segunda-feira, 3 de agosto de 2020

MANUAL 7 DA CADEIRA DE HISTÓRIA E SISTEMAS DE PSICOLOGIA, PARA O CURSO DE PSICOLOGIA ESCOLAR, 1º ANO. ANO LECTIVO 2020/2021- ISEDEF. DOCENTE: SILVA ANLI; site:dr-anly.blogspot.com “CLUBE DE OPINIÃO CIENTÍFICA”; email:dr.anly1962@gmail.com A revolução que Watson pretendia não transformou a psicologia de uma hora para a outra, como ele esperava. Levou tempo. Contudo, perto de 1924, pouco mais de uma década depois de ele ter lançado o comportamentalismo, mesmo seu maior oponente, E. B. Titchener, concedeu que o movimento engolfara todo o país. Em 1930, Watson pôde proclamar, com consideráveis razões, que sua vitória fora completa. Embora outras variedades de comportamentalismo tenham sido propostas, como as de Holt, Weiss e Lashley , elas serviram para reforçar o movimento de Watson na direçcão da definição da psicologia como ciência natural totalmente objectiva. Assim, em 1930, o comportamentalismo, em suas várias formas, vencera todas as abordagens anteriores do campo. O primeiro estágio da evolução do comportainentalismo, o watsoniano, durou de 1913 a mais ou menos 1930. O segundo, o neocomportamentalismo, pode ser datado de 1930 a 1960; ele incluiu o trabalho de Edward Tolman, Edwin Guthrie, Clark Huli e B. F. Skinner. Nesse período de trinta anos, eles e muitos outros psicólogos experimentais americanos trabalharam para promover o progresso e a consolidação da abordagem comportamentalista na psicologia. Um ponto de consenso foi o uso de uma base de dados comum, derivada exclusivamente de estudos sobre a aprendizagem animal. Por meio de um grande número de experimentos de aprendizagem por condicionamento e discriminação, os comportamentalistas reuniram enormes quantidades de dados e, de modo geral, concordaram sobre quais eram os dados ou fatos importantes para a psicologia. Os neocomportamentalistas também concordavam acerca de várias questões relativas aos sistemas que haviam elaborado para explicar os seus dados. O comportamentalismo watsonia não abrangia muitos factos e descobertas, mas pouca coisa que permitisse a existência de princípios explicativos e preditivos úteis, nem teorias comparáveis às das ciências físicas. Embora tenham formulado sistemas explicativos que diferiam em seus aspectos específicos, como veremos, os neocomportamentalistas concordavam com o seguinte: (1) o núcleo da psicologia é o estudo da aprendizagem; (2) a associação é o conceito-chave da aprendizagem; (3) por mais complexo, todo comportamento pode ser explicado pelas leis do condicionamento; e (4) a psicologia deve adoptar o princípio do operacionismo. Depois de discutirmos o operacionismo, examinaremos o trabalho de quatro destacados neocomportamentalistas: Tolman, Guthrie, Hull e Skinner. Depois, consideraremos o terceiro estágio da evolução do comportamentalismo, o neocomportamentalismo, que data mais ou menos de 1960. A Influência do Operacionismo: O operacionismo é uma atitude ou princípio geral que tem como propósito tornar a linguagem e a terminologia da ciência mais objetivas e precisas, e libertar a ciência de problemas que não sejam concretamente observáveis nem fisicamente demonstráveis (os chamados pseudoproblemas). Resumidamente, o operacionismo sustenta que a validade de uma dada descoberta científica ou construção teórica depende da validade das operações empregadas na realização dessa descoberta. O ponto de vista operacionista foi defendido pelo físico de Harvard Percy W. Bridgman em seu livro The Logic ofModern Physics (A Lógica da Física Moderna), de 1927, que atraiu a atenção de muitos psicólogos. Bridgman propôs que os conceitos fisicos fossem defmidos em termos precisos e rígidos e que todos os conceitos desprovidos de referentes fisicos fossem desprezados. Ele escreveu: Podemos ilustrar (nova atitude) considerando o conceito de comprimento. O que entendemos por comprimento de um objecto? Evidentemente, sabemos o que entendemos por comprimento se pudermos dizer qual é o comprimento de todo e qualquer objecto e, para o físico, não se exige nada mais. Para determinar o comprimento de um objecto, temos de realizar certas operações físicas. Por conseguinte, o conceito de comprimento é fixado quando as operações pelas quais o comprimento é medido estão fixadas; isto é, o conceito de comprimento envolve tão-só e nada mais do que um conjunto de operações; o conceito é sinónimo do conjunto correspondente de operações (Bridgman, 1927, p. 5). Logo, um conceito físico é idêntico ao conjunto de operações ou procedimentos pelos quais é determinado. Muitos psicólogos consideraram esse princípio útil na ciência da psicologia e tomaram-se ávidos por aplicá-lo. A preocupação de Bridgman com o abandono dos pseudoproblemas, questões que desafiam respostas obtidas por qualquer teste objectivo conhecido, tem particular importância. Noções ou proposições que não podem ser submetidas a testes experimentais — tal como a questão da existência e da natureza da alma — são sem sentido para a ciência. O que é essa coisa chamada “alma”? Pode ela ser observada no laboratório? Medida e manipulada em condições controladas para se determinar seus efeitos sobre o comportamento? Se não, ela não tem utilidade, sentido ou relevância para a ciência. Segue-se que o conceito de experiência consciente individual ou privada é um pseudoproblema para a psicologia. Não é possível determinar ou mesmo investigar através de métodos objectivos a existência nem as caracteristicas da consciência. Portanto, segundo o ponto de vista operacionista, a consciência não tem lugar numa psicologia científica. Pode-se alegar que o operacionismo pouco mais é do que um enunciado formal de princípios já usados pelos psicólogos ao definirem palavras e conceitos em termos dos seus referentes físicos. Pouca coisa há no operacionismo cuja origem não esteja nas obras dos empiristas britânicos. Referimo-nos à tendência de longo prazo da psicologia americana na direcção de uma crescente objectividade em termos de métodos e de objecto de estudo, razão por que é possível dizer que o operacionismo, como atitude e referencial no qual fazer pesquisas e formular teorias, já fora aceito por muitos psicólogos americanos antes da publicação do livro de Bridgman em 1927. Desde a época de Wundt, contudo, a física vinha sendo o modelo da respeitabilidade científica para a psicologia mais recente; e, quando os físicos proclamaram sua aceitação do operacionismo como doutrina formal, os psicólogos rapidamente a seguiram. Com efeito, a psicologia favoreceu e usou o operacionismo num grau muito maior do que a física. Mas o operacionismo não alcançou aceitação universal na psicologia. Surgiu uma controvérsia acerca da utilidade ou futilidade relativas de limitar o objecto de estudo da psicologia apenas ao que tem referência empírica. Do mesmo modo, como acentuou o historiador E. G. Boring, “a redução de conceitos às suas operações revelou-se uma tarefa enfadonha. Ninguém quer se incomodar com isso na ausência de uma necessidade especial” (Boring, 1950, p. 658). O próprio Bridgman tinha dúvidas acerca do uso dado pelos psicólogos ao conceito. Escrevendo vinte e sete anos depois de ter proposto a perspectiva operacionista, ele disse: “Acho que criei um Frankenstein que por certo fugiu ao meu controle. Tenho horror à palavra operacionalismo ou operacionisnio... A coisa que concebi é simples demais para ser homenageada por um nome tão pretensioso” (Bridgman, 1954, p. 224). Isso parece mais um caso de súditos que são mais realistas do que o rei. De todo modo, o ponto importante sobre o operacionismo, para os nossos propósitos, é que a geração de neocomportamentalistas que chegou à maioridade no final dos anos 20 e início dos 30 incluiu o operacionismo em sua abordagem da psicologia. Edward Chace Tolman (1 886-1 959) Um dos primeiros adeptos do comportamentalismo, Edward Tolinan originalmente estudou engenharia no Massachusetts Institute of Technology. Ele passou para a psicologia e trabalhou com Edwin Holt em Harvard, onde se doutorou em 1915. No verão de 1912, Tolman estudou na Alemanha com o psicólogo da Gestalt Kurt Koffka e, em seu último ano de pós-graduação, enquanto era treinado na tradição de Titchener, tomou conhecimento do comportamentalismo watsoniano. Em seus anos de pós-graduação, Tolman já questionara a utilidade científica da introspecção. Em sua Autobiography (Autobiografia) (1952), ele escreveu que o comportamentalismo de Watson chegou como um “tremendo estimulo e alívio” para ele. Edward Chace Tolman concebeu o comportamentalismo intencional para dar forma empfrica aos processos não observáveis que dirigem o comportamento de um organismo para algum alvo. Depois da sua graduação, Tolman foi ser instrutor na Universidade Northwestem, em Evanston, Illinois, e, em 1918, foi para a Universidade da Califórnia em Berkeley. Ali, onde ensinava psicologia comparada e fazia pesquisas sobre a aprendizagem com ratos, ele começou a ficar insatisfeito com o comportamentalismo de Watson e a desenvolver o seu. Sua carreira em Berkeley foi interrompida pela Segunda Guerra Mundial, quando ele serviu no Serviço Secreto e, outra vez, de 1950 a 1953, quando ajudou a liderar a corajosa e louvável oposição dos professores ao juramento de lealdade que o Estado da Califórnia exigia. Neste último período, ele dava aulas em Harvard e na Universidade de Chicago. O Comportamentalismo Intencional: O enunciado definitivo da posição de Tolman foi apresentado em seu primeiro e mais importante livro, Purposive Behavior in Animais and Mexi (O Comportamento Intencional em Animais e Seres Humanos), de 1932. À primeira vista, seu sistema pode parecer uma curiosa mistura de dois termos contraditórios: intencional e comportamento. Atribuir intenção a um organismo parece implicar consciência, um conceito mentalista que com certeza não tinha lugar numa psicologia comportamentalista. Mas Tolman deixou claro, tanto no livro como na pesquisa, que era totalmente comportamentalista em termos de objecto de estudo e de metodo logica; ele não estava pedindo um retomo da psicologia à consciência. Tal como Watson, ele rejeitava vigorosamente a introspecção e não tinha interesse em nenhuma suposta experiência interna do organismo não acessível à observação objetiva. Toda referência a processos conscientes em seu sistema era vazada em termos de cautelosas inferências a partir do comportamento observável. É igualmente claro que Tolman não era watsoniano. Em primeiro lugar, ele não se interessava pelo estudo do comportamento em nível molecular, em termos de conexões estímulo-resposta. Ao contrário de Watson, ele não se preocupava com unidades elementares de comportamento, as actividades dos nervos, músculos e glândulas. O seu foco era o comportamento molar, as acções de resposta total do organismo inteiro. Nesse aspecto, seu sistema combina conceitos comportamentalistas e gestaltistas. Uma segunda diferença, e o principal pilar do sistema de Tolman, é a noção de comportamento intencional. A intenção no comportamento, dizia ele, pode ser definida em termos comportamentais objectivos sem recorrer à introspecção nem a relatos de como o organismo poderia “sentir-se” com relação a uma experiência. Parecia-lhe evidente que todo comportamento está voltado para algum alvo. O gato, por exemplo, tenta sair da caixa-problema, o rato tenta conhecer um labirinto difícil e o ser humano tenta aprender a tocar piano. O comportamento, afirmava ele, “exsuda intenção”. Todo comportamento se orienta para a realização de algum objectivo, para a aprendizagem dos meios destinados a um fim. O rato percorre o labirinto, cometendo cada vez menos erros e alcançando o alvo, a cada tentativa, com mais rapidez. Em outras palavras, o rato aprende, e o facto da aprendizagem — no rato ou no homem — é uma prova comportamental altamente objectiva de intenção. Observe-se que Tolman se ocupa da resposta do organismo e que suas medidas referem-se às modificações no comportamento de resposta como função da aprendizagem. E isso produz dados objetivos. Os watsonianos se apressaram a criticar a atribuição de intenção ao comportamento porque, diziam, ela tinha de se basear no pressuposto da consciência. Tolinan replicou que pouca diferença fazia se o organismo tinha ou não consciência. A experiência consciente — caso existisse — associada com o comportamento intencional não influenciava de maneira alguma as respostas comportamentais do animal. Sua única preocupação era o comportamento de resposta manifesto. Tolman acreditava que, se existe uma percepção consciente do alvo por parte do organismo, isso é um assunto particular ao interior de cada organismo, não estando, pois, disponível aos instrumentos objectivos da ciência. E qualquer coisa interior e que não possa ser observada fora do organismo não faz parte do domínio da ciência. Variáveis Intervenientes Como comportamentalista, Tolman acreditava que as causas iniciadoras do comportamento e o comportamento resultante final têm de ser suscetíveis de observação objectiva e de definição operacional. Ele sugeria que as causas iniciadoras do comportamento consistem em cinco variáveis independentes: os estímulos ambientais (S), os impulsos fisiológicos (P), a hereditariedade (H), o treinamento prévio (T) e a idade (A). Com sujeitos animais, o experimentador pode controlar essas variáveis, mas, com seres humanos, havia obviamente menos oportunidades para isso. Tolman formalizou o relacionamento entre as causas do comportamento e o comportamento resultante final (B) em termos de uma equação: o comportamento é uma função ( das cinco variáveis independentes. B F (S, P, H, T, A) Entre essas variáveis independentes observáveis e o comportamento de resposta final (a variável dependente observável), Tolman postulava um conjunto de factores inferidos e não observados, as variáveis intervenientes. Trata-se dos reais determinantes do comportamento. Essas variáveis são os processos internos que conectarn a situação de estímulo com a resposta observada. O enunciado E-R (estímulo-resposta) deve ser agora EO-R(ESTIMULO, ORGANISMO E RESPOSTA). A variável interveniente é o que está acontecendo (o organismo) que provoca uma dada resposta comportamental diante de um estímulo dado. Como essa variável interveniente não pode ser objetivamente observada, sua utilidade para a psicologia só se concretiza se for possível relacioná-la claramente com as variáveis (independentes) experimentais e com a variável (dependente) de comportamento. O exemplo clássico de variável interveniente é a fome, que não pode ser vista numa pessoa nem num animal de laboratório. Contudo, é possível relacioná-la precisa e objectivamente com uma variável experimental como a extensão de tempo transcorrida desde a última vez que o organismo foi alimentado. Ela também pode ser relacionada com uma resposta objectiva ou variável de comportamento, como a quantidade de alimento ingerido e a velocidade com que foi consumido. Assim, a variável não observável e inferida da fome pode receber uma referência empírica precisa, sendo portanto susceptível de quantificação e de manipulação experimental. Tolman propôs originalmente dois tipos de variáveis intervenientes: variáveis de demanda e variáveis cognitivas. As variáveis de demanda são essencialmente motivos e incluem sexo, fome e segurança diante do perigo. As variáveis cognitivas, são capacidades como aptidões motoras e percepção de objectos. Mais tarde, Tolman revisou o conceito e propôs três categorias: sistemas de necessidades, a privação ou impulso fisiológico num dado momento; motivos de crença-valor, a intensidade da preferência por determinados objetos-alvo e a força relativa desses objetos na satisfação de necessidades; e espaços de comportamento, a situação em que ocorre o comportamento do organismo. No espaço de comportamento, alguns objectos atraem o indivíduo (têm uma valência positiva) enquanto outros o repelem (têm uma valência negativa). O conceito de variáveis intervenientes não escapou a críticas. Essas variáveis parecem úteis ao desenvolvimento de uma teoria do comportamento desde que sejam empiricamente relacionadas com variáveis experimentais e comportamentais. Fazer isso de modo abrangente e complexo mostrou-se, no entanto, uma tarefa tão monumental que Tolman mais tarde chegou a “repudiar a esperança de um dia fazer uma definição completa de quaisquer variáveis intervenientes, declarando que, se elas não fossem totalmente abandonadas, tudo o que poderiam ser consideradas era, na melhor das hipóteses, um ‘auxílio ao pensamento’ “ (Mackenzie, 1977, p. 146). A Teoria da Aprendizagem : Tolman acreditava que todo comportamento, animal e humano (excepção feita aos reflexos simples e aos tropismos ou movimentos forçados propostos por Jacques Loeb), é passível de ser modificado por meio da experiência; assim, a aprendizagem tem um papel importante em seu comportamentalismo intencional. Ele rejeitava a lei do efeito de Thorndike, dizendo que a recompensa ou reforço tem pouca influência sobre a aprendizagem. Tolman propôs em seu lugar urna teoria cognitiva da aprendizagem, sugerindo que a realização repetida de uma tarefa fortalece a relação aprendida entre indícios do ambiente e expectativas do organismo. Assim, o organismo passa a conhecer o seu ambiente. Ele denominou essas relações aprendidas gestalts-sinais, constituídas pela execução continuada de uma tarefa. Acompanhemos o sistema de Tolman enquanto observamos um rato faminto num labirinto, o rato se move pelo labirinto, às vezes nos corredores correctos e às vezes em becos sem saída. Ele termina por descobrir o alimento. Em tentativas subsequentes no labirinto, o alvo (encontrar o alimento) confere propósito e direcção ao comportamento do roedor. A cada ponto de escolha no labirinto, são estabelecidas expectativas. O rato começa a esperar que certos indícios associados com o ponto de escolha levem ou não ao alimento. Quando sua expectativa é confirmada e ele consegue alimento, a gestalt-sinal (a expectativa dos indícios, associada com um ponto de escolha particular) é fortalecida. Assim, ao longo de todos os pontos de escolha no labirinto, o animal vai estabelecendo um padrão de gestaltssinais que Tolman denominou mapa cognitivo. Esse padrão é aquilo que o animal aprende — um mapa cognitivo do labirinto, e não um conjunto de hábitos motores. Num certo sentido, o rato estabelece um conhecimento abrangente do labirinto ou de qualquer ambiente familiar. Algo semelhante a um mapa topográfico se desenvolve em seu cérebro, permitindo-lhe ir de um ponto a