et al. (2003:57-149), se uma grande diferenciação étnica e religiosa reduz significativamente o risco de guerra civil, uma diferenciação mais limitada pode ser mais problemática já que o grupo étnico dominante forma a maioria na sociedade, fazendo aumentar o risco de rebelião pelas minorias. ARMON, CARL & PHILIPSON (1998:1-173) explicam que o conflito étnico nacional marcou o Sri Lanka durante 50 anos, desde a independência até que, em 1983, degenerou em guerra civil. Além disso, o conflito no Sri Lanka é “(...) o caso claro de que a retórica da mobilização étnica cristalizou gradualmente uma profunda polarização que não assenta em pilares históricos primordiais”, afirma MUSCAT (2000:60). O conflito terá tido origem “(...) em longas percepções estereotipadas e no medo dos papéis económicos, direitos territoriais, étnicos e históricos, e ameaças culturais”. Neste contexto, o programa de liberalização exacerbou as hostilidades inter-étnicas, não tendo ponderado as suas implicações no conflito. GOODHAND & ATKINSON (2001:25-85) apontam outras especificidades desta guerra civil, designadamente o fato de o conflito não ser uma causa ou uma consequência de um Estado colapsado ou ser um Estado falahado, por outras palavras, caros colegas. Os autores afirmam que “uma aparente anomalia da guerra no Sri Lanka é que a democracia, o comunalismo e o conflito desenrolaram-se ao mesmo tempo e alimentaram-se uns aos outros”. Curioso também, consideram os autores, caros colegas, é o fato de a força motora da guerra ter continuado a ser a injustiça política e não a “cobiça”, (como já tinhamos discutido em reflexões anteriores), apesar de ser um conflito prolongado no qual se desenvolveram alguns interesses económicos que beneficiariam da sua continuação. Caros colegas do ISEDEF, a propósito das tensões resultantes de desigualdades entre a minoria tamil e a maioria cingalesa desde o início da década de 80, o PNUD (2004:41-187) explica que “os administradores coloniais favoreceram economicamente a minoria tamil, mas essa vantagem foi seriamente revertida quando os cingaleses conquistaram o poder e marginalizaram cada vez mais a minoria tamil, em áreas como as oportunidades de educação, o recrutamento para o funcionalismo público ou a política linguística”. Vejamos agora a influência da diáspora nesta guerra civil O factor diáspora (nos países ricos) é, como vimos em debates anteriores, extremamente influente na eclosão e no prolongamento do conflito, na medida em que o aumento do número de emigrantes provenientes dos PED foi acompanhado de um aumento do financiamento pela diáspora. Exemplo disso é a comunidade Tamil nos países da OCDE, superior à mesma na Península de Jaffna, de acordo com COLLIER et al. (2003:146-98). As estimativas indicam que as organizações de diáspora Tamil deram mais de 450 milhões de USD/ano na década de 90, canalizados para a aquisição de armas pelos Tigres Tamil. Um exemplo prático dessa situação foi o ataque bombista que ocorreu em 1996, utilizando explosivos provenientes do leste europeu adquiridos com fundos de uma conta bancária em Singapura, aberta por um canadiano originário do Sri Lanka. Esse ataque em Colombo matou 86 civis e feriu mais de 1.400. Segundo BYMAN et al. (2001:41-86), o LTTE contou sempre com grande apoio dos Tamil no país e teve sempre recursos consideráveis, pelo que requeria menos apoio externo. Por isso, mesmo que houvesse um corte no apoio da diáspora, o LTTE continuaria a ser uma força militar e política potente, ainda que diminuída. De resto, ainda segundo BYMAN et al. (2001:45-86), o LTTE desenvolveu métodos de propaganda extremamente sofisticados que tinham como alvo a diáspora Tamil e também os governos hostis. Essa propaganda é difundida através de emails, internet, linhas telefónicas, mailings, livrarias, programas de televisão e de rádio, entre outros. Os seus resultados, afirmam os autores, foram muito mais potentes que qualquer campanha do Governo cingalês, seu rival. COLLIER et al. (2003:146) indicam que só recentemente os países industrializados começaram a banir o apoio da diáspora. Desde então, as remessas da diáspora para os Tigres Tamil foram substancialmente reduzidas, o que teve uma grande influência na redução das exigências dos rebeldes no país. Só em 2002 os Tigres Tamil abandonaram a sua reivindicação de independência e aceitaram negociar a paz. A influência dos atores externos Sublinhámos já a importância relativa da dimensão internacional dos conflitos civis, em debates já concluídos, designadamente a influência exercida pelas potências mundiais como os EUA. Porém, no caso do Sri Lanka, esse fator é de menor importância, uma vez que não teve um forte envolvimento de uma superpotência ou de poderes regionais, como afirmam GOODHAND & ATKISNON (2001:25-64). A Índia defendeu naturalmente os direitos civis e políticos dos Tamil, sem agitar as exigências separatistas dentro das suas próprias províncias e de forma a evitar uma intervenção excessiva por parte das potências internacionais suas rivais, como indica o ACCORD (1998:8-19). Porém, e apesar desses objetivos se terem mantido consistentes, os métodos indianos para os alcançar variaram substancialmente. O ACCORD (1998:8-17) relata que, a partir de 1983, o Governo indiano treinou e armou vários grupos militantes Tamil; coagiu militantes e o Governo do Sri Lanka a participar em conversações de paz; financiou o estabelecimento de uma nova delegação do Governo Regional através no Sri Lanka e enviou uma força de manutenção de paz indiana para assegurar o cessar-fogo nas zonas norte e leste da Ilha. Porém, em 1989, essa força envolveu-se numa guerra viciosa contra o LTTE, o que levou ao crescimento da oposição doméstica e militar contra a intervenção no Sri Lanka. Também o novo Governo cingalês se opôs à cooperação com a Índia e exigiu a retirada da força de paz do país em 1990, no mesmo ano em que o LTTE assassinou o ex-Primeiro Ministro Rajiv Gandhi, diz o ACCORD (1998:8-16). O papel do Governo indiano no Sri Lanka foi, assim, silenciado até 1994 quando a Índia apoiou a campanha do Governo da Aliança Popular para marginalizar