outro do ambiente sem se restringir a uma série fixa de movimentos corporais. Um experimento clássico que sustenta a teoria da aprendizagem de Tolman investigou a questão de saber se o rato no labirinto aprende um mapa cognitivo ou um conjunto de respostas motoras. Foi usado um labirinto em forma de cruz. Um conjunto de ratos sempre encontrava comida no mesmo lugar, muito embora, partindo de pontos distintos, tivessem de às vezes virar à direita e outras vezes à esquerda para encontrar o alimento. As respostas motoras diferiam, mas o alimento permanecia no mesmo lugar. O segundo grupo de ratos sempre dava a mesma resposta, independentemente do ponto de partida, mas o alimento era encontrado em lugares diferentes. Por exemplo, partindo de uma extremidade do labirinto em cruz, os ratos só encontravam comida se virassem à direita no ponto de escolha; quando partiam da outra extremidade, eles também só a encontravam virando à direta. Os resultados mostraram que o primeiro grupo, o dos aprendizes de lugar, se saía significativamente melhor do que o segundo, o dos aprendizes de resposta. Tolman concluiu que o mesmo fenómeno ocorre com pessoas familiarizadas com o seu bairro ou cidade. Elas podem ir de um ponto a outro por várias rotas distintas graças ao mapa cognitivo da área que elas desenvolveram. Outra experiência envolveu a aprendizagem latente, a aprendizagem que não pode ser observada enquanto está ocorrendo. Um rato com fome foi colocado num labirinto, podendo perambular livremente. Não havia comida para ele encontrar. Estaria o rato aprendendo alguma coisa na ausência de reforço? Depois de algumas tentativas não reforçadas, o rato encontrou comida. Daí por diante, seu progresso em termos do tempo necessário para percorrer o labirinto foi extremamente rápido, indicando que alguma aprendizagem ocorrera durante o período em que não houvera reforço. Seu desempenho igualou rapidamente o de um grupo de controle que fora reforçado com comida a cada tentativa. O trabalho de Tolman teve uma grande influência na psicologia, em particular na área da aprendizagem, e seu impacto é reconhecido hoje no movimento cognitivo. Mas ele foi criticado por não ter conseguido desenvolver um sistema teórico plenamente integrado, e muitos psicólogos acreditam que ele nunca vinculou adequadamente o comportamento com funcionamentos mais encobertos como os estados cognitivos. Um ponto de ataque mais óbvio é a sua linguagem, tida por muitos como subjectiva e mentalista. Do lado positivo, Tolrnan abriu muitos tópicos importantes de pesquisa na área da aprendizagem e introduziu o conceito de variável interveniente. Como elas são um modo de definir operacionalmente estados não observáveis como a fome, fizeram esses estados ser considerados cientificamente respeitáveis por alguns comportamentalistas. As varáveis intervenientes se tornaram um formato necessário para lidar com construções hipotéticas, tendo sido muito usadas por outros neocomportamentalistas como Guthrie, Huil e, por algum tempo, Skinner. Outra contribuição importante é o apoio de Tolman ao rato como sujeito apropriado a estudos psicológicos. Um ensaio escrito em 1945 marca clara e deliciosamente sua posição: “Observe-se que os ratos vivem em gaiolas; eles não fazem farras na noite anterior ao dia em que se planeou uma experiência; eles não se matam uns aos outros em guerras; eles não inventam máquinas de destruição e, se o fizessem, não seriam tão ineptos no seu controle; eles não se envolvem em conflitos de classe ou de raça. Eles evitam a política, a economia e os ensaios de psicologia. Eles são maravilhosos, puros e encantadores (Tolman, 1945, p. 166).” Edwin Ray Guthrie (1886-1959) Edwin Guthrie doutorou-se em 1912 na Universidade da Pensilvânia e fez sua carreira acadêmica na Universidade de Washington em Seattle, onde ficou até se aposentar em 1956. Na época da pós-graduação, tornou-se um ardente adepto da abordagem comportamentalista em psicologia, embora não possa ser descrito como um watsoniano. A Aprendizagem por uma Tentativa : A mais importante contribuição de Guthrie para a psicologia é sua formulação de uma teoria da aprendizagem simples, descrita em seu livro The Psychology ofLearning (Psicologia da Aprendizagem), de 1935. Ela tem como base o princípio da contiguidade. Explicando o fortalecimento de respostas aprendidas, Guthrie rejeitou as leis do efeito e de frequência de Thorndike, bem como o reforço pavloviano, apoiando-se no que denominou condicionamento simultâneo, considerado por ele a lei mais geral da psicologia. Para Guthrie, toda aprendizagem depende da contiguidade entre estimulo e resposta. Quando um estimulo evoca, apenas uma vez, uma dada resposta, forma-se a associação E- R. Essa é, em essência, a aprendizagem por uma tentativa. A repetição e o reforço não são necessários ao estabelecimento da conexão entre estímulo e resposta. A formação de um par entre o estimulo e o movimento resultante ou resposta serve para estabelecer a associação, e assim o comportamento é aprendido. A única lei formal da aprendizagem de Guthrie afirma: Uma combinação de estímulos que acompanhou um movimento tende, ao se repetir, a ser seguida por esse movimento” (Guthrie, 1935; p. 26). Observe-se outra vez que não há menção aos estados de impulsos internos, à repetição do E-R ou a qualquer forma de recompensa ou reforço. A lei de Guthrie se refere a movimentos, que ele teve o cuidado de distinguir de actos. Um movimento é um padrão de respostas ou acções motoras e glandulares. Um acto, por outro lado, é um movimento ou série de movimentos que produz resultados. Embora um acto seja um movimento, um movimento não é um acto, pois este tem uma escala mais ampla. Bater num prego com um martelo, por exemplo, é um acto composto de vários movimentos distintos e produz um certo resultado. Guthrie acreditava que, quando os psicólogos medem a aprendizagem, o desempenho do acto completo costuma ser tomado como critério de aprendizagem, quando na verdade são os movimentos que são condicionados ou aprendidos como respostas. Para ele, a concentração nos movimentos era a característica distintiva de sua teoria. Ele alegava que Thorndike se interessava pelo acto total, como a aquisição de uma capacidade (como ocorre no caso de um gato que tenta escapar de uma caixa-problema), mas que isso é na realidade uma função de alguns movimentos musculares individuais. Esses movimentos, dizia ele, são desenvolvidos ou adquiridos em tentativas únicas (aprendizagem por uma tentativa), mas a aprendizagem do acto total requer uma prática repetida. Os movimentos (componentes individuais do acto aprendido) são os dados brutos do sistema de Guthrie. Por terem um alcance menor do que os actos, esses movimentos apresentam maior dificuldade de observação numa situação de aprendizagem, sendo com frequência deixados de lado. Assim como a resposta do organismo é formada de componentes separados, assim também ocorre com a estimulação a que o organismo está exposto. Como o estímulo e a resposta se compõem de muitas partes, é necessário haver um grande número de pares entre o estímulo total e as situações de resposta para que o acto de comportamento alcance consistência. Edwin Guthrie propôs urna teoria da aprendizagem simples, afirmando que os movimentos são aprendidos durante uma associação simples de estímulo e resposta. Logo, a prática é necessária para que haja progresso na aprendizagem da combinação de movimentos, isto é, do acto, mas cada movimento componente é aprendido depois de um único pareamento com o estímulo. Guthrie preferia escrever e observar a experimentar. Ele acreditava na importância da teoria para o desenvolvimento da psicologia, dizendo que são as teorias, e não os factos, que persistem. Seus vários livros contêm observações episódicas e comparativamente poucas provas experimentais. Boa parte do atractivo do seu sistema reside em sua simplicidade e consistência ao longo dos anos. Ele é fácil de compreender, em especial quando comparado com as teorias de aprendizagem mais complexas e de base matemática, como as de Huil. A simplicidade estrutural do sistema de Guthrie suscitou elogios de alguns psicólogos e críticas de outros. Sugeriu-se que ele manteve essa simplicidade por não ter tratado de problemas da aprendizagem capazes de resistir a uma explicação no âmbito do seu sistema: “Muitas análises acerca de Guthrie confundiram incompletude com simplicidade” (Mueller e Schoenfeld, 1954, p. 368). Essas críticas sugerem haver necessidade de princípios e pressupostos adicionais para abranger os principais pontos da aprendizagem. Mesmo assim Guthrie manteve sua posição e sua estatura como importante teórico da aprendizagem. Suas contribuições receberam reconhecimento formal em 1958, a Psicológica Americana lhe conferiu sua Medalha de Ouro. Clark Leonard HuIl (1884-1952) Em primeiro lugar e sobretudo um comportamentalista, Clark Hull alcançou uma posição deveras respeitada na psicologia americana nas décadas de 40 e 50. Talvez nenhum outro psicólogo tenha sido tão sistemática e profundamente dedicado aos problemas inerentes ao método científico. Ele tinha um prodigioso conhecimento da matemática e da lógica formal e o aplicou à teoria psicológica de uma maneira que ninguém fizera antes. A Vida de Huil: Por quase toda a vida, Hull teve uma saúde frágil e dificuldades visuais. Aos vinte e quatro anos, contraiu poliomielite, o que o deixou aleijado de uma perna, forçando-o a usar um pesado grampo de aço por ele mesmo construído. Como sua família não tinha recursos, ele interrompeu a sua educação várias vezes para dar aulas e ganhar a vida. Seu maior predicado foi uma intensa aspiração de grandeza e a perseverança diante de inúmeros obstáculos. Em 1918, com a idade relativamente avançada de trinta e quatro anos, ele se doutorou na Universidade de Wisconsin, onde estudara engenharia de minas antes de passar para a psicologia. Foi professor em Wisconsin durante dez anos. Suas primeiras pesquisas prenunciavam a ênfase que ele atribuiria por toda a vida aos métodos objectivos e às leis funcionais. Hull investigou a formação de conceitos e os efeitos do fumo sobre a eficiência do comportamento, e fez um reexame da literatura sobre testes e medidas, tendo publicado um importante texto na área aplicada dos testes da aptidão (HulI, 1928). Ele se esforçou por desenvolver métodos práticos de análise estatística e inventou uma máquina de calcular correlações. Essa foi uma das primeiras máquinas projectadas para fazer computações matemáticas a partir de dados codificados em fita. O aparelho está hoje exposto na Smithsonian Institution em Washington, D.C. Hull dedicou dez anos ao estudo da hipnose e da sugestão, tendo publicado trinta e dois artigos e um livro que resumia a pesquisa na área (Hull, 1933). Em 1929, Hull tornou-se professor de pesquisa na Universidade Yale, onde se dedicou ao seu mais importante interesse de pesquisa: uma teoria do comportamento baseada nas leis do condicionamento de Pavlov. Ele lera Pavlov pela primeira vez em 1927, tendo se interessado pela questão dos reflexos condicionados e da aprendizagem. Ele se referia à obra de Pavlov, Conditioned Reflexes, como “aquele grande livro”, voltando-se para o uso de sujeitos animais em seu programa de pesquisas. Ele não empregara antes ratos por não apreciar o cheiro de um laboratório de ratos; mas, em Yale, encontrou a colônia roedora estabelecida por E. R. Hilgard, que era mantida meticulosamente limpa. Conta Hilgard que ele olhou para os ratos e “cheirou os, dizendo imaginar que, afinal, poderia usar ratos” (Hilgard, 1987, p. 201). O comportamentalismo radical de Clark Leonard Huli considerava todo comportamento mecânico e quantificável. Nos anos 30, Hull escreveu artigos sobre o condicionamento, afirmando que comportamentos complexos, de ordem superior, podiam ser explicados em termos dos princípios básicos do condicionamento. Em 1940, ele publicou, com cinco colegas, Mathematico Deductive Theory of Rote Learning: A Study in Scientiflc Methodology (Teoria Matemático-Dedutiva da Aprendizagem Mecânica: Um Estudo de Metodologia Científica). Embora fosse reconhecido como uma notável realização no desenvolvimento da psicologia científica, o livro era difícil de entender, tendo sido lido por poucas pessoas. Sua próxima publicação importante, Principles of Behavior (Princípios do Comportamento), de 1943, descrevia com detalhes e uma precisão característica um referencial teórico amplo o bastante para incluir todo o comportamento. Esse livro garantiu a proeminência das ideias de Hull na área da aprendizagem nos Estados Unidos e estimulou consideráveis pesquisas. Ele logo se tomou o psicólogo citado com mais frequência no campo; na década de 40, sua obra era citada por mais de 40% dos artigos experimentais, e em 70% dos artigos sobre aprendizagem e motivação publicados nas duas principais revistas americanas de psicologia (Spence, 1952). Hull revisou seu sistema em vários artigos, e sua forma fmal apareceu em A Behavior System (Sistema do Comportamento) em 1952. Huil estava doente há anos e faleceu antes de ler as provas do livro. O Referencial Hull acreditava que o comportamento envolve uma continua interacção entre o organismo e o ambiente. Os estímulos objectivos fornecidos por este último e as respostas comportamentais objectivas advindas do organismo são factos observáveis. Contudo, a interacção ocorre num contexto mais amplo que não pode ser totalmente definido em termos observáveis de estímulo- resposta. Esse contexto mais amplo, ou referencial, é a adaptação biológica do organismo ao seu ambiente específico. A sobrevivência orgânica é ajudada por essa adaptação biológica. Quando a sobrevivência está ameaçada, diz-se que o organismo se encontra em estado de necessidade. Huil asseverava que a necessidade envolve uma situação em que os requisitos biológicos da sobrevivência não estão sendo satisfeitos. Em estado de necessidade, o organismo se comporta de uma maneira voltada para reduzir essa necessidade. Seu comportamento serve para restaurar as condições biológicas óptimas necessárias à sobrevivência. Essa preocupação de Huil com a sobrevivência biológica decorria do seu interesse pela teoria da evolução e é coerente com a ênfase funcionalista na adaptação ao ambiente. Huil estava comprometido com uma psicologia comportamentalista, objetiva. Não havia lugar em seu programa para a consciência, a intenção, nem para qualquer outra noção mentalista. Seu sistema era um comportamentalismo intransigente e radical em que ele tentava reduzir todo conceito a termos físicos, e embora talvez fosse mais rígido do que o de Watson, ele admitia a noção de variáveis intervenientes. Contudo, vinculava-as estrita e concretamente com condições objetivas de estímulo e resposta, passíveis de quantificação e medição precisas. Seu sistema e sua imagem da natureza humana eram formulados em termos mecanicistas. Para Huli, o comportamento humano é automático e cíclico, podendo ser reduzido à termino logica da física. Ele recomendava que se evitasse a intrusão do subjetivismo antropomórfico, ou seja, dar interpretações subjetivas do comportamento observado, prática comum dos primeiros psicólogos animais. A observação e a interpretação do comportamento têm de ser radicalmente objetivas. Uma forma de consegui-lo, sugeriu Hull de inicio, era pensar em termos do comportamento animal, embora mesmo isso fosse arriscado: “ é com demasiada frequência prejudicado quando o teórico começa a pensar no que faria se fosse um rato, um gato ou um chimpanzé; quando isso acontece, todo o seu conhecimento sobre o seu próprio comportamento, nascido de anos de auto-observação, começa de imediato a funcionar em lugar das leis ou princípios gerais objetivamente formulados que constituem a substência legítima da ciência” (Huil, 1943, p. 27). Ele buscava uma salvaguarda mais forte contra o subjetivismo e a encontrou numa atitude que considera o organismo um “robô completamente autónomo, construído de materiais tão diferentes de nós mesmos quanto possível” (Huli, 1943, p. 27). Assim, para Huil, os comportamentalistas precisavam ver o seu objeto de estudo como um “robô”. Ele esteve bem além do seu tempo ao considerar a possibilidade de se construírem máquinas capazes de pensar e exibir outras funções cognitivas humanas, um empreendimento hoje tentado com os computadores. “Vem-me muitas vezes à ideia”, escreveu ele em 1926, ‘que o organismo humano é uma das mais extraordinárias máquinas — e, no entanto, uma máquina — e me ocorreu mais de uma vez que, considerando os processos de pensamento, poder-se-ia construir uma máquina capaz de fazer todas as coisas essenciais que o corpo faz” (Amsel e Rashotte, 1984, pp. 2-3). O espírito do mecanismo representado pelas figuras mecânicas dos jardins e relógios da Europa seiscentista foi fielmente incorporado à obra de Huli. Uma vantagem da abordagem robótica, segundo Hull, é impedir a atribuição do comportamento a causas que não são estritamente mecânicas. Para ele, pouca diferença havia entre a psicologia e a física; e, mesmo que houvesse, seria uma questão de grau, e não de género. A Metodologia Objectiva e a Quantificação: O comportamentalismo mecanicista, reducionista e objetivo de Hull oferece uma visão clara do que devem ser os seus métodos de estudo. Evidentemente, esses métodos se caracterizam pela maior objetividade possível. Além disso, sua abordagem da psicologia caracteriza- se pela quantificação. As leis do comportamento devem ser enunciadas ou expressas na linguagem precisa da matemática, razão por que a quantificação constitui a segunda pedra angular sobre a qual Hull edificou seu comportamentalismo. Ele escreveu que os psicólogos não apenas devem desenvolver uma plena compreensão da matemática, como pensar em termos matemáticos. Em Principies of Behavior (1943), ele explicou o procedimento a ser seguido por uma psicologia matematicamente definida: º O progresso consistirá na laboriosa elaboração, uma por uma, de centenas de equações; na determinação experimental, uma por uma, de centenas de constantes empíricas contidas nas equações; na concepção de unidades utilizáveis praticamente com as quais medir as quantidades expressas pelas equações; na definição objetiva de centenas de símbolos usados nas equações; na rigorosa dedução, uma por uma, de milhares de teoremas e corolários a partir das definições e equações prima , na meticulosa realização de milhares de experimentos quantitativos fundamentaisº (HulI, 1943, pp. 400-401). Esse enunciado dá uma boa indicação do rigor — e da paciência — exigido de um seguidor do sistema de Huli. Huil descreveu quatro métodos que considerava úteis à ciência. Três já eram empregados: (1) a observação simples; (2) a observação sistemática controlada; e (3) a verificação experimental de hipóteses. Além disso, Huli exigiu a adesão estrita a um quarto método, o método hipotético-dedutivo, que usa a dedução a partir de um conjunto de formulações determinadas a priori. O método envolve o estabelecimento de postulados a partir dos quais deduzir conclusões experirnentalmente verificáveis, que são então submetidas à verificação experimental. Se as proposições não forem validadas pelas provas experimentais, deverão ser revistas. Se forem comprovadas e verificadas, poderão ser incluídas no corpo da ciência. Huli acreditava que, se a psicologia queria tornar-se uma ciência objetiva igual às outras ciências naturais, de acordo com o projeto comportamentalista, a única abordagem apropriada seria a hipotético-dedutiva. Os Impulsos: Huli considerava a necessidade corporal decorrente de um desvio de condições biológicas óptimas a base da motivação. Entretanto, em vez de introduzir o conceito de necessidade biológica diretamente em seu sistema, ele postulou a variável interveniente do impulso, um termo já empregado na psicologia. O impulso era postulado como um estímulo advindo de um estado de necessidade do tecido que desperta ou activa o comportamento. A força do impulso pode ser determinada empiricamente em termos da duração da privação ou da intensidade, força ou gasto de energia do comportamento resultante. Para ele, a duração da privação era uma medida imperfeita, razão por que acentuou a força da resposta. Considerava-se o impulso não específico. Em outras palavras, qualquer espécie de privação — de comida, de água ou de sexo, por exemplo — contribuía da mesma maneira, se bem que em graus distintos, para o impulso. Essa não especificidade significa que o impulso não dirige o comportamento, servindo apenas para energizá-lo. A orientação ou condução do comportamento é realizada por estímulos ambientais. Além disso, a redução do impulso é a base exclusiva do reforço. Hull postulou dois tipos de impulsos: primários e secundários. Os impulsos primários estão associados com estados de necessidade biológica e diretamente envolvidos na sobrevivência do organismo. Esses impulsos, oriundos de um estado de necessidade do tecido, incluem a fome, a sede, o ar, a regulação da temperatura, a defecação, a micção, o sono, a atividade, as relações sexuais e o alívio da dor. Trata-se de processos inatos básicos vitais para a sobrevivência do organismo. Ele admitiu que os seres humanos e animais são motivados por outras forças além dos impulsos primários. Assim, Huil postulou os impulsos secundários ou aprendidos, que se referem a situações ou estímulos ambientais associados com a redução de impulsos primários, e que, por isso, podem se tomar eles mesmos impulsos. Isso significa que estímulos antes neutros podem assumir as características de um impulso por serem capazes de evocar respostas semelhantes às geradas pelo impulso primário ou estado de necessidade original. Um exemplo simples envolve pôr a mão num fogão quente e se queimar. A dolorosa queimadura, cansada pela danificação do tecido, gera um impulso primário, o desejo de alívio da dor. Outros estímulos ambientais vinculados com esse impulso primário, tal como a visão do fogão, pode levar ao afastamento da mão diante da percepção do estímulo visual. Assim, a visão do fogão pode vir a ser o estímulo para o impulso aprendido do medo. Esses impulsos secundários ou aprendidos que servem para motivar o comportamento se desenvolvem com base nos impulsos primários. Devido a esse foco nos impulsos aprendidos, a aprendizagem teve um papel-chave no sistema de Hull. A Aprendizagem: Hull tentou integrar, ou ao menos reconciliar, a lei do efeito de Thorndike com o condicionamento pavloviano. Ele acreditava que a aprendizagem não poderia ser adequadamente explicada pelos princípios da recentidade e da frequência. Sua teoria da aprendizagem concentra-se primordialmente no princípio do reforço, que é, em termos essenciais, a lei do efeito de Thorndike. A lei do reforço primário de Huil postula que, quando uma relação estímulo-resposta é seguida por uma redução da necessidade, aumenta a probabilidade de que, em ocasiões subsequentes, o mesmo estímulo evoque a mesma resposta. Observe-se que a recompensa ou reforço não é definida em termos da noção thorndikeana de satisfação, mas em termos da redução de uma necessidade primária. Logo, a base da teoria da aprendizagem de Huli é o reforço primário, a redução de um impulso primário. Assim como contém impulsos secundários ou aprendidos, o sistema de Huil também trata do reforço secundário. Se a intensidade do estímulo for reduzida como resultado de um impulso secundário ou aprendido, ela vai agir como um reforço secundário: Segue-se que ºqualquer estímulo associado sistematicarnente com uma situação de reforço adquirirá, por meio dessa associação, o poder de evocar a inibição condicionada, isto é, a redução da intensidade do estímulo, e, assim, de produzir o reforço resultanteº. Como esse poder indireto de reforço é adquirido através da aprendizagem, damos-lhe o nome de reforço secundário (Huil, 1951, pp. 27-28). Huil pensava que a conexão estímulo-resposta é fortalecida pelo número de reforços que ocorreram. Ele denominava a força do vínculo E-R força do hábito, que se refere à persistência do condicionamento e é uma função do reforço. A aprendizagem não pode acontecer na ausência de reforço, que é necessário para gerar uma redução do impulso. Por causa dessa ênfase no reforço, o sistema de Huil é chamado de teoria da redução da necessidade, oposta à teoria da contiguidade de Guthrie e à teoria cognitiva de Tolrnan. O sistema de Huil é apresentado em forma verbal e matemática em termos de postulados e corolários específicos e detalhados. Em sua última publicação (HuIl, 1952) há dezoito postulados e doze corolários. Embora o sistema se fundamente em princípios de condicionamento, Huli achava que essa posição fundamental podia ser ampliada para incluir processos complexos como a solução de problemas, o comportamento social e formas de aprendizagem distintas do condicionamento. Ele viveu para ver somente parte de sua ambição realizada. Seu sistema alcançou tamanha notoriedade que gerou inevitavelmente inúmeras críticas. Como destacado expoente do neocomportamentalismo, Huli sofreu os mesmos ataques feitos a Watson e a outros seguidores da tradição comportamentalista. Os adversários de uma abordagem comportamentalista da psicologia em termos metodológicos e teóricos, incluem necessariamente Huil no campo inimigo. Pode-se acusar o programa de Huli de falta de generalização. Afirmou-se que, em sua tentativa de definir suas variáveis de modo tão preciso em termos quantitativos, ele não teve como deixar de operar sobre uma base muito estreita. Sua abordagem é extremamente particularista, tendo ele muitas vezes formulado postulados a partir de resultados obtidos numa única situação experimental. Alegam os adversários que é questionável poder generalizar para todo o comportamento com base em demonstrações experimentais específicas como “o intervalo mais favorável para o condicionamento da pálpebra humana (Postulado 2)” ou “o peso em gramas de alimento necessário para condicionar um rato (Postulado 7)” (Hilgard, 1956, p. 181). Embora a quantificação precisa seja necessária e recomendável, a abordagem extrema de Huli tende a reduzir a gama de aplicabilidade das descobertas. Em consequência, a adesão de Hull a um sistema formal e matemático de construção da teoria está aberta tanto a elogios como a críticas. Ele pode ter sido vítima do seu entusiasmo pela matemática, tendo quantificado suas proposições de maneira tão abrangente e minuciosa que as formulações incompletas ou imprecisas são relativamente fáceis de perceber. Lacunas e inconsistências numa teoria expressa por escrito podem ser mais facilmente resolvidas com ilustrações apropriadas. Criticos encontraram lacunas desse tipo no sistema de Huli e afirmam que ao menos algumas de suas formulações não são construídas com tanto rigor quanto se costumava pensar. Nem por isso é possível minimizar a influência de Huil. Já mencionamos o grande número de pesquisas ocasionadas por sua obra, talvez mais do que qualquer outra teoria, e só isso já lhe garante seu status na história da psicologia. Ele forneceu uma terminologia objetiva que foi bem aceita e representou urna nova abordagem dos dados psicológicos, não se limitando a renomear velhos conceitos. Também é um tributo à grandeza de Huli citar alguns dos psicólogos que foram seus discípulos e seguidores: John Dollard, Carl Hovland, Neal Miller, Robert Sears, Hobart Mowrer e Kenneth Spence. Poucos psicólogos tiveram um efeito tão amplo e extenso sobre a motivação profissional de tantos outros psicólogos. Hull defendeu, ampliou e expôs a abordagem comportamentalista objetiva da psicologia como ninguém fizera antes. Embora os psicólogos questionem partes ou a totalidade de sua teoria, há um respeito e uma admiração generalizados pelos métodos rigorosos que ele usou para desenvolvê-la. “Não é frequente em nenhum campo o surgimento de um verdadeiro gênio teórico; dentre os raros que a psicologia pode reivindicar para si, Huli por certo deve figurar entre os mais destacados” (Lowry, 1982, p. 211). Burrhus Frederick Skinner (1904-1990) B. F. Skinner foi por décadas, a partir dos anos 50, o mais influente individuo no campo da psicologia. São muito amplas suas áreas de interesse em sua longa carreira, bem como suas implicações para a sociedade moderna. Em 1982, um historiador da psicologia disse ser ele “inquestionavehnente, o mais famoso psicólogo americano do mundo” (Gilgen, 1982, p. 97). Quando ele morreu, em 1990, o editor da Ainerican Psychologist o saudou como o “mais importante psicólogo contemponineo... um dos gigantes da nossa disciplina”, alguém que “deixou uma marca permanente na psicologia” (Fowier, 1990, p. 1.203). Por muitos anos, Skinner foi o mais destacado comportamentalista da América, tendo atraído um amplo, leal e entusiasmado grupo de seguidores. Ele desenvolveu um programa para o controle comportamental da sociedade, inventou um berço automático para cuidar de bebês e foi o principal responsável pela introdução das técnicas de modificação do comportamento e das máquinas de ensinar. Escreveu um romance (Walden Two) que continua a ser popular mais de quarenta anos depois da sua primeira publicação. Em 1971, seu livro Beyond Freedom and Dignity (Além da Liberdade e da Dignidade) tornou-se um best-seller nacional. Ele publicou muitos artigos e livros profissionais, tendo sido comparado com Francis Galton na diversidade e na amplitude de seus interesses. A Vida de Skinner: Skinner nasceu em Susquehanna, Pensilvânia, onde viveu até ir para o colégio. Segundo o seu próprio relato, seu ambiente da infância era estável e não lhe faltou afecto. Ele frequentou o mesmo ginásio onde seus pais haviam estudado; havia apenas sete outros alunos em sua classe ao final do curso. Ele gostava da escola e era o primeiro a chegar todas as manhãs. Quando criança e adolescente, gostava de construir coisas: trenós, carrinhos, jangadas, carros séis, atiradeiras, modelos de aviões e até um canhão a vapor com o qual atirava buchas de batata e cenoura nos telhados dos vizinhos. Passou anos tentando construir uma máquina de movimento perpétuo. Também tinha interesse pelo comportamento dos animais. Lia muito sobre eles e mantinha um estoque de tartarugas, cobras, lagartos, sapos e esquilos listrados. Numa feira rural, ele observou certa feita um bando de pombos numa apresentação; anos mais tarde, ele treinaria essas aves para realizar uma variedade de façanhas. O sistema de psicologia de Skinner é sob muitos aspectos um reflexo das suas primeiras experiências de vida. Ele considerava a vida um produto de reforços passados e afirmava que a sua própria vida fora tão predeterminada, organizada e ordeira quanto o seu sistema ditava que todas as vidas humanas fossem. Ele acreditava que todos os aspectos da sua experiência pessoal remontavam apenas a fontes ambientais. A conselho de um amigo da família, Skinner se matriculou no Haniilton College de Nova York. Ele escreveu: ºTodo comportamento está sujeito a contingências de reforço, segundo B. F. Skinner, durante muitos anos o principal comportamentalista da América, que aplicou seus dados de laboratório a problemas da criação de filhos e da educação. Nunca me adaptei à vida de estudante. Ingressei numa fraternidade acadêmica sem saber do que se tratava. Não era bom nos esportes e sofria muito quando as minhas canelas eram atingidas no hóquei sobre o gelo ou quando melhores jogadores de basquete faziam tabela na minha cabeça... Num artigo que escrevi no final do meu ano de calouro, reclamei de que o colégio me obrigava a cumprir exigências desnecessárias (uma delas era a presença diária na capela) e que quase nenhum interesse intelectual era demonstrado pela maioria dos alunos.No meu último ano, eu era um rebelde declaradoº (Skinner, 1967, p. 392). Como parte dessa revolta, Skinner instigava trotes que muito perturbaram a comunidade académica e se entregava a ataques verbais aos professores e à administração. Sua desobediência continuou até o dia da graduação, quando, na abertura das cerimônias, o diretor o alertou, e aos seus amigos, que, se não se comportassem, não colariam grau. Ele se formou em inglês, recebeu a chave simbólica da Phi Beta Kappa e manifestou o desejo de tornar-se escritor. Quando criança, tinha escrito poemas e histórias, e, em 1925, num curso de verão sobre redação, o poeta Robert Frost fizera comentários favoráveis sobre seu trabalho. Durante dois anos depois da formatura, Skinner dedicou-se a escrever e então decidiu que não tinha ‘nada importante a dizer”. Sua falta de sucesso como escritor o deixou tão desesperado que ele pensou em consultar um psiquiatra. Considerou-se um fracasso e estava com sua auto-estima abalada. Também estava desapontado no amor; ao menos uma meia dúzia de jovens haviam rejeitado suas investidas, deixando-o com o que ele descreveu como intensa dor física. Skinner ficou tão perturbado que gravou a inicial do nome de uma mulher no braço, onde ela ficou durante anos. Depois de ler sobre John B. Watson e Ivan Pavlov, Skinner decidiu transferir seu interesse literário pelas pessoas para um interesse mais científico. Em 1928, inscreveu-se na pósgraduação de psicologia em Harvard, embora nunca tivesse estudado psicologia antes. Foi para a pós-graduação, disse ele, “não porque fosse um adepto totalmente comprometido da psicologia, mas para fugir de uma alternativa intolerável” (Skinner, 1979, p. 37). Comprometido ou não, doutorou-se três anos mais tarde. Seu tema de dissertação dá um primeiro vislumbre da posição a que ele iria aderir por toda a sua carreira. Sua principal proposição era de que um reflexo não é senão a correlação entre um estímulo e uma resposta. Depois de vários pós-doutorados, Skinner foi dar aulas na Universidade de Minnesota (1936-1945) e na Universidade de Indiana (1945-1947). Em 1947, voltou a Harvard. Seu livro de 1938, The Behavior of Organisms (O Comportamento dos Organismos), descreve os pontos essenciais do seu sistema. Cinquenta anos mais tarde, esse livro foi considerado “um dos poucos livros que mudaram a face da psicologia moderna” (Thompson, 1988, p. 397), e ainda é muito lido. Seu livro de 1953, Scíence and Hwnan Behavíor (Ciência e Comportamento Humano), é o manual básico da sua psicologia comportamentalista. Skinner manteve-se produtivo até a morte, aos oitenta e seis anos, trabalhando até o fim com o mesmo entusiasmo com que começara uns sessenta anos antes. Em seus últimos anos de vida, ele construiu, no porão de sua casa, sua própria “caixa de Skinner” — um ambiente controlado que propiciava reforço positivo. Ele dormia ali num tanque plástico amarelo, de tamanho apenas suficiente para conter um colchão, algumas prateleiras de livros e um pequeno televisor. Ia dormir toda noite às dez, acordava três horas depois, trabalhava por uma hora, dormia mais três horas e despertava às cinco da manhã para trabalhar mais três horas. Então, ia para o gabinete na universidade para trabalhar mais, e toda tarde retemperava as forças ouvindo música. Aos setenta e oito anos, escreveu um artigo intitulado “Auto-Administração Intelectual na Velhice”, citando suas próprias experiências como estudo de caso (Skinner, 1983a). Ele mostrava que é necessário que o cérebro trabalhe menos horas a cada dia, com períodos de descanso entre picos de esforço, para a pessoa lidar com a memória que começa a falhar e com a redução das capacidades intelectuais na velhice. Doente terminal com leucemia, apresentou uma comunicação na convenção de 1990 da APA, em Boston, apenas oito dias antes de morrer; nela, ele atacava a psicologia cognitiva. Na noite anterior à sua morte, estava traba lhando em seu artigo frnal, “Pode a Psicologia ser uma Ciência da Mente?” (Skinner, 1990), outra acusação ao movimento cognitivo que estava suplantando sua definição de psicologia. O Comportamentalismo de Skinner: Em vários aspectos importantes, a posição de Skinner representa uma renovação do comportamentalismo watsoniano. Com efeito, um psicólogo escreveu que “o espírito de Watson é indestrutível. Expurgado e purificado, respira por meio dos escritos de B. F. Skinner” (MacLeod, 1959, p. 34). Embora Clark Huil também seja considerado um comportamentalista rigoroso, há nítidas diferenças entre a sua abordagem e a de Skinner. Enquanto Huil acentuava a importância da teoria, Skinner defendia um sistema estritamente empírico sem referencial teórico no âmbito do qual realizar pesquisas. O trabalho de Huil consistia em propor uma teoria e fazer a verificação das conclusões deduzidas a partir de provas experimentais; Skinner evitava a teoria e preferia praticar um positivismo estrito: começava com dados empíricos e trabalhava, cuidadosa e lentamente, na elaboração de generalizações conjeturais. HulI representa o método dedutivo; Skinner, o indutivo. Skinner resumiu sua perspectiva da seguinte maneira: “Nunca tratei de um problema construindo uma hipótese. Nunca deduzi teoremas, nem os submeti à prova experimental. Pelo que sei, eu não tinha um modelo preconcebido de comportamento — certamente não um modelo fisiológico e mentalista, e, creio eu, tampouco um