o LTTE. O ACCORD (1998:10-11) indica que o interesse norte-americano aumentou depois de 1977, devido à abertura económica do país no refrear das relações entre o Sri Lanka e a Índia. Já após o fim da Guerra Fria, o potencial para investimento norte-americano no país aumentou e as relações entre os dois países melhoraram. Em 1998, o ACCORD (1998:11) indicava que as forças especiais norte-americanas treinaram o exército do Sri Lanka, mesmo em situações de combate, ao mesmo tempo que o Governo norte-americano desempenhou um papel importante na denúncia das atividades terroristas do LTTE. A mediação do conflito pela Noruega O cessar-fogo e a assinatura do Memorando de Entendimento em 2002 foram acompanhados pela Missão de Monitorização do Sri Lanka (MMSL), que se tratou de uma operação nórdica, liderada pela Noruega e que teve como objetivo monitorizar o cessar-fogo e impedir que as partes violassem o Acordo de Paz. CRAVO (2004:165-198) explica que “a Noruega agarrou a janela de oportunidade que se vislumbrava no conflito do Sri Lanka e forneceu às partes envolvidas apoio para o recomeço do processo político, tirando, oportunamente, vantagem das mudanças nacionais e internacionais favoráveis”, nomeadamente a exaustão da população face à guerra; o reconhecimento pelas partes da necessidade de um acordo político, a insustentabilidade do número de mortes perante a comunidade internacional. Segundo SAMSET (2004a:2-12), o Governo norueguês preocupou-se em incluir no acordo cláusulas sobre os passos que cada lado deveria dar e sobre as medidas a tomar para manter a paz e construir a confiança. No entanto, a força técnica do acordo enfatizou apenas a questão central sobre o compromisso de cada parte em manter e respeitar a paz. O Memorando de Entendimento de 2002, em oposição aos anteriores, levou a uma interrupção eficaz do fogo entre as partes que dura até hoje. Porém, apesar das partes rejeitarem o regresso à guerra, elas continuaram a cometer muitos actos contra civis, interpretadas pelo Acordo como violações ao cessar-fogo. SAMSET (2004: 13-14) indica que, entre Fevereiro de 2002 e Junho de 2004, a MMSL recebeu 2524 queixas de violações do Acordo de Cessar-Fogo (efetivamente consideradas como tal), o que representa cerca de três violações por dia no pós-guerra. Dessas, 95% (2412 violações) terão sido cometidas pelo LTTE, tratando-se mais de metade de recrutamento forçado de crianças para os Tigres. Além disso, a própria MMSL terá sido irrealista e pouco imparcial no acompanhamento do cessar-fogo, segundo SAMSET (2004:10-19). Por exemplo, a MMSL deveria realizar-se nas zonas norte e leste do país. Porém, devido à falta de recursos, optou-se por monitorizar apenas as zonas dominadas pelo LTTE, o que implicou que as violações cometidas pelo Governo não fossem reportadas. Essa opção exacerbou também as divisões étnicas, na medida em que, para a população, significou que era mais importante o sofrimento dos Tamil do que dos budistas cingaleses. SAMSET (2004:12-24) considera ainda problemático o facto de o cessar-fogo ter reconhecido implicitamente o LTTE como único representante do lado anti- Governo, quando se sabe que os Tigres suprimiram ativamente e de forma violenta outros grupos de oposição ao Governo. Além disso, a autora indica que o Acordo previu o desarmamento dos grupos para-militares Tamil não-LTTE, tendo, com isso, ajudado o LTTE a ganhar duplamente: a vitória simbólica por ser o único representante Tamil e a vitória no terreno contra os seus opositores. Também CRAVO (2004:165) considera que “o processo de paz foi (...) ensombrado por uma série de incidentes, de tal forma que, em 2003, parecia estar arruinado com a suspensão das negociações. A autora explica que, se por um lado, o LTTE tem-se mostrado intransigente e politicamente reforçado na região norte e leste do país, por outro lado, os principais países cingaleses têm-se mostrado incapazes de cooperar entre si. Essa fragmentação política deu espaço a que os partidos da oposição e os grupos budistas nacionalistas se afirmassem cada vez mais, opondo-se a possíveis concessões federalistas aos Tamil e também à crescente intervenção externa. Consequentemente, tem sido feita pressão para a retirada da Noruega, que, segundo CRAVO (2004:165) é “acusada de favorecer o LTTE nas negociações”. Descrição geral da ajuda Internacional e a sua influência no conflito A descrição estatística da APD terá por base o período 1980-2002, iniciando-se três anos do começo do conflito no Sri Lanka, e resulta do cruzamento de informação de uma base de dados da OCDE. Segundo os dados da OCDE, o total da APD de 1980 a 2002 foi de mais de 5 mil milhões de dólares. O gráfico abaixo mostra essa evolução: Gráfico da APD dada ao Sri Lanka por ano e por tipo de 1980 a 2002 A ajuda oscilou bastante durante esse período, com muitas descidas e aumentos abruptos. Verifica-se, por exemplo, uma forte diminuição da ajuda no ano em que eclodiu a guerra (1983), no entanto, tendo sido compensada no ano seguinte. Ao longo do tempo predominaram claramente os empréstimos concessionais da APD, seguidos dos donativos oficiais. Esse tipo de ajuda tende a oscilar mais, na medida em que, como vimos em debates anteriores, reage mais ao ambiente político do país receptor impondo-lhe condicionalidades. A predominância dos empréstimos é mais perceptível no gráfico abaixo, onde se verifica também que 64% corresponderam a empréstimos, 34 % a donativos e que o investimento de equidade, os outros fluxos oficiais e outros donativos têm pouca ou nenhuma expressão no gráfico. O gráfico abaixo expressa o peso relativo dos vários tipos de APD dada ao Sri Lanka de 1980 a 2002 Quanto aos setores a que se destinou a ajuda, destacam-se a energia (19%) e a agricultura, florestas e pescas (16%) e o transporte e armazenamento (14%) como indica o gráfico abaixo. O gráfico abaixo indica o peso relativo dos principais tipos de APD por sector (1980-2002) peso relativo dos principais tipos de APD por sector (1980-2002) O gráfico baixo permite-nos visualizar a evolução da ajuda durante a guerra (e nos 3 anos que a antecederam) por doador (no quadro da OCDE) Gráfico que mostra APD (Bilateral e Multilateral) dada ao Sri Lanka por doador (1980-2002) Caros colegas, o principal doador bilateral foi o Japão (4.264 milhões de USD)270. A OECD (2004) indica que a APD dada por este país à Ásia corresponde a 74% da sua ajuda bilateral, sendo que, entre 2001 e 2002, o Sri Lanka estava incluído na lista dos dez países que mais ajuda receberam do Japão271. Seguiram-se-lhe a Alemanha (653 milhões USD), a Suécia (516 milhões USD), o Canadá (398 milhões), a Holanda (389 milhões) e os EUA (356 milhões). Ao nível multilateral, verifica-se a primazia do AsDF (Asian Development Fund) com 2.434 milhões de USD273. GOODHAND e ATKINSON (2001:26) salientam também o papel do BM que, através da IDA, teve uma enorme influência na modelação da política económica governamental. Segundo os dados da OCDE, o BM (BIRD e IDA) deu 2.315 milhões de USD ao Sri Lanka, dos quais mais de 90% foram provenientes da IDA. Caros colegs, o Japão tem desenvolvido esforços para mediar diferentes conflitos na Ásia e para recuperar a sua influência no cenário mundial. Segundo Kakuchi (2002), “trata-se de uma tentativa de utilizar o seu tradicional papel de doador para obter um lugar estratégico no âmbito político mundial”. O autor cita ainda o Professor Hisashi Nakamura, Assessor de Tóquio das conversações de paz do Sri Lanka, segundo o qual “o Sri Lanka é como uma prova para a capacidade diplomática do Japão”. O gráfico a seguir mostra-nos a evolução no tempo da APD pelos cinco principais doadores destacados em debates anteriores. Eis o gráfico da evolução da APD (1980-2002) pelos 5 principais doadores (OCDE) do Sri Lanka O Japão, a IDA e o AsDF são os doadores com maiores picos de ajuda e também com mais oscilações, apesar de serem os maiores doadores. Parecem, assim, ter reagido mais à evolução da situação no terreno, condicionando a ajuda. Ao longo das duas décadas, o Japão aparece sempre como o mais importante doador. A evolução da ajuda da Suécia e da Alemanha é bastante semelhante ao longo do tempo, apesar de a Alemanha registar alguns picos na década de 80. A Alemanha é a única que regista um aumento da APD nos três anos que antecederam a guerra, descendo a pique em 1982. Apenas o Japão e a IDA, sendo o primeiro de forma mais visível, aumentaram a ajuda em 2001, provavelmente devido às perspetivas de paz no país, e apenas o Japão e a Alemanha a diminuíram em 2002, face ao retrocesso no processo. Em termos de OIs, as Nações Unidas, o Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV) e a Federação Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho (FICV/CV) tiveram um papel igualmente importante, segundo GOODHAND e ATKINSON (2001:26). Os autores salientam ainda o papel fundamental das ONGs que trabalharam na Ilha em vários setores, incluindo o desenvolvimento da comunicação, os DH, a resolução do conflito e advocacia política. Relativamente aos tipos de ajuda dados ao Sri Lanka, GOODHAND & ATKINSON (2001:27) resumem-nos a três tipos: 1. a APD convencional dirigida ao Governo, focando o ajustamento estrutural, a liberalização, a reforma governamental e o investimento em infra-estruturas; 2. a ajuda humanitária, principalmente orientada para o nordeste do país e com o objectivo de combater os custos sociais do conflito; 3. a ajuda de doadores bilaterais, que apoiaram organizações da sociedade civil em áreas como os DH, a resolução de conflito, desenvolvimento de capacidades e reforma judicial. Sobre a ajuda, os autores afirmaram, em 2001, que “apesar de os níveis de financiamento terem permanecido constantes nos últimos anos, espera-se que eles decresçam a médio prazo. A ajuda tende a declinar significativamente quando o IDE se torna mais importante e os doadores se retiram, quer porque o conflito os impede de alcançar o seu objectivo, quer porque o Sri Lanka deixou de ser prioritário, uma vez que alcançou o estatuto de rendimento médio”, afirmam GOODHAND & ATKINSON (2001:27-97). Os autores alertam também para o fato da probabilidade da ajuda ter impato no processo de construção de paz e tender a declinar quando essa situação acontece. Ainda assim, a curto prazo, “a ajuda é um instrumento político significativo no contexto do Sri Lanka e pode ter uma influência importante no sistema de incentivos e nas estruturas do conflito”. As estratégias da ajuda internacional e os principais tipos de ajuda Os atores humanitários tiveram dificuldaders em entrar no Sri Lanka inicialmente. Segundo o ACCORD (1998:9-21), o CICV só foi autorizado a entrar no país em 1989 depois de uma longa campanha levada a cabo por grupos de direitos civis e de uma forte resistência por parte do Governo. Desde então, o Comité pôde prestar ajuda às vítimas da guerra, visitar prisioneiros e promover as Convenções de Genebra. Durante os anos da administração do LTTE em Jaffna, o CICV manteve contato com os rebeldes, sendo, por vezes, a única organização a fazê-lo. Actuou também como intermediário do Governo e do LTTE entre 1994 e 1995. Quanto a outras ONGs e OIs, o ACCORD (1998:9-98) indica que estas operaram no Sri Lanka, promovendo o desenvolvimento, os DH e outras questões democráticas e ambientais. Muitas trabalharam também a nível político e em prol da reconciliação ao nível das raízes do conflito. Mantiveram-se no país a trabalhar para uma resolução digna do conflito étnico mesmo “apesar de a sociedade civil no norte e no leste ter sido seriamente afectada pela guerra, migração e por uma hegemonia forçada do LTTE”. Parecem ter optado por uma abordagem maximalista da ajuda, tal como a descrevemos nos debates anteriores. O ACCORD (1998:9-98) explica ainda que as ONGs actuaram na corda bamba entre o Governo e o LTTE, tendo que se manter publicamente cingidas ao seu mandato humanitário. Ainda assim, criaram-se dois consórcios: o primeiro juntou ONGs no nordeste do país para partilhar informação e coordenar o trabalho nas zonas afectadas pela guerra; o segundo, com objetivos similares, dedicou-se a todo o Sri Lanka promovendo o lobby humanitário. Em 1994, as ONGs terão mesmo sido encorajadas pelo êxito eleitoral da Aliança