conceitual” (Skinner, 1956, p. 227). Seu tipo exclusivamente descritivo de comportamentalismo radical se dedica ao estudo das respostas; volta-se para descrever, e não para explicar, o comportamento. Ele só se ocupava do comportamento observável e acreditava que a tarefa da investigação científica se traduz em estabelecer relacionamentos funcionais entre as condições de estímulo controladas pelo experimentador e a resposta subsequente do organismo. Em Science and Hurnan Behavior (1953), Skinner escreveu sobre as figuras mecânicas dos jardins reais da Europa do século XVII e sobre a imagem mecânica dos seres humanos por elas retratada. Sob o titulo “O Homem, Uma Máquina”, ele descrevia como suas ideias são compatíveis com essa imagem mecânica precedente. O organismo humano, dizia Skinner, é uma máquina, e o ser humano, como qualquer outra máquina, se comporta de maneiras previsíveis e regulares em resposta às forças externas, os estímulos, que o afetam. Skinner não se interessava nem um pouco por teorizar ou especular sobre o que pode estar ocorrendo no interior do organismo. Seu programa não inclui pressupostos sobre entidades internas, descritas quer como variáveis intervenientes ou como processos fisiológicos. O que quer que aconteça entre o estímulo e a resposta não representa, para um comportamentalista skinneriano, dados objetivos. Esse comportamentalismo descritivo estrito tem sido chamado, e com boas razões, de abordagem do organismo vazio. Atuamos a partir de forças do ambiente, do mundo exterior, e não de forças interiores. É importante notar que, embora o seu sistema seja a-teórico, Skinner não se opunha por inteiro à teorização. Na verdade, ele era adversário da teorização prematura, feita na ausência de dados comprovatórios adequados. Numa entrevista de 1968, Skinner disse que ansiava por “uma teoria geral do comportamento humano que retina uma batelada de fatos e os exprima de urna forma geral. Eu estaria muito interessado em estimular esse tipo de teoria” (Evans, 1968, p. 88). Ao contrário de muitos psicólogos contemporâneos, Skinner não era favorável ao uso de grande número de sujeitos ou de comparações estatísticas entre a mediana e a média das respostas de grupos. Ele se concentrava, em vez disso, na intensa e exaustiva investigação de um único sujeito: A previsão do que o indivíduo médio faz com freqeência tem pouco ou nenhum valor quando temos diante de nós um indivíduo particular... Uma ciência é útil para tratar com o individuo apenas na medida em que as suas leis se refiram a indivíduos. Uma ciência do comportamento que só se ocupe do comportamento de grupos provavelmente não serve de ajuda para a compreensão do caso particular (Skinner, 1953, p. 19). Skinner acreditava que resultados reproduzíveis e válidos poderiam ser obtidos de um único sujeito sem o recurso à análise estatística, desde que dados suficientes fossem coletados em condições experimentais bem controladas. Ele afirmava que o uso de um grande grupo de sujeitos obrigava o pesquisador a dar atenção ao comportamento médio e, como resultado, o comportamento de resposta individual e as diferenças individuais de comportamento se perdiam. Em 1958, os skinnerianos fundaram sua própria publicação, Journal for the Experimental Analysis of Behavior , principalmente em função dos requisitos tradicionais das revistas de psicologia com relação ao uso da análise estatística e do tamanho da amostra. Dez anos mais tarde, a Joumal of Applied Behavior Analysis foi fundada para servir de saída ao crescente corpo de pesquisas sobre a modificação do comportamento, um desdobramento aplicado do sistema de Skinner. O Condicionamento Operante: Todo aluno de psicologia conhece a ênfase de Skinner no comportamento operante, em oposição ao respondente. Na situação de condicionamento pavloviana, um estímulo conhecido é associado com uma resposta em condições de reforço. A resposta comportamental é suscitada por um estímulo observável específico; Skinner dava-lhe o nome de comportamento respondente. O comportamento operante ocorre sem nenhum estímulo externo observável; a resposta do organismo é aparentemente espontânea — no sentido de não estar relacionada com nenhum estímulo observável. Isso não significa que não haja de fato um estímulo suscitando a resposta, mas sim que não se detecta nenhum estímulo quando da ocorrência da resposta. Do ponto de vista dos experimentadores, não há estímulo porque eles não aplicaram nenhum e não em ver nenhum. Outra diferença entre o comportamento respondente e o operante é que o comportamento operante opera no ambiente do organismo, ao passo que o respondente não o faz. O cão preso a arreios no laboratório de Pavlov não pode senão responder quando o pesquisador lhe apresenta o estímulo; ele não pode agir por sua própria conta para assegurar o estímulo. O comportamento operante do rato na caixa de Skinner, no entanto, serve de instrumento para garantir o estímulo (o alimento). Quando pressiona a barra, o rato recebe comida; ele não recebe nenhuma comida enquanto não pressionar a barra e, assim, opera no ambiente. (Skinner deplorou o termo caixa de Skinner, usado pela primeira vez por Hull em 1933, como rótulo para o seu aparato de condicionamento operante. O termo, porém, tomou-se tão popular que está na maioria dos dicionários e é de uso aceito em psicologia.). Skinner acreditava que o comportamento operante é muito mais representativo da situação de aprendizagem humana na vida real. Como o comportamento é principalmente do tipo operante, a mais eficaz abordagem de uma ciência do comportamento, alegava ele, consiste em estudar o condicionamento e a extinção de comportamentos operantes. Sua demonstração experimental clássica envolvia o pressionar uma barra numa caixa de Skinner construída para eliminar estímulos externos. Nessa experiência, um rato privado de comida era colocado no aparelho e deixado livre para explorar o ambiente. No curso dessa exploração geral, o rato cedo ou tarde pressionava acidentalmente uma alavanca que ativava um mecanismo que liberava uma pelota de alimento numa bandeja. Depois do recebimento de algumas dessas pelotas, o reforço, o condicionamento costumava ser rápido. Observe-se que o comportamento do rato (pressionar a barra ou alavanca) agia sobre o ambiente e era instrumental na garantia do alimento. A variável dependente desse tipo de experiência é simples e direta: a taxa de resposta. Um registrador cumulativo ligado à caixa de Skinner acompanha momento a momento a taxa de pressão da barra. A partir dessa experiência básica, Skinner derivou sua lei da aquisição, segundo a qual a força de um comportamento operante aumenta quando ele é seguido pela apresentação de um estímulo de reforço. Embora a prática seja importante no estabelecimento de altas taxas de pressão da barra, a variável-chave é o reforço. A prática por si só não aumenta a taxa; tudo o que ela faz é dar oportunidade para a ocorrência do reforço adicional. A lei da aquisição de Skinner difere das posições de Thorndike e de HulI sobre a aprendizagem. Skinner não fala em termos das consequências de prazer-dor do reforço, como fez Thomdike, nem faz tentativas para interpretar o reforço em termos da redução do impulso, como fez Huil. Os sistemas de Thorndike e de Hull são explicativos, enquanto o de Skinner é descritivo. Para ele, o impulso não passa de um conjunto de operações que influencia o comportamento de resposta de uma dada maneira; ele não o vê como um estímulo nem como um estado fisiológico. Ele o definia objetivamente em termos do número de horas de privação. Skinner e seu seguidores fizeram muitas pesquisas sobre problemas de aprendizagem, tais como o papel da punição na aquisição de respostas, o efeito de diferentes programas de reforço, a extinção da resposta operante, o reforço secundário e a generalização. Ele também trabalhou com outros animais e com sujeitos humanos, usando a mesma abordagem básica da caixa de Skinner. Com pombos, o comportamento operante envolve bicar uma chave ou um ponto determinado; o reforço é o alimento. No caso dos seres humanos, o comportamento operante envolve a resolução de problemas, reforçada pela aprovação verbal ou pelo conhecimento de ter dado a resposta correta. Skinner relatou uma experiência de usar o afago nas costas como reforço para sua filha de três anos, mas o experimento fracassou. Ele estava falando com ela na hora de dormir enquanto afagava-lhe as costas e decidiu testar esse ato como reforço. “Esperei”, escreveu ele, até que ela levantasse o pé ligeiramente e fiz-lhe uma rápida carícia. Quase imediatamente, ela levantou o pé outra vez e eu voltei a afagá-la. E ela riu. ‘De que você está rindo?’, perguntei. Cada vez que levanto o meu pé, você passa a mão nas minhas costas!’ “(Skinner, 1987a, p. 179). Programas de Reforço: Para muitos psicólogos, a mais notável pesquisa de Skinner é a dedicada aos efeitos de diferentes programas de reforço. A pesquisa inicial de pressionar a barra na caixa de Skinner demonstrou o papel necessário do reforço no comportamento operante. Naquela situação, o comportamento do rato era reforçado a cada pressão da barra, isto é, ele recebia comida cada vez que dava a resposta correta. Contudo, como assinalou Skinner, o reforço no mundo real nem sempre é consistente ou contínuo, mas, mesmo assim, a aprendizagem ocorre e os comportamentos persistem, ainda que reforçados só intermitentemente. Nem sempre encontramos um bom gelo ou uma boa neve quando vamos patinar ou esquiar... Nem sempre conseguimos uma boa refeição num restaurante particular, já que os cozinheiros nem sempre são previsíveis. Nem sempre conseguimos uma resposta quando telefonamos a um amigo, pois o amigo nem sempre está em casa... Os reforços característicos da indústria e da educação são quase sempre intermitentes, visto não ser viável controlar o comportamento mediante o reforço de cada resposta (Skinner, 1953, p. 99). Mesmo que se estude com afmco, nem sempre se consegue a nota máxima em todos os exames. No trabalho, não se recebem elogios ou aumentos de salários todos os dias. Na lotaria, ou num caça-níqueis, não se ganha todo o tempo. Como pode o comportamento ser afetado por esse reforço intermitente? Há algum programa de reforço ótimo em termos de influência do comportamento? Skínner e seus colegas dedicaram anos de pesquisa a essas interrogações (Ferster e Skinner, 1957; Skinner, 1969). O impulso para essa pesquisa não veio da curiosidade intelectual, mas da necessidade, demonstrando que a ciência às vezes opera de uma maneira bem distinta da imagem idealizada apresentada em alguns manuais. Numa tarde de sábado, Skinner descobriu que seu estoque de pelotas estava acabando. Na época (os anos 30), as pelotas não podiam ser compradas de uma empresa fornecedora de laboratório. O experimentador tinha de fazê-las ele mesmo, num laborioso e demorado processo. Em vez de passar o fim de semana fazendo isso, Skinner se perguntou o que aconteceria se só reforçasse os ratos uma vez por minuto, independentemente do número de respostas que eles dessem. Assim, ele precisaria de muito menos pelotas. Skinner desenvolveu uma longa série de experiências para testar diferentes taxas e tempos de reforço. Num conjunto de estudos, ele comparou as taxas de resposta de animais reforçados a cada resposta com a dos reforçados apenas depois de um certo intervalo de tempo. Esta última condição é conhecida como programa de reforço com intervalo fixo. O reforço pode ser dado, por exemplo, a cada minuto ou a cada quatro minutos. O importante é que o animal só seja reforçado depois da passagem de um período fixo de tempo. Um trabalho cujo salário é pago semanal ou mensalmente dá reforço num programa de íntervãlo fixo. Os empregados, nesses sistemas, não recebem pelo número de itens que produzem (número de respostas dadas), mas pelo número de dias ou semanas transcorridos. A pesquisa de Skinner mostrou que, quanto menor o intervalo entre reforços, tanto mais rápida a resposta do animal. Inversamente, com o aumento do intervalo entre reforços, a taxa de resposta declinava. A frequência do reforço também afeta a extinção de uma resposta. Os comportamentos se extinguem mais rapidamente quando foram reforçados continuamente, suspendendo-se em seguida os reforços, do que quando foram reforçados intermitentemente. Alguns pombos responderam até dez mil vezes na ausência de reforço quando foram condicionados num programa de reforço intermitente. Skinner também investigou um programa de reforço de razão fixa. Nesse caso, o reforço é apresentado, não depois de passado um certo intervalo de tempo, mas depois de um número predeterminado de respostas. O comportamento do animal determina a frequência do reforço. Espera-se que ele responda, por exemplo, dez ou vinte vezes depois de receber um reforço e antes de receber outro. Os animais num programa de razão fixa respondem mais rapidamente do que os de um programa de intervalo fixo. A resposta mais rápida no reforço de intervalo fixo não produz reforço adicional; o animal num programa de intervalo fixo pode pressionar a barra cinco ou cinquenta vezes e ainda será reforçado somente quando o intervalo de tempo predeterminado tiver transcorrido. A taxa mais elevada de respostas no programa de razão fixa foi considerada válida para ratos, pombos e seres humanos. Um programa de razão fixa de pagamento é usado no comércio e na indústria quando o salário do empregado depende do número de unidades produzidas ou quando uma comissão de vendas depende do número de itens vendidos. Esse programa de reforço só funciona enquanto a razão não for alta demais (ou seja, uma quantidade de trabalho impossível exigida para cada unidade de salário) e o reforço valer o esforço. Outros programas de reforço incluem razões variáveis, intervalos variáveis e esquemas mistos. O Comportamento Verbal : O comportamento verbal é a única área em que Skinner admitia diferenças entre o rato e o homem. Os sons que o organismo humano produz na fala, dizia Skinner, são respostas que podem ser reforçadas por outros sons da fala ou gestos, da mesma maneira como o comportamento do rato de pressionar a barra pode ser reforçado por comida. Para o bebê, os sons específicos que serão reforçados dependem da cultura, mas os mecanismos do comportamento verbal são independentes dela. O comportamento verbal exige duas pessoas em interação — uma falando e outra ouvindo, O falante dá uma resposta, isto é, emite um som. O ouvinte, através do seu comportamento de reforçar, não reforçar ou punir o falante pelo que disse, pode controlar o comportamento subseqüente deste último. Por exemplo, se toda vez que o falante usar uma certa palavra o ouvinte sorrir, este aumenta a probabilidade de que o falante repita essa palavra. Se o ouvinte responde franzindo o cenho, fazendo gestos hostis ou um comentário desfavorável, estará aumentando a possibilidade de o falante evitar essa palavra no futuro. Podemos ver exemplos desse processo no comportamento de pais quando os filhos aprendem a falar. Palavras inaceitáveis, uso incorreto e pronúncia ruim evocam reações diferentes das provocadas por frases polidas, uso correto e pronúncia clara. Assim, a criança é ensinada a usar adequadamente a fala, ao menos de acordo com o que os pais acham que isso seja. Para Skinner, a fala é comportamento, estando, pois, sujeita, como qualquer outro comportamento, a contingências de reforço, de previsão e de controle. Seu trabalho sobre isso está resumido no livro Verbal Behavior (O Comportamento Verbal), publicado em 1957. As Máquinas Comportamentalistas de Skinner: Discutimos a caixa de Skinner e o seu uso em experiências de condicionamento operante. Ela, contudo, não é o único instrumento que Skinner desenvolveu. A caixa lhe deu proeminência na psicologia, e o berço de ar — um artefato projetado para mecanizar o cuidado infantil — lhe trouxe notoriedade pública. Ele descreveu seu desenvolvimento num artigo publicado na Ladies Home Journal em 1945. Quando ele e a esposa decidiram ter um segundo filho, ela observou que cuidar da criança nos primeiros anos de vida exigia muita atenção e trabalhos domésticos; assim, Skinner inventou um aparelho automático para aliviar os pais dessas tarefas. A invenção foi comercializada mas nunca teve grande sucesso. O berço de ar foi descrito como “um compartimento amplo, com ar condicionado, temperatura controlada, imune a germes e à prova de som, em que o bebê pode dormir e brincar sem mantas ou quaisquer roupas além das fraldas. Permite uma completa liberdade de movimentos e uma relativa segurança dos resfriados e assaduras comuns” (Rice, 1968, p. 98). Skinner e a esposa criaram o segundo filho no berço de ar. A não ser uma perna quebrada num acidente de esqui fora do berço, a criança aparentemente não sofreu nenhum efeito maléfico e até conseguiu vencer o pai no xadrez. Outro aparelho que Skinner promoveu foi a máquina de ensinar, inventada pelo psicólogo Sidney Pressey nos anos 20. Infelizmente para Pressey, a máquina estava muito além do seu tempo e ninguém exprimiu interesse por ela. Assim, fatores contextuais podem ter sido responsáveis pela falta de interesse na época, bem como pela entusiástica aceitação do aparelho uns trinta anos depois (Benjamin, 1988). Nos anos 20, quando Pressey introduziu a máquina, ela prometia ensinar num ritmo mais rápido com menos professores. Naquele momento, porém, havia um superávito de professores e não havia pressão pública para melhorar o processo de aprendizagem. Nos anos cinqüenta, quando Skinner introduziü um artefato semelhante, havia carência de professores, um numero incomumente grande de alunos e pressão pública para melhorar a qualidade da educação para que os americanos pudessem competir com os russos na exploração do espaço. Skinner conta que não sabia da invenção de Pressey ao desenvolver a sua, mas deu o devido crédito ao seu predecessor. Skinner popularizou sua máquina depois de visitar a classe da série de sua filha, quando ele decidiu que algo tinha de ser feito para melhorar o processo de ensino. Ele resumiu seu trabalho nesse campo em The Technology of Teaching (A Tecnologia do Ensino), de 1968. As máquinas de ensinar tiveram amplo uso entre o final da década de 50 e o começo da de 60, sendo substituídas pelos métodos de instrução assistidos por computador. Uma Sociedade Comportamentalista: Skinner estabeleceu um programa de controle comportamental, uma tecnologia do comportamento, em que tentou transpor para a sociedade mais ampla suas descobertas de laboratório. Enquanto John B. Watson falava em termos gerais sobre uma fundação para uma existência mais sã por meio dos princípios do condicionamento, Skinner esboçou a operação de uma tal sociedade em detalhes. Em 1948, ele publicou a tal sociedade comportamentalista, um romance em que descreve uma comunidade rural de mil membros na qual cada aspecto da vida é controlado pelo reforço positivo. O livro surgiu de um período de depressão por que Skinner passou, aos quarenta e um anos. Ele a resolveu retornando temporariamente à sua identidade anterior de escritor. Estava vivendo um turbilhão com relação a muitos aspectos de sua vida, pessoal e profissional, e fez jorrar seu desespero por meio do livro, falando através da principal personagem da história, T. E. Frazier. “Boa parte da vida em Waiden Twoºsociedade comportamentalistaº era a minha própria vida na época”, admitiu Skinner. “Permiti que Frazier dissesse coisas que eu mesmo ainda não estava preparado para dizer a quem quer que fosse” (Skinner, 1979, pp. 297-298). No romance, o Skinner ficcional fala abertamente dos seus problemas emocionais. O livro foi festejado e atacado em resenhas e só uns poucos milhares de exemplares foram vendidos até o começo dos anos 60. Então, as vendas aumentaram vertiginosamente, tendo hoje chegado aos milhões. O livro continua popular e sua leitura é exigida em muitos cursos. A longa linha de pensamento que vem de Galileu e Newton e passa pelos empiristas britênicos e por Watson alcança seu ponto culminante na sociedade Walden Two de Skinner e em seu pressuposto básico da natureza maquinal do ser humano. “Se formos usar os métodos da ciência no campo dos assuntos humanos, devemos supor que o comportamento é ordenado e determinado.., que aquilo que o homem faz é o resultado de condições especificáveis e que, uma vez que essas condições sejam descobertas, poderemos prever, e até certo ponto determinar, suas ações” (Skinner, 1953, p. 6). A abordagem mecanicista analítica e determinista da ciência natural, reforçada pelos experimentos de condicionamento de Sldnner, persuadiu os comportamentalistas de que o comportamento humano poderia ser controlado, orientado, modificado e moldado pelo uso adequado do reforço positivo. Na controvérsia livre-arbítrio/determinismo, é fácil ver de que lado do muro estão os skinnerianos. Skinner afirmou repetidamente que “não se deve deixar a questão da liberdade pessoal interferir na análise científica do comportamento humano. Não podemos alimentar a esperança de empregar as vantagens da aplicação dos métodos da ciência ao comportamento humano se, por alguma razão estranha, nos recusamos a admitir que o nosso objeto de estudo pode ser controlado” (Skinner, 1953, p. 322). Essa posição é discutida em Beyond Freedom and Dignity (Skinner, 1971), um livro que gerou muita publicidade, provocada pelo aparecimento de Skinner em programas de entrevistas na televisão, e se tomou um best-seller. Tal como ocorrera com Waiden Twa, essa obra foi louvada por uns e ridicularizada por outros. O fato de ter sido lida por tantas pessoas demonstra a curiosidade pública sobre as concepções de Skinner. A Modificação do Comportamento: O programa de Skinner para uma sociedade baseada no reforço positivo existe apenas em termos ficcionais, mas o controle ou modificação do comportamento de pessoas e pequenos grupos é muito difundido. A modificação do comportamento mediante o reforço positivo é uma técnica popular em hospícios, fábricas, prisões e escolas, onde é usada para transformar comportamentos anormais ou indesejáveis em comportamentos mais aceitáveis e desejáveis. Ela opera com as pessoas do mesmo modo como o aparato de condicionamento operante opera para modificar o comportamento de ratos: reforçando o comportamento desejado e não reforçando o indesejado. Pensemos na criança que tem ataques para conseguir comida ou atenção. Quando os pais cedem às suas exigências, reforça-se o comportamento indesejável. Na modificação do comportarnento, atitudes como chutar e gritar nunca são reforçadas. O reforço só se aplica a comportamentos mais agradáveis e desejáveis. Depois de um certo período, a criança muda de atitude porque suas exibições de mau humor, já não servem para produzir recompensas, ocorrendo o contrário com os comportamentos agradáveis. O condicionamento e o reforço operantes têm sido aplicados no mundo dos negócios, em que são usados com sucesso programas de modificação do comportamento para reduzir as faltas e o abuso das licenças médicas e para melhorar o desempenho e a segurança no trabalho. Essas técnicas também são empregadas para ensinar habilidades ocupacionais, especialmente a trabalhadores com deficiências, costumando ter êxito onde fracassam os métodos de treinamento mais tradicionais. A modificação do comportamento também tem sido aplicada a doentes mentais. Recompensando os pacientes com brindes que podem ser trocados por bens ou privilégios quando eles se comportam da maneira desejada, e não reforçando o comportamento negativo ou disruptivo, podem-se induzir mudanças comportamentais positivas. Ao contrário das técnicas clínicas tradicionais, não há nesse caso uma preocupação com o que possa estar se passando na mente do paciente, assim como não se pensa no que pode acontecer dentro do rato na caixa de Skinner. O foco é exclusivamente o comportamento manifesto e o reforço positivo. Não se usa a punição; ninguém é punido por não exibir o comportamento desejado. Em vez disso, as pessoas são reforçadas ou recompensadas quando seu comportamento sofre mudanças positivas. Assim como Thorndike, Skinner acreditava que o reforço positivo é muito mais eficaz do que a punição na alteração do comportamento, posição sustentada por consideráveis pesquisas humanas e animais. (Skinner escreveu que, quando criança, nunca foi fisicamente punido pelo pai, e só uma vez por sua mãe; ela lavou sua boca com água e sabão porque ele disse um palavrão - Skinner, 1976. Ele não disse se a punição conseguiu mudar o seu comportamento.) Como quer que se vejam as intenções de Skinner — quer o consideremos um salvador ou um escravizador de seres humanos —, não se pode negar o alcance de sua influência sobre a psicologia contemporânea. Mas ele foi muito criticado, tanto dentro como fora da instituição psicológica. Talvez a objeção mais freqüente se dirija ao seu positivismo extremo e à sua oposição à teoria. Alegam os adversários ser impossível eliminar toda a teorização, como Skinner teria feito. Os detalhes de uma experiência devem ser planejados antes de sua execução, e esse planeamento é prova de teorização, mesmo simples. Também se observou que a aceitação por Skinner dos princípios básicos do condicionamento como o referencial da sua pesquisa constitui um certo grau de teorização. Além disso, Skinner fez asserções ousadas sobre questões econômicas, sociais, políticas e religiosas que aparentemente derivou do seu sistema. Em 1986, por exemplo, ele escreveu um artigo de título abrangente: ‘O Que Há de Errado com a Vida Diária no Mundo Ocidental?” Nele, afirmava que “o comportamento humano no Ocidente se enfraqueceu, mas pode ser fortalecido mediante a aplicação de princípios derivados de uma análise experimental do comportamento” (Skinner, 1986, p. 568). Essa propensão a extrapolar os dados, em especial com relação a propostas sobre complexos problemas humanos, não tem coerência com uma posição a-teórica e mostra que Skinner foi além dos dados observáveis ao apresentar uma matriz para a reorganização da sociedade. A gama estreita de comportamento estudada nos laboratórios skinnerianos (tal como pressionar a barra e bicar a chave) também tem sido atacada. Dizem os críticos que esses estudos ignoram muitos aspectos do comportamento. Por exemplo, a posição de Skinner de que todo comportamento é aprendido foi contestada por um dos seus ex-alunos, que condicionou mais de seis mil animais de trinta e oito espécies para atuar em comerciais de televisão, atrações turísticas e feiras e exposições (Breland e Breland, 1961). Porcos, galinhas, hamsters, porcos-marinhos, baleias, vacas e outros animais demonstraram uma tendência para a deriva instintiva, isto é, substituiam os comportamentos reforçados por comportamentos instintivos, mesmo quando esses comportamentos prejudicavam a obtenção de alimento suficiente. A posição de Skinner sobre o comportamento verbal, particular sobre a aquisição da linguagem pelos bebês, foi contestada com base na afirmação de que alguns comportamentos devem ser dados a priori. Alegam os críticos que a criança não aprende uma língua numa base palavra por palavra em função do reforço recebido para o uso ou pronúncia corretos de cada uma delas. Em vez disso, o bebê domina as regras gramaticais necessárias à produção de frases, e é o potencial para construir essas regras, prossegue o argumento, que é herdado e não aprendido (Chomsky, 1959, 1972). Quer prevaleça, a longo prazo, a crítica ou o elogio, pode-se afirmar com certeza que Skinner foi o líder e o defensor inconteste da psicologia comportamentalista. A maioria dos seus oponentes tem de concordar que a psicologia americana foi moldada, ao menos por três décadas, mais pela sua obra do que pela de qualquer outro psicólogo. A APA concedeu-lhe o Distinguished Scientific Contribut.ion Award em 1958, notando que “poucos psicólogos americanos tiveram um impacto tão profundo sobre o desenvolvimento da psicologia e sobre promissores psicólogos mais jovens”. Em 1968, Skinner recebeu a Medalha Nacional de Ciência, a maior honraria conferida pelo governo dos Estados Unidos por contribuições notáveis à ciência. Em 1971, a Fundação Psicológica Americana deu-lhe seu GoId Medal Award e ele foi capa da revista Time. E, em 1990, Skinner foi agraciado com a Citação Presidencial por uma Vida de Contribuição à Psicologia da APA. É importante notar que a meta de Skinner era a melhoria da vida das pessoas e da sociedade. Apesar da natureza mecanicista do seu sistema, Skinner era um humanitário, uma qualidade evidente em seus esforços por modificar o comportamento nos ambientes do mundo real — lares, escolas, fábricas e instituições de saúde mental. Ele esperava que sua tecnologia do comportamento aliviasse o sofrimento humano e sentia-se cada vez mais frustrado com o fato de o seu sistema, embora popular e influente, não estar sendo aplicado mais amplamente. Não há dúvida de que o comportamentalismo radical de Skinner alcançou e manteve uma posição forte no âmbito da psicologia. As publicações Joumal for the Experimental Analysis of Behavior e Journal of Applied Behavior Analysis continuam a florescer, assim como a Divisão de Análise Experimental do Comportamento da APA. A aplicação de princípios skinnerianos na forma de técnicas de modificação do comportamento permanece popular, e os resultados do seu trabalho fornecem apoio adicional à sua abordagem. Sejam quais forem os índices de aclamação profissional e pública, o comportamentalismo skinneriano com toda a certeza superou todas as outras variedades na área. Teorias da Aprendizagen Social O Desafio Cognitivo no Âmbito do Comportamentalismo: Vimos que o comportamentalismo, tal como outras posições sistemáticas, tem uma longa história. John B. Watson deu voz ao clima em mutação da época, na psicologia americana, rebelou-se contra seus fundamentos mentalistas e estabeleceu fortnalmente uma ciência objetiva do comportamento. Esse vigoroso movimento marcou o começo da era positivista na psicologia americana. Seguiram-se entusiásticas formulações de diferentes espécies de comportamentalismo. Cinquenta anos depois da publicação do artigo de Watson que lançou o comportamentalismo, Skinner marcou o aniversário com um texto intitulado “O Comportamentalismo aos Cinqüenta” (Skinner, 1963), em que observou que o tremendo progresso da psicologia experimental nos Estados Unidos se deveu essencialinente à influência do comportamentalismo. Apesar de toda a sua popularidade e influência, o comportamentalismo foi atacado por muitos psicólogos, inclusive por alguns que se identificavam como comportamentalistas. Eles questionaram a negação total dos processos mentais ou cognitivos e formaram um novo movimento, a abordagem da aprendizagem social ou sócio-comportamentalista, que reflete a revolução cognitiva mais ampla na psicologia. Esse movimento marca o terceiro estágio — o neo-neocomportamentalismo — do desenvolvimento do comportamentalismo. Desde mais ou menos 1960, tem havido em psicologia um afastamento das “algemas restritivas do comportamentalismo na direção de uma ênfase mais flexível nos processos cognitivos” (Bruner, 1982, p. 42). Hoje, a consciência retornou à psicologia de forma total. Como seria de esperar, Skinner lamentou essa tendência, observando que “o mentalismo voltou como um dilúvio... Tornou-se elegante inserir a palavra ‘cognitivo’ onde for possível” (Skinner, 1983b, p. 194). Discutiremos o movimento cognitivo em escala maior — suas origens e impacto sobre a psicologia contemporânea mais adiante.. Vamos dar aqui dois exemplos da maneira pela qual o retorno à consciência alterou a natureza do comportamentalismo. Faremos uma breve consideração dos trabalhos dos neo-neocomportamentalistas Albert Bandura e Julian Rotter. Albert Bandura (1925- Nascido no Canadá, Albert Bandura doutorou-se em 1952 na Universidade de Iowa e foi fazer parte do corpo docente de Stanford. A partir do início dos anos 60, ele propôs uma versão do comportamentalismo inicialmente definida como abordagem sóciocomportamentalista, mas depois denominada teoria cognitiva social (Bandura, 1986). A Teoria Cognitiva Social:A teoria cognitiva social de Bandura é uma forma de comportamentalismo menos extrema do que a de Skinner que reflete e reforça o impacto do interesse renovado pelos fatores cognitivos. A abordagem de Bandura permanece, mesmo assim, comportamentalista; sua pesquisa se concentra na observação do comportamento de sujeitos humanos em interação. Ele não usa a introspecção e enfatiza o papel do reforço na aquisição e modificação dos comportamentos. Além de comportamental, o sistema de Bandura é cognitivo. Ele considera a influência em programas de reforço externo de processos de pensamento como crenças, expectativas e instruções. Ao ver de Bandura, as respostas comportamentais não são automaticamente suscitadas por estímulos externos à feição de um robô ou máquina. Em vez disso, as reações a estímulos são auto-ativadas. Quando um reforço exterior altera o comportamento, ele o faz porque o indivíduo tem percepção consciente do que está sendo reforçado e antecipa o mesmo reforço por comportar-se outra vez da mesma maneira. Embora concorde com Skinner que o comportamento humano pode modificar-se devido ao reforço, Bandura acredita, tendo demonstrado empiricamente, que virtualmente todo tipo de comportamento pode ser aprendido na ausência do reforço diretamente vivenciado. Nem sempre temos de vivenciar o reforço; podemos aprender por meio do reforço vicário, pela observação dos comportamentos e das consequências dos comportamentos de outras pessoas. Essa capacidade para aprender pelo exemplo e pelo reforço vicário supõe a aptidão de antecipar e avaliar consequências apenas observadas em outras pessoas e ainda não vivenciadas. Podemos regular e orientar o nosso comportamento visualizando ou imaginando consequências ainda não vivenciadas desse comportamento e tomando uma decisão consciente de nos comportarmos ou não da mesma maneira. Por conseguinte, não há uma ligação entre um estímulo e uma resposta, ou entre comportamento e reforço, como havia no caso do sistema de Skinner. Em vez disso, há um mecanismo mediador interposto entre os dois; esse mecanismo são os processos cognitivos da pessoa. Podemos ver quão potentes são os processos cognitivos na abordagem de Bandura e de que maneira suas concepções diferem das de Skinner. Por exemplo, para Bandura não é o programa concreto de reforço que tem eficácia na modificação do comportamento, mas sim aquilo que a pessoa pensa que o programa é. Em vez de aprendermos pela vivência direta do reforço, aprendemos por meio da modelagem, observando outras pessoas e estabelecendo os padrões do nosso comportamento com base no delas. Segundo Skinner, quem controla os reforços controla o comportamento; na concepção de Bandura, quem controla os modelos de uma sociedade controla o comportamento. Bandura fez amplas pesquisas sobre as características dos modelos que podem influenciar o nosso comportamento. A abordagem de Bandura é também um tipo social de teoria da aprendizagem, pois estuda o comportamento tal como é formado e modificado em situações sociais, ou seja, na interação com outras pessoas. Bandura criticou a ênfase de Skinner em estudar apenas sujeitos individuais, e principalmente ratos e pombos, em vez de sujeitos humanos interagindo uns com os outros. Bandura acredita que a psicologia não pode esperar que descobertas de pesquisas que não envolvam interações sociais sejam relevantes no mundo moderno. Poucas pessoas agem em isolamento social ou escapam à presença dos outros. A Auto-Eficácia- Bandura realizou consideráveis pesquisas sobre a auto-eficácia, descrita como o nosso sentido de auto-estima ou de valor próprio, nossa sensação de adequação e eficiência em tratar dos problemas da vida. Sua obra mostrou que pessoas de auto-eficácia elevada acreditam que são capazes de lidar com todos os eventos de sua vida; elas esperam superar obstáculos e, como resultado, buscam desafios, perseveram e mantêm um alto nível de confiança em sua aptidão para ter êxito. Em contraste, pessoas de pequena auto-eficácia sentem-se impotentes e sem esperança em termos de se haver com os eventos da vida e acreditam ter pouca ou nenhuma capacidade de influenciar as condições ou situações que as afetam. Quando deparam com problemas, é provável que essas pessoas desistam de tentar resolvê-los se seus esforços iniciais fracassarem. Para elas, nada do que está em seu poder faz alguma diferença. Pesquisas demonstraram que essas crenças podem afetar muitos aspectos do funcionamento humano, incluindo a escolha da carreira, a persistência em procurar o emprego certo, a excelência com que realizamos o nosso trabalho e muitos elementos vinculados com a nossa saúde física e mental. A Modificação do Comportamento. O alvo de Bandura ao desenvolver sua abordagem cognitiva social do comportamentalismo foi prático e aplicado: mudar ou modificar comportamentos que a sociedade considera anormais ou indesejáveis. Ele raciocinou que, se todo comportamento, incluindo o anormal, é aprendido por meio da