Popular. Nessa altura, as iniciativas da sociedade civil aumentaram rapidamente no sul, com numerosas delegações de paz, campanhas de consciencialização e workshops sobre a resolução do conflito, etc. Porém, em meados de 1995, o movimento pela paz foi desfeito devido ao colapso das conversações entre Governo e LTTE. Quanto às Nações Unidas, as agências mais activas no Sri Lanka foram o PNUD e o ACNUR, de acordo com o ACCORD (1998:10-111), tendo este último sido particularmente eficaz na abertura de centros de ajuda (o maior deles em Madhu, na parte ocidental de Vavuniya). O PNUD, por sua vez, geriu um conjunto de programas no nordeste; apoiou o Governo do Sri Lanka na reabilitação de Jaffna e começou as operações de desminagem na Península. O envolvimento da ONU na mediação do conflito provocou reações públicas negativas no sul, o que se deverá, segundo o ACCORD (1998:10-87), à crença de que o lobby Tamil estava sob a influência das Nações Unidas. Relativamente ao financiamento do desenvolvimento e à cooperação com as Instituições de Bretton Woods, o ACCORD (1998:9-76) afirma que, com a sua política comercial relativamente aberta e com alguma estabilidade económica, o Sri Lanka mostrou ser um membro relativamente cooperante com o BM e com o FMI. Ainda assim, a eficiente base de impostos, o impressionante desenvolvimento económico e o apoio significativo do BAD, do Japão e de outros doadores bilaterais, provaram que as finanças nacionais não são desproporcionamente influenciadas pelas instituições multilaterais. Enquanto essas se mantiveram relativamente desligadas do decorrer da guerra, os doadores internacionais impuseram a paz e os DH como condição para a sua ajuda e, no final da década de 80, o Grupo de Doadores de Paris alertou o Governo para parar com a repressão brutal contra os insurgentes no sul do país. Caros colegas, GOODHAND & ATKINSON (2001:27-39) resumem a orientação da ajuda a três formas essenciais. A abordagem predominante consistiu em trabalhar “à volta do conflito”, na medida em que “o conflito é um fator disruptivo a ser evitado”. Nessa perspetiva, os doadores evitavam trabalhar nas áreas afetadas pelo conflito e a ajuda ao desenvolvimento foi suspensa no nordeste do país. Se existiu ligação entre o conflito e o desenvolvimento, explicam os autores, é porque o conflito é visto como o impedimento que pode ser mais facilmente removido com abertura de mercado e desregulação. Os principais seguidores desta abordagem foram o Japão e o BAD que evitaram o nordeste do Sri Lanka até ao final da guerra. Quanto ao BM, começou já a investir no nordeste nos últimos anos, embora o seu programa focasse o sul. A segunda abordagem é a das agências que trabalhavam no nordeste e que foram forçadas a estabelecer uma ligação mais coerente entre os seus programas e o conflito. Em resultado disso, adoptaram programas que lhes permitiram trabalhar mais eficazmente na guerra, reduzindo os riscos de conflito e garantindo que a ajuda não prejudicasse (a abordagem “Do no harm”). Esta foi a perspetiva seguida por ONGs internacionais como a OXFAM e a CARE e pelo ACNUR. A terceira e última abordagem referida por GOODHAND e ATKINSON (2001) foi a seguida por um pequeno grupo de doadores bilaterais que reconheceram a importância da ligação entre conflito e desenvolvimento e cuja ajuda foi orientada para o conflito. Países como a Noruega, Canadá, Holanda, Alemanha, Suécia, Suíça e Reino Unido priorizaram os DH, o alívio da pobreza, a boa governação, a educação e a resolução do conflito. OFSTAD (2000:18-53) faz uma análise interessante acerca das estratégias de ajuda internacional aplicadas, focando o período de 1994 a 1999, após as eleições que trouxeram a Aliança Popular e o presidente Chandrika Kumaratunga ao poder. Segundo OFSTAD (2000:3-4-5), os doadores internacionais confrontaram-se com quatro questões de fundo: (1) até que ponto o programa de ajuda apoiou politicamente o governo ou financiou indirectamente o esforço de guerra? (2) será que o conteúdo e a orientação do programa de ajuda podia funcionar como um desincentivo aos esforços de paz? (3) será que a reabilitação e a reconstrução desenvolvidas prematuramente em zonas de conflito podem contribuir para o processo de paz? (4) que tipo de medidas de desenvolvimento devem ser implementadas nas áreas controladas pelos rebeldes? Face a estas questões de fundo, os doadores seguiram quatro estratégias ou abordagens diferentes, como distingue OFSTAD (2000). A abordagem tradicional, seguida por grandes doadores como o Japão, o BAD e o BM até há pouco tempo, consistiu em ignorar a guerra e dar APD como se essa não existisse. A única excepção foi evitar todas as zonas de conflito a norte e a leste por razões políticas e de segurança. OFSTAD (2000) considera que esta abordagem pretendia ser neutra, mas com isso esqueceu a necessidade de um desenvolvimento equilibrado e de algumas medidas extraordinárias nas áreas afectadas pelo conflito. Nesta perspectiva era considerada amiga dos Governos, prestando um apoio indirecto e passivo à estratégia global do Governo. A abordagem dos direitos humanos (DH) era oposta à anterior. O exemplo foi a intervenção do Canadá que decidiu não dar ajuda directa através do Governo, mas sim através de ONGs e de instituições, especificamente instituições de DH no sector governamental. Esta posição justificou-se pelo facto de o antigo regime de Premadasa ter cometido sérios abusos de DH. Caros colegas, a abordagem compreensiva, seguida pelas agências das Nações Unidas (como grupo) e por um número crescente de doadores bilaterais de tamanho médio como a Holanda, Alemanha e Reino Unido, consistiu em manter um programa de ajuda regular em estreita cooperação com o Governo, com enfoque nos deslocados internos e civis afectados pela guerra. Esta abordagem deveria ser balançada e abrangente, procurando criar oportunidades para integrar todas as partes numa perspetiva de desenvolvimento sustentável e tentando não antagonizar nenhuma das partes no conflito. Ainda assim, causou algumas reações negativas em ambas as partes no conflito. Por fim, a abordagem pró-activa priorizou