observação dos outros e da modelagem, então o comportamento pode ser reaprendido ou alterado da mesma maneira. Tal como Skinner, Bandura concentra-se nos aspectos externos da anormalidade — o comportamento —, e não em supostos conflitos conscientes ou inconscientes interiores. Assim, considera-se que tratar o sintoma é tratar o disturbio, pois eles são a mesma coisa. A niodelação é usada para modificar o comportamento levando os sujeitos a observarem um modelo numa situação que consideram assustadora ou causadora de ansiedade. Por exemplo, crianças que temem cães observam outra criança de sua idade aproximando-se de um cachorro e brincando com ele. Olhando de uma distância segura, os sujeitos observam o modelo fazer movimentos progressivamente mais próximos e mais ousados na direção do cachorro. O modelo pode afagar o cachorro através das barras de um cercado e depois entrar no cercado para brincar alegremente com o cão. Como resultado dessa aprendizagem observacional, o medo da criança se reduz pronunciadamente. Numa variação dessa técnica, os sujeitos primeiro observam modelos brincar com o objeto temido, como uma cobra, e então fazem eles mesmos movimentos progressivamente mais próximos do objeto, terminando por tocá-lo e manipulá-lo. A forma de terapia comportamental de Bandura tem imensa popularidade e tem sido corroborada por centenas de estudos experimentais. Ela tem se mostrado eficaz na eliminação de fobias com relação a cobras, espaços fechados, espaços abertos e lugares altos e no tratamento de distúrbios obsessivo-compulsivos, disfunções sexuais e algumas formas de ansiedade. A técnica também se mostrou útil no aumento da auto-eficácia, sendo aplicada amplamente em situações de sala de aula e na indústria. Comportamentalistas radicais têm lançado críticas à abordagem cognitiva social do comportamentalismo, afirmando que processos cognitivos como crença e antecipação não têm efeito causal sobre o comportamento. “É divertido”, comentou Bandura, “ver comportamentalistas que afirmam que os pensamentos não têm influência causal, dedicando um considerável tempo a pronunciamentos, artigos e livros, num esforço para converter as crenças das pessoas ao seu modo de pensar” (Evans, 1989, p. 83). A abordagem de Bandura obteve em termos gerais um alto grau de aceitação na psicologia como forma efetiva de estudar o comportamento no laboratório e de modificá-lo na clínica. Suas contribuições à psicologia contemporânea foram reconhecidas pelos colegas. Ele foi presidente da APA em 1974 e recebeu em 1980 o Distinguished Scientific Contribution Award da Associação. Sua teoria e a terapia da modelagem dela derivada são congruentes com a tendência funcional e prática de boa parte da psicologia americana do século XX. Sua obra é altamente objetiva, suscetível de métodos laboratoriais precisos, respondendo ao clima intelectual corrente da psicologia em seu reconhecimento de variáveis cognitivas internas, e é aplicável a questões do mundo real. Para muitos psicólogos, ela representa uma das mais estimulantes e produtivas inovações na longa história do comportamentalismo. Julian Rotter (1916) Julian Rotter foi criado no Brooklyn, Nova York, e descobriu as obras de Sigmund Freud e Alfred Adler na escola secundária, tendo decidido na época que queria ser psicólogo. Havia então poucos empregos para psicólogos, durante a Grande Depressão, e ele escolheu como área de concentração, no Brooklyn Coliege, a química. Enquanto estava lá, conheceu Adler e, a conselho de dois professores, finalmente foi para a psicologia, muito embora isso não parecesse prático. Doutorou-se em 1941 na Universidade Indiana e foi trabalhar num hospital público de saúde mental em Connecticut. Foi psicólogo do exército durante a Segunda Guerra Mundial, deu aulas na Universidade Estadual de Ohio até 1963, tendo ido então para a Universidade de Connecticut. Os Processos Cognitivos e o Centro de Controle Rotter foi o primeiro a usar o teimo teoria da aprendizagem social. Ele desenvolveu uma abordagem cognitiva do coniportamentalismo que, tal como a de Bandura, invoca a existência de experiências subjetivas interiores. Assim, seu comportamentalismo (mais uma vez, tal como o de Bandura) é menos extremo que o de Skinner. Ele criticou Skinner por estudar sujeitos individuais isolados, afirmando que aprendemos o nosso comportamento, primordialmente, em experiências e interações sociais. A abordagem de Rotter se apoia em pesquisas de laboratório rigorosas e bem controladas, da espécie típica do movimento comportamentalista, e ele só estuda sujeitos humanos em interação social. O sistema de Rotter trata dos processos cognitivos de modo mais amplo do que o de Bandura. Sua posição é de que sempre percebemos a nós mesmos como seres conscientes capazes de influenciar as experiências que nos afetam a vida. Tanto os estímulos externos como o reforço que eles propiciam podem afetar o comportamento humano, mas a natureza e a amplitude de sua influência sempre são mediadas por fatores cognitivos (Rotter, 1982). Foram propostos quatro princípios cognitivos. (1) Possuímos uma expectativa subjetiva acerca do desfecho ou resultado do nosso comportamento em termos da quantidade e do tipo de reforço que tem probabilidades de vir. (2) Formamos estimativas da probabilidade de que um comportamento particular leve a um certo reforço, e regulamos ou ajustamos nosso comportamento de acordo com isso: (3) Atribuímos diferentes valores ou graus de importância a diferentes reforços, e julgamos ou avaliamos seu valor relativo em diferentes situações. (4) Como funcionamos em diferentes ambientes psicológicos peculiares a nós como indivíduos, o mesmo reforço pode ter diferentes valores para diferentes pessoas. Logo, nossas expectativas e experiências subjetivas, que são estados cognitivos internos, determinam os efeitos que diferentes experiências externas têm sobre nós. A teoria de Rotter também se ocupa das nossas crenças acerca da fonte de controle do nosso reforço. Sua pesquisa demonstrou que algumas pessoas acreditam que o reforço depende do seu próprio comportamento; diz-se que elas têm um centro de controle interno. Outras pessoas crêem que o reforço depende de forças exteriores; afirma-se que elas têm um centro de controle externo. Essas duas fontes de controle exercem influências distintas sobre o comportamento humano. Pessoas de centro de controle externo pensam que suas aptidões e respostas pouca diferença fazem em termos dos reforços que recebem, motivo pelo qual não tentam muito melhorar ou mudar sua própria situação. Pessoas de centro de controle interno acham que estão no comando de sua vida e se comportam de acordo com isso. A teoria da aprendizagem social de Rotter atraiu um grande e leal grupo de seguidores de orientação primordialmente experimental que aceitam a importência das variáveis cognitivas como influências sobre o comportamento. Sua pesquisa é considerada tão rigorosa e bem controlada quanto o permite o seu objeto de estudo, tendo Rotter definido seus conceitos com um grau de precisão que os torna passíveis de verificação experimental. Há um imenso número de estudos, em especial acerca da questão do centro de controle interno/externo, que sustentam sua abordagem cognitiva do comportamentalismo. Comentários a fazer: Embora o desafio cognitivo ao comportamentalismo a partir de dentro tenha conseguido modificar o movimento comportamentalista que acompanhamos de Watson a Skinner, é importante lembrar que Bandura, Rotter e outros neo-neocomportamentalistas adeptos da abordagem cognitiva continuam a se considerar comportamentalistas. O comportamento permanece sendo seu foco teórico e o objeto de suas pesquisas. Deve-se notar, no entanto, que a obra dos neocomportamentalistas modificou a natureza do comportamentalismo na psicologia americana atual. Um núcleo leal de skinnerianos permanece ativo na tradição comportamentalista radical promovida por Skinner, mas sua popularidade e influência alcançaram um ponto de estagnação na década de 80, e o declínio do sistema pode muito bem ter sido apressado pela morte de Skinner em 1990. Em 1987, Skinner admitiu que sua forma de psicologia comportamentalista estava perdendo terreno e que a abordagem cogriitiva estava em ascensão (Goleman, 1987). Outros estudiosos contemporâneos concordam, observando que o comportamentalismo skinneriano “perdeu a preferência entre a maioria dos profissionais ativos no campo... Cada vez menos pesquisadores das principais universidades se consideram hoje comportamentalistas no sentido tradicional. Com efeito, costuma-se fazer referência ao ‘comportamentalismo’ no tempo passado” (Baars, 1986, pp. viii, 1). O comportamentalismo que permanece intacto e vívido na psicologia de hoje — e que é especialmente visível na psicologia aplicada, onde as técnicas de modificação do comportamento são populares — tem uma forma distinta da promovida nas décadas entre o manifesto de 1913 de Watson e a recentemorte de Skinner. Tal como ocorre com todos os movimentos evolutivos da ciência e da natureza, a espécie continua a se desenvolver. Nesse sentido, o comportamentalismo sobrevive no espírito, embora não na letra original, da sua intenção. A Psicologia da Gestalt. Tratava-se de mais um protesto contra a psicologia wundtiana, um testemunho adicional da importância das ideias de Wundt como inspiração para pontos de vista opostos e como base efetiva a partir da qual lançar novos sistemas de psicologia. Em seu ataque à instituição wundtiana, a rebelião gestaltista teve como foco primordial um dos aspectos da obra de Wundt: seu atomismo ou elementarismo. Os psicólogos gestaltistas consideravam o pressuposto wundtiano da condição fundamental dos elementos sensoriais e fizeram disso o alvo de sua oposição. “Estávamos chocados”, escreveu Wolfgang Kõhler, um dos fundadores da psicologia da Gestalt, “com a tese de que todos os fatos psicológicos... consistem em átomos inertes sem relação entre si e que as associações são praticamente os inicos fatores que combinam esses átomos e introduzem a ação” (K 1959, p. 728). Para compreender a natureza da revolução gestaltista, temos de voltar a mais ou menos 1912, o ano descrito como “época de dificuldades” para a velha abordagem da psicologia. O ataque dos gestaltistas à posição elementarista de Wundt foi simultânea, se bem que independente, ao movimento comportamentalista nos Estados Unidos. Ambas as escolas de pensamento começaram se opondo às mesmas ideias, mas chegariam a se opor uma à outra. Havia entre elas claras diferenças. Os psicólogos da Gestalt aceitavam o valor da consciência mas criticavam a tentativa de analisá-la em elementos; os comportainentalistas se recusavam até a reconhecer a existência da consciência para a psicologia. Os psicólogos da Gestalt referiam-se à abordagem wundtiana (tal como a compreendiam) como a psicologia do “tijolo e argamassa”, querendo dizer com isso que os elementos (os tijolos) eram mantidos juntos pela argamassa do processo de associação. Eles afirmavam que, quando olhamos para fora de uma janela, vemos imediatamente as árvores e o céu, e não pretensos elementos sensoriais, como brilhos e matizes, que possam constituir a nossa percepção das árvores e do céu. Além disso, acusavam os wundtianos de afirmar que a nossa percepção dos objetos consiste apenas na acumulação ou soma de elementos em grupos ou coleções. Os psicólogos da Gestalt afirmavam que, quando os elementos sensoriais são combinados, forma-se algum novo padrão ou configuração. Juntemos algumas notas musicais e algo novo — uma melodia ou tom — surge da combinação, uma coisa que não existia em nenhum dos elementos individuais ou notas. Em termos sucintos: o todo é distinto da soma de suas partes. Deve-se observar, no entanto, que Wundt reconhecia esse ponto em sua doutrina da apercepção. Para ilustrar a diferença entre as abordagens gestaltista e wundtiana da percepção, imagine que você é um sujeito num laboratório de psicologia da Alemanha perto de 1915. O psicólogo encarregado lhe pergunta o que você está vendo na mesa. Você diz: - Um livro. — Sim, claro, é um livro .- ele concorda —, mas o que você de fato vê? — O que você quer dizer com o que de fato vejo? — você pergunta, atônito. — Eu lhe disse que vejo um livro. É um pequeno livro de capa vermelha. O psicólogo é persistente. — Qual é realmente a sua percepção? — ele insiste. — Descreva-a pare mim com toda a exatidão que puder. - Você quer dizer que não é um livro? De que se trata, alguma espécie de truque? Há indícios de impaciência. — Sim, é um livro. Não há nenhum truque. Eu só quero que você descreva para mim o que você vê exatamente, nem mais nem menos. A essa altura, você já está todo desconfiado. — Bem, deste ângulo, a capa do livro parece um paralelogramo vermelho escuro — você diz. — Sim — ele diz, satisfeito. — Sim, você está vendo uma mancha vermelha escura com a forma de um paralelogramo. E que mais? — Há um rebordo branco acinzentado abaixo dela e outra linha tênue vermelha escura depois daquela. Sob o livro, vejo a mesa... — Ele se empertiga. — Ao redor do livro vejo algo parecido com um acastanhado escuro com barras onduladas de castanho mais claro correndo mais ou menos paralelas umas às outras. - Muito bem, muito bem. Ele lhe agradece pela cooperação. Enquanto fica ali parado olhando o livro na mesa, você se sente um pouco embaraçado porque aquele camarada persistente . Ele fez você ficar tão cauteloso que você já não tinha nenhuma certeza do que realmente via e do que apenas pensava que via... Em sua cautela, você começou a falar do que via em termos de sensações, quando apenas um momento antes tinha bastante certeza de perceber um livro sobre a mesa. Seu devaneio é subitamente interrompido pelo aparecimento de um psicólogo que se parece vagamente com Wilhelrn Wundt. — Obrigado por ajudar a confirmar mais urna vez minha teoria da percepção. Você provou — diz ele — que o livro que vê não passa de um composto de sensações elementares. Quando estava tentando ser preciso e dizer exatamente o que viu de fato, você teve de falar em termos de manchas de cor, e não de objetos. As sensações de cor é que são primárias, e todo objeto visual pode ser reduzido a elas. Sua percepção do livro é construída a partir de sensações, do mesmo modo como uma molécula é construída a partir de átomos. Esse pequeno discurso é, ao que parece, um sinal para a batalha começar. — É um absurdo! — grita uma voz do extremo oposto da sala — um absurdo! Qualquer idiota sabe que o livro é o fato primário, imediato, direto, incontestável e perceptível! O psicólogo que nos olha agora tem uma ligeira semelhança com William James, mas parece ter sotaque alemão, e o seu rosto tem um ar tão furioso que você não pode ter certeza. — Essa redução de uma percepção a sensações de que vocês não param de falar não passa de jogo intelectual. Um objeto não é apenas um grupo de sensações. Qualquer pessoa que ande por aí vendo manchas vermelhas escuras quando devia ver livros está doente! Como a batalha começa a ficar acalorada, você fecha a porta bem devagar e foge dali. Você teve o que queria, um exemplo de que há duas atitudes diferentes, dois modos distintos de falar sobre a informação que os nossos sentidos fornecem (Miller, 1962, pp. 1O30). Os psicólogos gestaltistas acreditam que há mais coisas na percepção do que vêem os nossos olhos, que a nossa percepção vai além dos elementos sensoriais, dos dados físicos básicos fornecidos pelos órgãos dos sentidos Influências, Antecedentes Sobre a Psicologia da Gestalt Tal como ocorre com todos os movimentos, as ideias do protesto gestaltista têm seus antecedentes históricos. A base dessa posição, seu foco na unidade da percepção, pode ser encontrada na obra do filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804). Esse homem eminente que nunca se aventurou a se afastar mais de noventa quilómetros de sua terra natal, dominou o pensamento filosófico por mais de uma geração. Embora menos ampla do que a sua contribuição à filosofia, a que ele deu à psicologia tem importância. Kant influenciou a psicologia graças à sua ênfase na unidade de um ato perceptivo. Ele afirmava que, quando percebemos o que denominamos objetos, deparamos com estados mentais que poderiam parecer compostos de pedaços de fragmentos; esses são os elementos sensoriais de que os empiristas e associacionistas britânicos se ocupavam. Contudo, esses elementos são organizados significativamente a prior!, e não por meio de algum processo mecânico de associação. A mente, no processo de percepção, forma ou cria uma experiência unitária. Segundo Kant, a percepção não é uma impressão e combinação passiva de elementos sensoriais, como afirmava a escola britânica, mas uma organização ativa desses elementos numa experiência coerente. Logo, a mente confere forma e organização ao material bruto da percepção. Essa posição se opõe à doutrina da associação. Para Kant, algumas das formas que a mente impõe à experiência são inatas (como o espaço, o tempo e a causalidade), no sentido de não serem derivadas da experiência, mas existirem na mente como intuitivamente cognoscíveis. O psicólogo Franz Brentano (1838-1917), da Universidade de Viena, se opôs ao foco de Wundt sobre os elementos ou conteúdo da experiência consciente, tendo proposto que e a psicologia estudasse, em vez disso, o processo ou ato da experiência. Assim sendo, ele foi um precursor do movimento gestaltista formal. Ele considerava a introspecção wundtiana artificial, favorecendo uma observação menos rígida e mais direta da experiência tal como ela ocorre, mais ou menos como o método ulterior da Gestalt. Ernst Mach (1839-1916), professor de física da Universidade de Praga, exerceu uma influência mais direta sobre a revolução da Gestalt. Em seu livro The Analysis of Sensations (A Análise das Sensações), de 1885, Mach escreveu sobre sensações da forma do espaço e da forma do tempo. Ele considerou os padrões espaciais como figuras geométricas e os padrões temporais como melodias sensações. Essas sensações da forma do espaço e da forma do tempo independiain dos seus elementos. Por exemplo, a forma do espaço de um circulo poderia ser branca ou preta, grande ou pequena, e nada perder de sua qualidade elementar de circularidade. Mach afirmava que nossa percepção visual ou auditiva de um objeto não muda mesmo que modifiquemos nossa orientação espacial com relação a ele. Uma mesa permanece como tal em nossa percepção quer a olhemos de lado, de cima ou de um dado ângulo. Do mesmo modo, uma série de sons permanece a mesma na nossa percepção ainda quando sua forma do tempo é modificada, isto é, quando ela é tocada mais rápida ou mais devagar. As ideias de Mach foram ampliadas por Christian von Ehrenfels (1859-1932), que trabalhava em Viena . Ele sugeriu que há qualidades da experiência que não podem ser explicadas em termos de combinações de sensações. Ele denominou essas qualidades Gestait qualitáten (qualidades configuracionais), percepções baseadas em algo que vai além das sensações individuais. Uma melodia, por exemplo, é uma qualidade configuracional porque soa da mesma maneira inclusive quando transposta para tonalidades diferentes. Assim, a melodia independe das sensações particulares de que é composta. Para Ehrenfels e a escola austríaca da Gestalt qualit. instalada em Oraz, a própria configuração era um elemento (se bem que não uma sensação), um novo elemento criado pela ação da mente sobre os elementos sensoriais. Logo, a mente configura a partir de sensações elementares. Embora seguissem as linhas que viriam a ser conhecidas como psicologia da Gestalt, Mach e Ehrenfels se desviaram um pouco da posição elementarista ortodoxa. Em vez de se oporem à noção de elementarismo, como os gestaltistas mais tarde fariam, eles apenas acrescentaram a configuração como um novo elemento. Ainda que criticassem a mesma posição criticada pelos psicólogos da Gestalt, eles davam uma solução diferente. Mesmo assim, Ehrenfels em particular teve um certo impacto sobre o movimento da Gestalt. Max Wertheimer, um dos fundadores, estudou com ele em Praga. No artigo de Wertheimer , ele observou que o impulso mais importante para o movimento da Gestalt veio da obra de Ehrenfels. William James, adversário do elementarismo psicológico, também foi precursor da Gestalt. Ele considerava os elementos da consciência abstrações artificiais e enfatizou que vemos objetos como um todo, e não como feixes de sensações. Outra influência antecedente é o movimento fenomenológico na psicologia e na filosofia alemãs. Metodologicamente, a fenomenologia se refere a uma descrição imparcial da experiência imediata tal como ela ocorre. É uma observação não corrigida em que a experiência não é analisada em elementos nem abstraída artificialmente de alguma outra maneira. A fenomenologia envolve a experiência quase ingênua do senso comum, e não a experiência relatada por um introspector treinado que segue uma orientação sistemática particular. Um grupo de psicólogos fenomenológicos trabalhou no laboratório de G. E. Müller na Universidade do Gí5ttingen, Alemanha, entre 1909 e 1915, período em que o movimento da Gestalt estava em seus primórdios. Esses psicólogos, incluindo Erich R. Jaensch, David Katz e Edgar Rubin, fizeram extensas pesquisas fenomenológicas. Seu trabalho antecipou a escola de pensamento formal da Gestalt, que adotou sua abordagem. Não se pode deixar de lado, entre as influências antecedentes da Gestalt, particularmente o clima intelectual da física. Nas últimas décadas do século XIX, essa disciplina tornava-se menos atomista à medida que os físicos iam reconhecendo e a aceitando noção de campos de força (regiões ou espaços cruzados por linhas de força, como as geradas por uma corrente elétrica ou um ímã). O exemplo clássico dessa nova direção na física é o magnetismo, uma propriedade ou qualidade que parecia difícil de definir ou compreender em termos tradicionais galileu newtonianos. Por exemplo, quando se agita lima de ferro numa folha de papel apoiada no topo de um imã, a limalha se organiza segundo um padrão característico. Os fragmentos não tocam no ímã, mas são evidentemente afetados pelo campo de força que está ao seu redor. Considerava-se que a luz e a eletricidade operavam de maneira semelhante. Considerava-se que esses campos de força eram dotados das propriedades de extensão e de padrão ou configuração espaciais. Em outras palavras, eles eram considerados novas entidades estruturais, e não o somatório dos efeitos de elementos ou partículas individuais. Assim, a noção de atomismo ou elementarismo, que tivera tanta influência no estabelecimento da nova ciência da psicologia, estava sendo reconsiderada na física. Os físicos estavam começando a pensar em termos de campos ou todos orgânicos, um conceito compatível com a psicologia da Gestalt. As mudanças oferecidas à psicologia pelos psicólogos da Gestalt refletiam as mudanças na física da época, pois os psicólogos se esforçavam outra vez para acompanhar as antigas e bem estabelecidas ciências naturais. O impacto sobre a psicologia dessa alteração de ênfase na física surgiu em tennos pessoais. Wolfgang Kóhler tinha uma sólida formação em física e tinha estudado com Max Planck, um dos arquitetos da física moderna. Kõhler escreveu que foi devido à influência de Planck que ele começou a perceber um vinculo entre a física dos campos e a ênfase da Gestalt no todo. Ele viu na física uma crescente relutância em continuar a tratar de elementos como átomos e moléculas e a tendência a se concentrar em sistemas mais amplos ou campos. Ele afirmou que “desde então, a psicologia da Gestalt se tornou uma espécie de aplicação da física dos campos a partes essenciais da psicologia” (K 1969, p. 77). O fundador do comportamentalismo, John B. Watson, em contrapartida, ao que parece não tinha conhecimento da nova física, e continuou a desenvolver uma abordagem reducionista da psicologia que se concentrava em elementos — os elementos de comportamento —, concepção compatível com os princípios da antiga física atomística. A Fundação da Psicologia da Gestalt O movimento formal conhecido como psicologia da Gestalt surgiu de uma pesquisa feita em 1910 por Max Wertheimer. Durante as férias, quando viajava num trem, Wertheimer teve a idéia de fazer uma experiência sobre a visão do movimento quando nenhum movimento real tinha ocorrido. Abandonando prontamente seus alunos de férias, ele desceu do trem em Frankfurt, comprou um estroboscópio de brinquedo, e verificou a ideia que lhe ocorrera, de modo preliminar, num quarto de hotel. Mais tarde, fez pesquisas mais formais na Universidade de Frankfurt, que lhe forneceu um taquistoscópio. Dois outros jovens psicólogos, Kurt Koffka e Wolfgang Kõhler, que tinham sido alunos da Universidade de Berlim, também estavam em Frankfurt. Logo depois, eles se engajaram num cruzada comum. O problema de pesquisa de Wertheimer, em que Koffka e K serviram de sujeitos, o estroboscópio, inventado uns oitenta anos antes por J. Plateau, era um precursor da câmera de cinema. É um instrumento que projeta rapidamente uma série de quadros diferentes no olho, produzindo movimento aparente. envolvia a percepção do movimento aparente, isto é, a percepção do movimento quando nenhum movimento físico real tinha acontecido. Wertheimer se referia ao fenómeno como a ‘impressão de movimento” (Seaman. 1984, p. 3). Usando o taquistoscópio, Wertheimer projetou luz por duas ranhuras, uma vertical e a outra a vinte ou trinta graus da vertical. Se a luz era mostrada primeiro por uma ranhura e depois pela outra, com um intervalo relativamente longo (mais de 200 milissegundos), os sujeitos viam o que pareciam ser duas luzes sucessivas, primeiro uma luz numa ranhura e então uma luz na outra. Quando o intervalo entre as luzes era menor, os sujeitos viam o que pareciam ser duas luzes contínuas. Com um intervalo de tempo ótimo (cerca de 60 milissegundos) entre as luzes, os sujeitos viam uma única linha de luz que parecia mover-se de uma ranhura para a outra e na direção inversa. Essas descobertas podem parecer triviais. Os cientistas há anos conheciam o fenómeno, e ele podia até ser considerado uma questão de senso comum. Contudo, de acordo com a posição então prevalecente na psicologia, a de Wuridt, toda experiência consciente podia ser analisada em seus elementos sensoriais. E, no entanto, poderia essa percepção do movimento aparente ser explicada em tennos de um somatório de elementos sensoriais individuais, que eram apenas duas ranhuras estacionárias de luz? Poderia um estímulo estacionário ser acrescentado a outro para produzir uma sensação de movimento? Não; e esse era precisamente o ponto central da demonstração brilhantemente simples de Wertheimer: o fenômeno desafiava a explicação pelo sistema wundtiano. Wertheimer acreditava que o fenômeno que verificara em seu laboratório era, à sua maneira, tão elementar quanto uma sensação, embora diferisse evidentemente de uma sensação ou mesmo de uma sucessão de sensações. Ele deu ao fenômeno um nome adequado à sua natureza peculiar: fenômeno phi. E como ele explicava o fenômeno phi quando a psicologia tradicional da época não o podia? Sua resposta era tão simples e engenhosa quanto a experiência de verificação: o movimento aparente não precisava de explicação; ele existia tal como era percebido, não podendo ser reduzido a nada mais simples. De acordo com Wundt, a introspecção do estímulo produziria duas linhas sucessivas e nada mais; contudo, por mais rigorosamente que se pudesse fazer a introspecção das duas exposições da luz, a experiência de uma única linha em movimento persistia. Quaisquer tentativas de análise adicional fracassavam. O todo (o movimento aparente da linha) diferia da soma de suas partes (as duas linhas estacionárias). A psicologia associacionista-atomista tradicional, dominante há tantos anos, fora desafiada, e a esse desafio ela não podia responder. Wertheimer publicou os resultados de sua pesquisa em 1912 em “Estudos Experimentais da Percepção do Movimento”, artigo considerado o marco do começo da escola de pensamento da psicologia da Gestalt. Max Wertheimer (1 880-1943) Nascido em Praga, Max Wertheimer frequentou o Liceu local até os dezoito anos e depois estudou Direito por alguns anos na Universidade de Praga. Passou para a filosofia, assistiu a palestras de Ehrenfels, e mais tarde foi para a Universidade de Berlim estudar filosofia e psicologia. Doutorou-se em 1904 na Universidade de Würzburg, sob a direção de Oswald Külpe, no auge da controvérsia sobre o pensamento sem imagens. Entre 1904 e 1910, Wertheimer passou algum tempo nas universidades de Praga, Viena e Berlim antes de se estabelecer na Universidade de Frankfurt. Ali, fez pesquisas e conferências por vários anos, tomando-se professor em 1929. Durante a Primeira Guerra, fez pesquisas militares sobre dispositivos de escuta para submarinos e fortificações portuárias. Wertheimer era o mais velho dos três primeiros psicólogos da Gestalt e o líder intelectual do movimento. (Embora Koffka e Kchler tenham servido para promover a posição proeminente de Wertheimer, cada qual foi influente por direito próprio, como veremos.) Wertheimer produziu importantes artigos sobre o pensamento criativo e sobre agrupamento perceptivo. Em 1921, os três colegas, assistidos por Kurt Goldstein e Hans Gruhle, fundaram a revista Psychologische Forschung (Pesquisa Psicológica), que se tomou o órgão oficial da escola da Gestalt. Vinte e dois volumes foram publicados antes de ela ser suspensa em 1938 pelo regime nazista; a publicação foi retomada em 1949 (Scheere, 1988). Wertheimer fazia parte do primeiro grupo de estudiosos refugiados a fugir da Alemanha nazista, tendo chegado a Nova York em 1933. Associou-se à Nova Escola de Pesquisa Social, onde ficou até morrer, em 1943. Seus anos nos Estados Unidos foram ativos, mas ele ficou com seu estudo da percepção do movimento aparente. Max Wertheimer iniciou o movimento conhecido por psicologia da Gestalt. cada vez mais exausto devido ao ônus de adaptar-se a uma nova língua e a uma nova cultura. Seu programa de pesquisa foi informal, comunicando pessoalmente a amigos e colegas em reuniões profissionais. Em seus últimos anos em Nova York, Wertheimer, ao que parece, causou forte impressão num jovem psicólogo americano, Abraham Maslow. Maslow ficou tão fascinado por Wertheimer que começou a estudar as características e qualidades do homem. Foi a partir dessas observações iniciais de Wertheimer (e da antropóloga Ruth Benedict) que Maslow desenvolveu seu conceito de self-actualization (auto-realização). Kurt Kofflia (1886-1941) Kurt Koffka foi provavelmente o mais inventivo dos fundadores da Gestalt. Estudou na Universidade de Berlim, a cidade onde nasceu, e desenvolveu pela ciência e pela filosofia um interesse que foi fortalecido pelo ano que passou na Universidade de Edirnburgo, na Escócia. Retomando a Berlim, estudou psicologia com Cari Stumpf e se doutorou em 1909. No ano seguinte, iniciou sua longa e frutífera associação com Wertheimer e Kóhler na Universidade de Frankfurt. Em 1911, aceitou um cargo na Universidade de Giessen, que ficava a uns sessenta quilómetros de Frankfurt, onde ficou até 1924. Durante a Primeira Guerra, trabalhou com pacientes lesionados cerebrais e afásicos numa clínica psiquiátrica. Ao fmal da guerra, quando os psicólogos dos Estados Unidos começavam a tomar conhecimento de que uma nova escola de pensamento se desenvolvia na Alemanha, Koffka foi convencido a escrever um artigo para a revista americana Psychological Builetin. Esse artigo, “A Percepção: Uma Introdução à Teoria da Gestalt” (Koffka, 1922), apresentava os conceitos básicos da escola e os resultados e as implicações de suas copiosas pesquisas. Embora tenha sido importante como primeira exposição formal da revolução da Gestalt aos psicólogos americanos, o artigo pode ter feito um desserviço à expansão do movimento, O título, “A Percepção”, deu início a um mal-entendido que paira até hoje, isto é, a ideia de que a psicologia da Gestalt se ocupa exclusivamente da percepção, não tendo portanto relevância para outras áreas da psicologia. Na realidade, a psicologia da Gestalt tinha uma preocupação mais ampla com problemas do pensamento e da aprendizagem: O principal motivo pelo qual os primeiros psicólogos da Gestalt concentraram suas publicações sistemáticas na percepção foi a psicologia de Wundt, contra a qual se rebelaram os gestaltistas, obtivera boa parte do seu apoio de estudos sobre a sensação e a percepção, razão por que os psicólogos da Gestalt escolheram a percepção como arena a fim de atacar Wundt em sua própria fortaleza (MichaelWertheimer, 1979, p. 134). Em 1921, Koffka publicou O Desenvolvimento da Mente, um livro sobre psicologia do desenvolvimento infantil que foi um sucesso na Alemanha e nos Estados Unidos. Ele foi à América como professor visitante da Universidade Comell e da Universidade de Wisconsin e, em 1927, foi nomeado professor do Smith Coliege, de Northampton, Massachusetts, onde ficou até a sua morte, em 1941. Em 1935, publicou Princípios de Psicologia da Gestalt, livro extremamente difícil que não veio a ser o tratamento definitivo da psicologia da Gestalt, como ele pretendia. Wolfgang Kõhler (1887-1967) Wolfgang Kiihler, o mais jovem dos três, era o porta-voz do movimento. Seus livros, escritos com cuidado e precisão, tomaram-se as obras definitivas sobre vários aspectos da psicologia da Gestalt. O seu treinamento em física com o notável Max Planck o persuadiu de que a psicologia tinha de aliar-se àquela ciência. Nascido na Estônia, K tinha cinco anos quando sua família se mudou para o norte da Alemanha. Sua educação universitária foi em Tübingen, Bonn, e em Berlim, e ele recebeu seu doutorado sob a orientação de Carl Stumpf na Universidade de Berlim em 1909. Foi para a Universidade de Frankfurt, tendo chegado pouco antes de Wertheimer e do seu estroboscópio de brinquedo. Em 1913, a convite da Academia Prussiana de Ciência, Kõhler fez uma viagem para Prussia. Os escritos de KwtKoffka atraíam a atenção dos psicólogos americanos para a escola gestaltista de psicologia. Tenerife, nas Ilhas Canárias, na costa noroeste da África, para estudar chimpanzés. Seis meses depois de sua chegada, eclodiu a Primeira Guerra, e ele relata que não pôde partir, embora outros cidadãos alemães tenham conseguido voltar para casa nos anos de guerra. Um psicólogo sugeriu, com base em sua interpretação de novos dados da história, que Khler pode ter sido um espião da Alemanha, e que suas instalações de pesquisa eram na verdade uma cobertura para as suas atividades de espionagem (Ley, 1990). Afirma-se que, no sótão de sua casa, ele escondera um potente rádio transmissor que usava para transmitir informações sobre os movimentos da marinha aliada. As provas que sustentam essa acusação são, no entanto, circunstanciais, tendo sido refutadas por historiadores e psicólogos gestaltistas. Quer espião ou apenas um cientista retido pela guerra, K passou os sete anos seguintes estudando o comportamento em chimpanzés. Ele produziu o compêndio hoje clássico A Mentalidade dos Macacos em 1917; o livro teve uma segunda edição em 1924 e foi traduzido para o inglês e o francês. Em 1920, Kõhler voltou à Alemanha e, dois anos mais tarde, sucedeu Stumpf como professor de psicologia da Universidade de Berlim, onde ficou até 1935. A razão aparente de sua nomeação para esse cargo cobiçado foi a publicação em 1920 do livro Gestalts Físicas Estáticas e Estacionárias, que obteve consideráveis aplausos por seu alto grau de erudição. A metade dos anos 20 foram difíceis na vida pessoal de Kohler. Ele se divorciou da esposa, desposou uma jovem estudante sueca e, a partir de então, perdeu o contato com os quatro filhos do primeiro casamento. Passou a ser acometido por um tremor nas mãos que se tornava mais perceptível quando seu estado de ânimo se tornava sombrio. Para avaliar seu humor, os assistentes de laboratório o observavam toda manhã para ver a intensidade do tremor. Ele era extremamente nervoso sempre que dava aulas, e nunca permitia visitantes na sala (Ley, 1990). No ano acadêmico de 1925-1926, Kõhler deu aulas em Harvard e em Clark nesta última, ensinou os alunos de pós-graduação a dançar o tango. Em 1929, publicou Gestalt Psychology (Psicologia da Gestalt), uma abrangente defesa do movimento gestaltista. Deixou a Alemanha nazista em 1935, devido a contínuos conflitos com o governo. Depois de falar contra as autoridades em suas aulas, sua sala foi invadida por uma gangue de nazistas. Ele escreveu uma corajosa carta antinazista para um jornal de Berlim, pois estava irritado com a dispensa de todos os professores judeus das universidades alemãs. Na tarde em que sua carta foi publicada, ele e alguns amigos esperaram calmamente em sua casa, tocando música de câmara, que a Gestapo fosse prendê-lo. A temida batida na porta nunca veio (Henle, 1978). Depois de emigrar para os Estados Unidos, Kõhler ensinou no Swarthmore Coliege, na Pensilvânia, publicou vários livros e editou a revista gestaltista Psychological Research. Em 1956, recebeu o Distinguished