a promoção do processo de paz, através de um apoio ativo aos esforços do Governo para criar um consenso nacional face às propostas políticas. Foi dado um apoio pró-ativo a outros programas e políticas que foram vistos como uma contribuição positiva para a educação, reforma linguística, DH e organizações para a paz, reformas judiciais, reabilitação e desenvolvimento. No entanto, estes doadores conjugaram o seu apoio à promoção da paz com outros programas de redução da pobreza e criação de emprego semelhantes à abordagem compreensiva, considerando que estes programas eram parte integrante do esforço de promoção de paz. A ajuda humanitária VERSUS o desenvolvimento Caros colegas, colocaram-se algumas questões no que respeita à divisão clássica entre a ajuda humanitária e o desenvolvimento nas áreas controladas pelo LTTE. A maioria dos doadores bilaterais contribuiu para a ajuda humanitária dos deslocados internos e de outras vítimas do conflito, canalizando verbas através das agências das Nações Unidas, do CICV e das grandes ONGs internacionais. Essa ajuda era, no entanto, suplementar, afirma OFSTAD (2000:14), já que o Governo dava assistência substancial às vítimas em termos de rações alimentares, abrigos temporários em edifícios públicos, serviços básicos de saúde e educação, mesmo nas áreas controladas pelo LTTE. O problema é que o Governo controlava rigidamente o acesso às zonas do LTTE e bania um conjunto de itens que poderiam ter um potencial uso militar, designadamente objetos de metal, maquinaria, cimento, baterias, petróleo, etc., tornando a implementação de muitos projetos praticamente impossível. Alimentos, vestuário e materiais de construção eram normalmente autorizados, mas objeto de escrutínio e de limitação em termos de volume. Quanto a medicamentos e material médico, eram aceites numa base de quota. Apesar das restrições, a ajuda humanitária manteve-se durante muitos anos, sem problemas de maior. No entanto, a guerra tornou-se uma “emergência prolongada”, pelo que começaram a surgir dúvidas sobre a limitação da ajuda a atividades humanitárias básicas ou o seu alargamento a atividades que permitissem melhorar as condições de vida das populações. Nas zonas controladas pelo Governo, foram implementados programas de reassentamento e de reintegração. Nas áreas controladas pelo LTTE, a maioria das ONGs defendia uma abordagem pelo desenvolvimento e atividades de pequena escala ou microprojetos, que chegaram a ser apoiados pelo ACNUR. Apesar de preocupado com o possível fortalecimento das capacidades do LTTE com esse tipo de atividade, o Governo acabou por aceitar a realização de projetos de desenvolvimento em pequena escala para as populações civis nessas áreas, designadamente distribuição de água, irrigação e agricultura, bem como reparação e manutenção de escolas e de centros de saúde. No entanto, segundo OFSTAD (2000:15), foram mantidas as sanções militares e alguns bens continuaram a ser banidos e algumas atividades a ser restringidas. Caros colegas, em relação aos programas de reabilitação, levantaram-se também algumas questões. Será prematura a reabilitação em zonas contestadas pelo LTTE ou até mesmo sob controlo deste? Ou seja, será que a reabilitação devia ser feita enquanto a guerra ainda estava em curso ou será que deveria ser usado um grande programa de reconstrução como incentivo para um acordo de paz? Esta questão pode ser vista de diversos ângulos. Segundo OFSTAD (2000:11), para os doadores tradicionalistas, a principal preocupação é a segurança do seu pessoal diplomático e dos investimentos feitos na região. Caros colegas do ISEDEF, já os doadores não tradicionalistas consideram que se deve aceitar um risco maior se a atividade em causa melhorar as condições económicas e sociais das populações. A este propósito, surgiram algumas questões. O Governo queria ver rapidamente implementado um programa de reabilitação para conquistar a população Tamil nas áreas que tinham passado para o controlo do Governo, apesar de ciente da insegurança local. Apesar de já não controlar essas áreas, o LTTE mantinha nelas espiões e informantes perigosos que alimentaram o medo das populações. Esta influência acontecia também ao nível dos representantes locais do Governo, a quem competia aprovar os projetos dos doadores e das agências de ajuda. Uma vez que esses representantes estavam frequentemente sob a vigilância e ameaça do LTTE, eles não aprovariam os programas que o LTTE desaprovasse. Face a este cenário, os doadores tinham que decidir como implementar os seus programas de reabilitação, sabendo que não podiam negociar com o LTTE, já que este não era uma força legítima, apesar de ser uma força reconhecida, afirma OFSTAD (2000:12), caros colegas. No entanto, sabiam que, quando um projeto era aprovado pelas autoridades locais, este tinha aceitação prévia do LTTE, pelo que os doadores podiam sentir-se relativamente “seguros”. Quanto à posição assumida pelo LTTE, este manifestou-se contra qualquer tipo de ajuda internacional após a perda de Jaffna em 1996, argumentando que a reabilitação era da responsabilidade do Governo. Por outro lado, os Tigres Tamil estavam também interessados em transmitir à comunidade internacional a imagem de uma organização responsável, pelo que rapidamente aceitaram essa ajuda, incluindo o desenvolvimento de atividades de reabilitação. Nessa altura, as agências humanitárias (ACNUR, CICV e ONGs internacionais como a Oxfam, a Care, entre outras) começaram a desenvolver programas de reabilitação nas zonas controladas pelo LTTE, com quem mantinham reuniões regulares sobre questões operacionais e de segurança. As agências das Nações Unidas aproveitavam também estas reuniões para informar o LTTE dos seus planos de ajuda e para escutar as suas reacções sobre o alcance da paz e mobilidade da ajuda. O apoio da ajuda internacional aos esforços de paz Caros colegas, o método de análise de OFSTAD (2000:5-12-24) visa estudar como cada uma das abordagens (tradicional, dos direitos humanos, compreensiva e pró-activa) deu resposta ao quatro problemas indicados anteriormente nesta discussão em decurso. Relativamente ao programa global da ajuda e ao apoio aos esforços de paz do governo, o autor afirma que as agências humanitárias não ajustaram os volumes de ajuda para incentivar o Governo a caminhar para o processo de paz entre 1994 e 1999. Esta é uma condicionalidade clássica da ajuda, que não foi concretizada, pois, na verdade, a maioria dos doadores apoiou as políticas do Governo (com diferentes ênfases e velocidades de implementação) sem ponderar as razões políticas para ajustar a ajuda nesse período. Ainda assim, diz o autor, todos os países doadores expressaram a sua preocupação com o continuado conflito armado e com os seus custos humanos e económicos no terreno. Todos consideravam que a guerra estava a bloquear os esforços de desenvolvimento, que o orçamento de defesa era demasiado elevado e que deveria ser acelerada a busca de uma solução política para se alcançar a paz desejada. Quanto ao Governo, também ele assumia publicamente a sua total concordância com estas ideias e responsabilizava o LTTE por forçar à guerra, ao mesmo tempo que acusava o principal partido da oposição (o Partido Nacional Unido) de frustar as suas tentativas de fazer aprovar no parlamento propostas políticas inteligentes. Caros colegas, os doadores continuaram, assim, a apoiar o Governo, conscientes da difícil tarefa deste em encontrar uma solução política confortável para algumas das exigências dos Tamil contra os chauvinistas budistas, que, entre 1987 e 1989, tinham já causado conflitos violentos no Su do paísl. Nessa altura, os doadores tradicionalistas passaram a focar questões como a morosa implementação dos projetos, a privatização dos serviços públicos, o défice orçamental e a reforma do setor público em geral. Os doadores pró-activos (ou compreensivos) demonstravam, por sua vez, preocupação com o processo político interno lento e com a integração e igual tratamento de todas as comunidades. Defendiam que 1. deviam ser abordadas e combatidas as causas do conflito, dinamizando setores como a educação, as reformas na língua e a descentralização com uma base não discriminatória; 2. devia ser feita uma aposta forte na melhoria dos DH, através do apoio a organizações locais de DH (como fizeram o Canadá e a maioria dos doadores bilaterais, à excepção do Japão); 3. devia contribuir-se para um desenvolvimento económico balançado, por forma a evitar que fosse canalizada demasiada ajuda para um dos lados no conflito; 4. deveria ser definido um programa de reabilitação e de reconstrução no pós-guerra. Caros colegas do ISEDEF, no geral, cada vez mais os doadores, incluindo o BM, manifestaram a sua preocupação com a falta de progresso na busca de uma solução política e com aquilo que consideravam ser um apoio inadequado ao Governo na promoção da reabilitação de Jaffna e do Leste. Apesar de todos esses cuidados, o impato dos incentivos à paz deve ter sido limitado, sustenta OFSTAD (2000:11-32), uma vez que até mesmo uma modesta reorientação da ajuda pode ser considerada um ato político num ambiente de conflito interno politizado. Segundo OFSTAD (2000:6-32), os doadores apelavam cuidadosamente à condicionalidade da ajuda, fato que merece algumas considerações por parte do Autor, como abaixo destaca. Se é verdade que os doadores apoiavam o Governo na luta contra o LTTE e no desenvolvimento de uma estratégia de paz, é igualmente verdade que havia uma má lembrança em relação ao Governo anterior, aquando da aplicação das sanções de DH. Além disso, caros colegas, quer o Governo de então, quer os governos anteriores, tinham reagido fortemente contra a condicionalidade política no âmbito do debate da ajuda, pois consideravam que a guerra era um problema político interno e argumentavam mesmo que essas tentativas poderiam não ser bem sucedidas e até criar o resultado oposto. OFSTAD (2000:7-34) vai ainda mais longe, dizendo que os críticos consideram que a ajuda internacional foi um subsídio implícito às forças de segurança do Governo e respetivas atividades militares. Porém, caros colegas, o autor admite que a ajuda é sempre um subsídio para o orçamento governamental, na medida em que permite que o Governo redireccione os recursos estatais para outros interesses. Ainda assim, caros colegas, no Sri Lanka, não há indícios de que o orçamento da defesa tenha sido influenciado com a vinda da ajuda internacional, o que se explicará pelo fato de a economia do país não estar em crise e ter recursos para financiar a guerra, “repito “TER RECURSOS PARA FINANCIAR A GUERRA”. De qualquer forma, sem essa ajuda teriam sido feitos menos investimentos em infraestruturas, no bem-estar social e na educação. Independentemente das diversas abordagens ou justamente porque elas existem, parece ser fundamental a coordenação entre doadores, como afirma UVIN (2001:23-34). No caso do Sri Lanka, segundo o autor, verificou-se que existiu uma significativa troca de informação e consulta entre estes, principalmente no terreno. A comunidade internacional deu passos no sentido da boa coordenação e da cooperação com o Sri Lanka. Em Abril de 2003, teve lugar nos EUA um seminário preparatório da Conferência de Doadores a realizar em Junho, com o fim de apoiar o processo de paz, após o cessar-fogo de Setembro de 2002. MACAN-MARKAR (2003) indica que a comunidade internacional tinha prometido doar 4.5 bilhões de dólares para a reconstrução do país, donativo que estava condicionado ao reinício do processo de paz. Porém, o LTTE interrompeu esse processo por não ter sido convidado para o seminário de Abril. Em Junho de 2003, realizou-se a Conferência de Doadores de Tóquio sobre a Reconstrução e o Desenvolvimento do Sri Lanka, liderada pelo Japão, Noruega e UE (Presidência e Comissão) e onde estiveram reunidos ministros e representantes de 51 países e de 22 OIs. De acordo com o estipulado na Declaração de Tóquio sobre a Reconstrução e o Desenvolvimento do Sri Lanka, os principais objetivos da Conferência foram “dar à comunidade internacional uma oportunidade para demonstrar a sua força e o seu empenho global na reconstrução e no desenvolvimento do Sri Lanka , bem como encorajar as partes a redobrar os seus esforços para progredir no processo de paz”. Segundo MACAN-MARKAR (2003), o LTTE, que boicotou esta Conferência, pôde ver “como é grande a pressão internacional para que ponham fim a esta luta”. A Declaração de Tóquio refere, por sua vez, que “apesar de apenas uma parte no processo de paz estar presente, a comunidade internacional aproveita esta oportunidade para mostrar a sua vontade de apoiar o estabelecimento pelas partes da estrutura administrativa necessária à reconstrução efetiva e ao desenvolvimento do Norte e do Leste”. Veja ainda mais www.peaceinsrilanka.org/insidepages/Archive/April/PressStat140403.asp A influência da ajuda no conflito de Sri Lanka OFSTAD (2000) mostrou essencialmente que a ajuda pode assumir formas muito diferentes, consoante as estratégias dos doadores e as opções seguidas em termos de uma abordagem mais tradicionalista ou mais pró-activa em cenários de guerra civil, sendo que esta última vai mais longe no que respeita a realização de ajuda humanitária e até mesmo de reabilitação em áreas controladas pelos rebeldes e no que toca à tentativa de manter o equilíbrio geral no país. Já UVIN (2001:16-43) explica que, no Sri Lanka, tal como noutros países, os doadores começaram a utilizar a APD para promover a reconciliação, quer em projetos individuais, quer em projetos conjuntos. Porém, diz, é extremamente difícil e lenta a tarefa de criar condições e oportunidades para que a comunidade mude as suas atitudes e se integre. Além disso, esse tipo de atividade baseia-se numa evidência limitada e em pensamento testado sobre as causas da violência e sobre a dinâmica social, pelo que muito trabalho há ainda que ser feito. Outra questão importante, referida por MUSCAT (2002:34-39), prende-se com a separação das questões económicas face às questões políticas domésticas pelos doadores. O autor tece uma forte crítica à separação rígida destas duas áreas feita pelas agências multilaterais, designadamente pelo BM, que considera particularmente visível no caso do Sri Lanka. A título ilustrativo, o relatório de uma missão técnica do BM enviada ao Sri Lanka em 1953, reflectia optimismo nas relações inter-étnicas no país pouco após a independência e descrevia como os diferentes grupos “vivem lado a lado com um grau pouco habitual de tolerância mútua”. Não havia a consciência da existência de diferenças étnicas significativas, explica MUSCAT, (2002), pelo que o relatório afirmou que os Tamil eram “um povo particularmente trabalhador e enérgico”, elogio que não foi dado aos outros grupos étnicos da ilha. De resto, caros colegas, também o estudo extensivo da educação omitiu o problema da sobrerepresentação dos Tamil (em proporção à população) na escola, nos empregos e, consequentemente, na sociedade civil. UVIN (2001:15-53), por seu turno, sublinha a necessidade dos doadores adaptarem o seu projeto à dinâmica do conflito e afirma que se trata de “fazer as coisas de forma diferente em vez de fazer coisas diferentes”. No caso do Sri Lanka, caros colegas, o autor dá um exemplo de como os critérios standard do desenvolvimento (decisões com base nas necessidades, eficientes, abordagens dirigidas para o produto e não para o processo) podem ter sido subordinados aos objetivos da construção da paz. É o caso de um projeto que consistiu em dar três mil casas às populações, dividindo as mesmas em igual percentagem pelos Tamil, cingaleses e muçulmanos. Porém, nem todas as comunidades foram afetadas da mesma forma pela violência, ou seja, algumas comunidades tinham mais necessidade de uma casa do que outras. Neste caso, afirma UVIN (2001:15-31), o princípio da equidade (alocação da ajuda consoante as necessidades) foi subordinado ao princípio político da igualdade (alocação aritmética), que se revelou ser injusto. Quanto aos resultados dessa ajuda, OFSTAD (2000) considera que “os grandes atores internacionais podem influenciar o processo, mas a solução básica e a vontade de a encontrar estão dentro do país. Na melhor das hipóteses, os doadores podem criar mais incentivos que desincentivos a esse processo”. GOODHAND e ATKINSON (2001:28-37), por sua vez, afirmam que, apesar da ajuda dos doadores não ter alimentado a economia de guerra da mesma forma que o fez noutros países, “programas de ajuda mal concebidos no Sri Lanka tenderam a seguir as linhas de fratura do conflito”. Por outras palavras, “foi a ajuda ao desenvolvimento concedida pelos doadores que, mais do que a ajuda humanitária, exacerbou tensões e o conflito”. Os autores ilustram esta afirmação com o exemplo do apoio aos programas governamentais para a educação que ajudou a criar um sistema educativo que reforçou as diferenças étnicas e linguísticas. A própria separação espacial e institucional da APD dada ao Sul e ao Norte também alimentou a dinâmica negativa do conflito, acentuando desequilíbrios regionais, dizem os autores, caros colegas. O mesmo se passou devido ao apoio dos doadores à liberalização económica e ao esbatimento do papel do Estado em geral. Vejamos agora o resumo e conclusões deste debate Caros colegas do ISEDEF, Académicos e Similares, a guerra civil no Sri Lanka teve consequências graves em várias esferas da sociedade, provocando muitas mortes, deslocações e danos de carácter económico e social. A guerra terá sido impulsionada por um complexo leque de causas que vão desde a composição étnica da sociedade (diversidade étnica, mas limitada) ao agravo político, provocado pelos programas de liberalização político-económicos do FMI e do BM que terão exacerbado as hostilidades interétnicas e pelo financiamento do LTTE pela diáspora. Os antagonismos entre o Governo e o LTTE alimentaram o conflito. O Governo queria deter e ostracizar o LTTE e abrir caminho às suas ações de reabilitação económica e de reconstrução pós-guerra, evitando inicialmente a publicidade internacional e a entrada da ajuda do país. O LTTE, por sua vez, queria estabelecer um Estado independente para a comunidade Tamil no norte e no leste do país, o que implicava a limpeza étnica na região e a eliminação dos inimigos políticos, e conseguir, ao mesmo tempo, o reconhecimento internacional. Ao longo deste debate, analisámos as estratégias utilizadas por cada uma das partes para alcançar os objetivos preconizados. Se o LTTE optou por uma estratégia de controlo militar em determinados territórios, com o financiamento da diáspora, o Governo terá desenvolvido esforços para negociar possíveis soluções com a mediação da Noruega, depois de tentada a via militar. Caros colegas do ISEDEF, no decurso da guerra tanto o Governo como o LTTE cometeram sérias violações dos DH, embora se tenham registado melhorias na atuação do primeiro desde a segunda metade dos anos 90. Esta guerra teve alguma intervenção da Índia e dos EUA e ainda naturalmente da ajuda internacional de que se destaca um conjunto de doadores, designadamente o Japão, o AsDF, a IDA, a Alemanha, a Suécia, entre outros, como demonstramos no decurso do debate. Foi um instrumento político importante no Sri Lanka usado nomeadamente pelo Governo do país. Caros colegas do ISEDEF, vimos também os diversos tipos de ajuda dada pelas OIs, ONGs e doadores internacionais. O CICV só pôde entrar no país seis anos depois do início da guerra, mas, desde essa altura, quer a Cruz Vermelha, quer as Nações Unidas e as ONGs, empenharam-se em ajudar as vítimas da guerra e foram mais além numa tentativa de resolver o conflito e construir a paz, assumindo uma abordagem maximalista da ajuda em geral. Quanto a questões de financiamento do desenvolvimento económico, vimos como a relativa abertura económica do Sri Lanka a obtenção de fundos do FMI e do BM, que não terão imposto fortes condicionalismos a essa ajuda, contrariamente ao que aconteceu com os doadores bilaterais. Caros colegas do ISEDEF, os doadores lidaram de três formas diferentes com o conflito: uns trabalharam à volta dele, evitando-o; outros estabeleceram uma ligação coerente entre os seus programas e o conflito, garantindo que a ajuda não o prejudicava; outros ainda centraram-se na questão do desenvolvimento, priorizando questões como direitos humanos e redução da pobreza. Esta última posição conduziu-nos ao debate sobre a divisão clássica entre ajuda humanitária e desenvolvimento, que motivou questões sobre o transporte de ajuda humanitária para as zonas controladas pelo LTTE e também sobre a necessidade de implementação de programas de reabilitação nessas mesmas zonas, à medida que a guerra se foi tornando uma “emergência prolongada”. Caros colegas, revimos as interrogações que se colocam sobre a alegada prematuridade da reabilitação em cenários de guerra, questão em relação à qual as opiniões se dividem. Se os doadores tradicionalistas temem o risco do investimento, os não- -tradicionalistas aceitam esse risco em nome da melhoria das condições económicas e sociais. Na segunda metade dos anos 90, predominou um conjunto de questões de fundo (a influência da ajuda no conflito e nos esforços de paz; o contributo da reabilitação e de reconstrução numa fase prematura para o processo de paz; a adequação das medidas de desenvolvimento a aplicar) que orientou as abordagens dos doadores, caros colegas. Se a abordagem tradicional insistiu em ignorar a existência da guerra, a abordagem dos DH preferiu apoiar ONGs e instituições dessa área, evitando a ajuda direta ao Governo. A abordagem compreensiva, por sua vez, manteve um programa de ajuda regular em coordenação com o Governo e com enfoque nas principais vítimas da guerra. A abordagem pró-activa priorizou a promoção da paz, através do apoio e reforço das políticas governamentais em áreas como a educação, reformas, DH, redução da pobreza. Por fim, analisámos a forma como cada um destes tipos de abordagem atuou de modo diferente face aos problemas emergentes nesta guerra, nomeadamente ao nível do ajustamento dos volumes de ajuda para incentivar o processo de paz, ao nível das posições manifestadas pelos doadores sobre a guerra e também ao nível do seu apoio oficial ao governo do Sri Lanka. Foram ainda analisadas questões como a lenta implementação dos projetos, a privatização dos serviços públicos, o défice orçamental e a reforma do sector público; o ritmo do processo político interno; a integração e o igual tratamento de todas as comunidades e a condicionalidade da ajuda. Caros colegas, podemos concluir que os doadores continuaram a apoiar o Governo, apesar de alguns manifestarem a sua impaciência face à lentidão do processo de paz. A principal ilação que se retira desta discussão é que a ajuda pode assumir muitas formas diferentes, consoante o tipo de política e abordagem dos doadores, e que esta pode influenciar o processo de guerra e construção da paz, embora a chave do problema esteja no interior do país. Saliente-se, no entanto, caros colegas, que é fundamental não separar questões económicas de questões políticas internas e tentar perceber o conflito de forma global e enquadrado no seu contexto histórico. Deu-se especial atenção às questões étnicas e às sensibilidades das diversas partes no conflito. Quando isso não aconteceu, a ajuda foi vista como o apoio a um dos lados do conflito, exacerbando tensões e agudizando o conflito. Em Dezembro de 2004, o Sri Lanka foi atingido pelo sismo e tsunami que provocou no Sudeste Asiático uma das maiores catástrofes humanas de que há memória. No Sri Lanka, morreram mais de 30.500 pessoas e várias centenas continuam ainda desaparecidas. Mais do que nunca, este país precisa da ajuda internacional. Talvez os erros do passado possam agora ser uma lição para o futuro, pois o Sri Lanka deve estar no coração de cada um de nós Moçambicanos, essencialmente aos docentes do ISEDEF. Caros colegas do ISEDEF, debater estes assuntos é mais do que a simples “livre-docência”, mas nos revela de como as” guerras civis são um mal” para a humanidade, por isso a sua eliminação é urgente. Conceber paradigmas para eliminar “o mal” é nossa tarefa como docentes do ISEDEF. Todas dúvidas, críticas ou contribuições sobre este debate, são “bem-vindas” para alicerçar os novos paradigmas da instituição. Meu email: dr.anly1962@gmail.com Meu contacto: 827138340 Meu site:www. dr-anly.blogspot.com “CLUBE DE OPINIAO CIENTIFICA”

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