Scientific Contribution Award da APA e, pouco depois, foi eleito seu presidente. A Natureza da Revolta da Gestalt Os princípios gestaltistas estavam em oposição direta a boa parte da tradição acadêmica da psicologia na Alemanha. O comportamentalismo fora uma revolta menos imediata contra Wundt e o estruturalismo porque o funcionalismo já tinha produzido algumas mudanças na psicologia americana. A revolta gestaltista na Alemanha não contou com nada que lhe preparasse o caminho dessa maneira. Os pronunciamentos dos psicólogos da Gestalt estavam bem próximos da heresia aos olhos da tradição alemã. Os iniciadores do movimento perceberam que estavam atacando uma força rígida e poderosa, atingindo os fundamentos da psicologia tal como então definida. Assim como a maioria dos revolucionários, os líderes da escola de pensamento da Gestalt exigiam uma completa revisão da velha ordem, quase como “missionários intelectuais difundindo um novo evangelho” (Sokal, 1984, p. 1.257). Wolfgang KóhIer escreveu que “Estávamos eufóricos com o que descobríamos e mais ainda com a perspectiva de descobrir mais fatos reveladores. Além disso, não era apenas a novidade estimulante do nosso empreendimento que nos inspirava. Havia também uma grande sensação de alívio — como se estivéssemos escapando de uma prisão. A prisão era a psicologia tal como ensinada nas universidades quando ainda éramos alunos” (Kõhler, 1959, p. 285). Woffgang Kciliier, treinado em física, estudou a aprendizagem em chiznpanzés e veio a ser um proeminente porta-voz do movimento gestaltista. Depois do estudo da percepção do movimento aparente, os psicólogos gestaltistas estavam ávidos para lançar mão de outros fenómenos da percepção para darem apoio à sua posição. A experiência das constâncias perceptivas lhes deu ampla corroboração. Por exemplo, quando estamos bem em frente de uma janela, uma imagem retangular é projetada na retina; contudo, quando nos colocamos mais para um lado e olhamos para a janela, a imagem retiniana se torna trapezóide, embora continuemos a perceber a janela como retangular. Nossa percepção da janela permanece constante, embora os dados sensoriais (as imagens projetadas na retina) tenham se modificado. O mesmo ocorre com a consciência do brilho e do tamanho; os elementos sensoriais reais podem mudar, mas a nossa percepção é a mesma. Nesses casos, assim como com o movimento aparente, a experiência perceptiva tem uma qualidade de integralidade ou completude não encontrada em nenhuma de suas partes. Existe, pois, uma diferença entre o caráter da percepção concreta e o da estimulação sensorial. A percepção não pode ser explicada simplesmente como uma reunião de elementos sensoriais nem como a mera soma das partes. A percepção é uma totalidade, uma Gestalt, e toda tentativa de analisá-la ou de reduzi­la a elementos provoca a sua destruição: Começar com elementos é começar pelo lado errado; porque os elementos são produtos da reflexão e da abstração remotamente derivados da experiência imediata que são chamados a explicar. A psicologia da Gestalt tenta voltar à percepção ingênua, à experiência imediata.., e insiste que não encontra aí montagens de elementos, mas todos unificados; não massas de sensações, mas árvores, nuvens e o céu. E ela convida todos a verificar essa asserção com o simples ato de abrir os olhos e olhar para o mundo ao redor em seu modo cotidiano comum (Heidbreder, 1933, p. 331). A palavra Gestalt causou consideráveis dificuldades porque não indica com clareza, ao contrário de funcionalismo ou comportamentalismo, o que o movimento representa. Além disso, não tem um equivalente exato em outras línguas. Vários equivalentes de uso comum são forma, totalidade morfológica e configuração, e o próprio termo Gestalt foi incorporado por outras línguas. Em seu livro Psicologia da Gestalt, de 1929, Kõhler observou que a palavra é usada em alemão de duas maneiras. Um emprego denota a forma como propriedade dos objetos; nessa acepção, Gestalt refere-se a propriedades gerais que podem ser expressas por termos como angular ou simétrico, descrevendo características como a triangularidade nas figuras geométricas ou as sequências de tempo numa melodia, O segundo uso denota um todo ou entidade concreta que tem como um de seus atributos uma forma ou configuração especifica. Nesse sentido, a palavra pode referir-se, por exemplo, aos triângulos, e não à noção de triangularidade. Assim, a palavra Gestalt pode servir de referência tanto a objetos como às formas características dos objetos. Por outro lado, o termo não se restringe ao campo visual nem ao campo sensorial total. ‘Segundo a mais geral definição funcional do termo, os processos da aprendizagem, da recordação, dos impulsos, da atitude emocional, do pensamento, da ação, etc. podem ser incluídos” (Kõhler, 1947, pp. 178-179). E é nesse sentido mais amplo da palavra que os psicólogos da Gestalt tentaram lidar com todo o campo da psicologia, como o vemos na palestra a seguir, feita por Max Wertheimer. O material a seguir vem de uma palestra feita por Max Wertheimer na Sociedade Kant em Berlim, Alemanha, em 17 de Dezembro de 1924. Falando de psicologia, filosofia e ciências sociais, Wertheimer assinalou as diferenças entre uma abordagem gestáltica ou total e uma abordagem que envolva a redução do objeto de estudo a elementos. Os pontos específicos discutidos incluem: (1) a definição básica de psicologia da Gestalt; (2) a abordagem wundtiana elementarista ou atomista da psicologia e a tentativa de Ehrenfels no sentido de acrescentar novos elementos; (3) exemplos da abordagem gestaltista das totalidades; (4) a natureza dos campos psicológicos, que são mais do que somas de sensações; e (5) a relação entre mente e corpo (os mundos espiritual e material) e a semelhança, em termos gestaltistas, entre os dois. O que é a teoria da Gestalt e o que ela pretende?... A “fórmula” fundamental da teoria da Gestalt poderia ser expressa da seguinte maneira: existem totalidades, cujo comportamento não é determinado pelo dos seus elementos individuais, mas nos quais os processos parciais são eles mesmos determinados pela natureza intrínseca do todo. A teoria da Gestalt alimenta a esperança de determinar a natureza dessas totalidades. Com essa fórmula, poderíamos terminar, pois a teoria da Gestalt não é nem mais nem menos do que isso. Ela não está interessada em decifrar as questões filosóficas que semelhante fórmula poderia sugerir. A teoria da Gestalt está voltada para a pesquisa concreta; ela não é somente um resultado, mas também um dispositivo; não é apenas uma teoria sobre resultados, mas um recurso para descobertas ulteriores. Não se trata tão-só de propor um ou mais problemas; trata-se também de tentar ver o que de fato está ocorrendo na ciência. Não é possível resolver esse problema relacionando possibilidades de sistematização, classificação e organização. Se o quisermos abordar realmente, devemos ser orientados pelo espírito do novo método e pela natureza concreta das próprias coisas que estamos estudando, dispondo-nos a penetrar naquilo que é efetivamente dado pela natureza.. . Tudo o que posso esperar numa discussão tão breve é sugerir alguns problemas que no momento ocupam a atenção da teoria da Gestalt e algo do modo pelo qual eles estão sendo abordados. Repetindo: o problema não se refere apenas ao trabalho científico — é um problema fundamental da nossa época. A teoria da Gestalt não é algo que nos caiu súbita e inesperadamente de cima; ela é, em vez disso, uma convergência palpável de problemas que envolvem todas as ciências e as várias concepções filosóficas dos tempos modernos. Examinemos, por exemplo, um dado evento da história da psicologia. Alguém, a partir de uma experiência viva, recorreu à ciência e perguntou o que ela tinha a dizer acerca dessa experiência; a pessoa encontrou grande número de elementos, sensações, imagens, sentimentos, atos de vontade e leis que regem esses elementos — e lhe disseram: “Faça a sua escolha; reconstrua a partir deles a experiência que teve.” Esse procedimento criou dificuldades na pesquisa psicológica concreta e levou ao surgimento de problemas que desafiavam a solução pelos métodos analíticos tradicionais. Historicamente, o impulso mais importante veio de von Ehrenfels, que levantou o seguinte problema. A psicologia dissera que a experiência é um composto de elementos: ouvimos urna melodia e, quando a ouvimos outra vez, a memória nos permite reconhecê-la. Mas o que será que nos permite reconhecer a melodia quando ela é tocada num novo tom? A soma dos elementos é diferente, mas a melodia é a mesma; na realidade, muitas vezes nem sequer percebemos que foi feita uma transposição. Quando consideramos retrospectivamente a situação vigente, a nossa atenção é atraida por dois aspectos da tese de von Ehrenfels; de um lado, somos surpreendidos pelo caráter essencialmente somativo de sua teoria e, de outro, admiramos sua coragem em propor e defender sua posição. Estritamente interpretada, a proposição de Ehrenfels era: eu toco uma melodia familiar de seis tons e emprego seis novos tons; mas você reconhece a melodia, apesar da mudança. Havera alguma coisa mais do que a soma de seis tons, isto é, uma sétima alguma coisa, que é a qualidade da forma, a Gestait-qualitãt, dos seis tons origmais. É esse sétimo fator ou elemento que lhe permitiu reconhecer a melodia a despeito da transposição. Por mais estranha que possa parecer, essa concepção partilha com muitas outras hipóteses, mais tarde abandonadas, a honra de ter visto e enfatizado com clareza um problema fundamental. Mas também foram propostas outras explicações. Uma delas afirmava que, além dos seis tons, havia intervalos — relações — e que esses intervalos é que permaneciam constantes. Em outras palavras, pedem-nos que suponhamos não somente elementos como também “relações- entre-elementos” como componentes adicionais do complexo total. Mas esse ponto de vista não deu conta do fenómeno porque, em alguns casos, também a relação pode ser alterada sem destruir a melodia original. Outro tipo de explicação, também voltada para sustentar a hipótese elementarista, foi de que contribuem para esse total de seis ou mais tons determinados ‘processos superiores” que operam sobre o material dado a fim de “produzir” unidade. Tal era a situação até que a teoria da Gestalt fez a pergunta radical: é de fato verdadeiro que, quando ouvimos uma melodia, temos uma soma de tons individuais (elementos) que constituem o fundamento essencial da nossa experiência? A verdade não será talvez o inverso disso? O que de fato temos, o que ouvimos de cada nota individual, o que experimentamos em cada ponto da melodia é uma parte determinada ela mesma pelo caráter do todo. Aquilo que a melodia nos dá não vem (mediante a influência de algum fator auxiliar) como um processo secundário da soma dos elementos como tais. Em vez disso, aquilo que acontece em cada parte individual já depende daquilo que é o todo. A carne e o sangue de um tom dependem desde o começo do papel desse tom na melodia... Faz parte da carne e do sangue das coisas dadas pela experiência como, em que papel, e em que função elas estão no seu todo. Deixemos o exemplo da melodia e voltemo-nos para outro campo. Examinemos o caso dos fenómenos de limiar. Há muito se afirma que um certo estímulo produz necessariamente uma certa sensação. Segue-se que, quando dois estímulos são suficientemente diferentes, as sensações também o serão. A psicologia está repleta de cuidadosas investigações acerca dos fenômenos de limiar. Para dar conta das dificuldades que se encontram constantemente, supôs-se que esses fenômenos têm de ser influenciados por funções mentais superiores, juízos, ilusões, atenção, etc. E isso continuou até que se levantasse a questão radical: é realmente verdadeiro que um estímulo especifico sempre evoca a mesma sensação? Não será possível que as condições totais prevalecentes determinem elas mesmas o efeito da estimulação? Essa espécie de formulação leva à experimentação, e as experiências mostram, por exemplo, que quando vejo duas cores, as sensações que tenho são determinadas pelas condições totais de toda a situação de estímulo. Logo, o mesmo padrão de estímulo físico local pode dar origem a uma figura unitária e homogênea ou a uma figura articulada com partes distintas, todas elas dependentes das condições totais que podem favorecer quer a unidade quer a articulação. Evidentemente, a tarefa consiste em investigar essas “condições totais” e descobrir que influências elas exercem sobre a experiência... O nosso ponto seguinte é o fato de o meu campo compreender também o meu Ego. Não há, desde o início, um Ego em confronto com outros, mas a gênese de um Ego nos oferece um dos mais fascinantes problemas, cuja solução parece residir em princípios da Gestalt. Contudo, uma vez constituído, o Ego é uma parte funcional do campo total. Procedendo como antes, podemos, pois, perguntar: o que acontece com o Ego como parte do campo? Será o comportamento resultante o tipo de coisa fracionada que o associacionismo, a teoria da experiência e outras coisas parecidas nos fazem crer? Os resultados experimentais contrariam essa interpretação; e, mais uma vez, descobrimos com frequência que as leis dos processos totais que operam num tal campo tendem a um comportamento significativo de suas partes. Esse campo não é uma soma de dados sensoriais, e nenhuma descrição dele que considere esses elementos separados primários será correta. Se fosse, para as crianças, os povos primitivos e os animais, a experiência não passaria de sensações fragmentadas. As criaturas mais desenvolvidas do que aquelas teriam, além de sensações independentes, alguma coisa superior e assim por diante. Mas esse quadro total é o oposto do que a pesquisa concreta revelou. Aprendemos a reconhecer as “sensações” dos nossos manuais como resultados de uma cultural ulterior profundamente distinta das experiências dos estágios mais primitivos. Quem experimenta a sensação de um vermelho especifico nesse sentido? Aquilo a que o homem das ruas, as crianças ou os povos primitivos costumam ter acesso é alguma coisa colorida, mas, ao mesmo tempo, estimulante, alegre, forte ou comovente — não “sensações”. O programa para tratar o organismo como parte de um campo mais amplo requer a reformulação do problema no que se refere à relação entre organismo e ambiente. A conexão estimulo-sensação tem de ser substituida por uma conexão entre a alteração nas condições do campo, a situação vital e a reação total do organismo por uma mudança em sua atitude, impulso e sentimento. Há, no entanto, outro passo a ser considerado. Além de ser parte do seu campo, um homem é também um entre outros homens. Quando um grupo de pessoas trabalha junto, raramente ocorre, e, quando ocorre, só em condições multo especiais, que essas pessoas constituam uma mera soma de Egos independentes. Em vez disso, o empreendimento comum costuma tomar-se sua preocupação mútua, e cada uma delas trabalha como uma parte significativamente operante do todo. Consideremos um grupo de habitantes dos Mares do Sul engajados em alguma ocupação comunitária ou um grupo de crianças brincando. Apenas em circunstâncias muito particulares um “Eu” se destaca sozinho. Então, o equilíbrio obtido no decorrer de uma harmoniosa e sistemática ocupação pode ser perturbado e dar lugar a um novo equilíbrio substituto (em certas condições, patológico)... A questão fundamental pode ser formulada de modo bem simples: são as partes de um certo todo determinadas pela estrutura interna desse todo, ou têm os eventos uma natureza independente, fragmentária, fortuita e cega, de modo que a atividade total seja uma soma de atividades parciais? Os seres humanos podem, é verdade, inventar uma espécie de física própria — por exemplo, uma sequência de máquinas — que exemplifiquem a última metade da nossa pergunta, mas isso não significa que todos os fenômenos naturais sejam dessa espécie. Eis aqui um ponto em que a teoria da Gestalt é menos facilmente compreendida; isso porque grande número de preconceitos sobre a natureza tem se acumulado ao longo dos séculos. Considera-se a natureza algo que tem leis essencialmente cegas, em que tudo o que acontece no todo é apenas a soma de ocorrências individuais. Essa concepção foi o resultado natural da luta que a física sempre teve de travar para se libertar da teleologia. Hoje, pode-se ver que somos obrigados a trilhar outros caminhos que não os sugeridos por esse tipo de intencionalismo. Demos mais um passo e indaguemos: qual a posição dissso tudo diante do problema do corpo e da mente? Que valor tem o meu conhecimento das experiências mentais de outra pessoa e de que maneira eu o obtenho? Há, com efeito, velhos dogmas estabelecidos sobre esses pontos: o mental e o físico são totalmente heterogêneos; há entre eles uma dicotomia absoluta. (Partindo disso, os filósofos desenvolveram uma série de deduções metafísicas destinadas a atribuir todas as boas qualidades à mente, reservando à natureza as odiosas.) No tocante à segunda questão, meu discemimento de fenômenos mentais em outras pessoas é explicado tradicionalmente como uma inferência por analogia. Interpretado estritamente, esse princípio afirma que alguma coisa mental se associa inexpressivamente com alguma coisa física. Observo o físico e infiro o mental a partir dele de acordo com o seguinte esquema: observo alguém pressionar um botão na parede e infiro que ele quer que a luz se acenda. Pode haver associações desse tipo. Contudo, muitos cientistas se sentiram perturbados por esse dualismo e tentaram salvar-se recorrendo a hipóteses deveras como sas. de fato, a pessoa comum se recusaria violentamente a crer que, quando vê seu companheiro perplexo, assustado ou encolerizado, vê somente certas ocorrências físicas que em si mesmas (em sua natureza interior) não têm nenhuma relação com o plano mental, estando apenas superficialmente vinculadas com ele: você viu frequentemente isso e isso se combinou.., etc. Têm havido muitas tentativas de contornar esse problema. Fala-se, por exemplo, de intuição, e diz-se que não pode haver outra possibilidade, já que eu vejo o medo do meu companheiro. Não é verdade, alegam os intuicionistas, que eu veja apenas as simples atividades corporais conjugadas inexpresivamente com outras atividades invisíveis. Por mais inadmissível que isso possa ser, uma teoria da intuição ao menos tem uma coisa em seu favor: ela mostra a suspeita de que o procedimento tradicional possa ser revertido com sucesso. Mas a palavra intuição é, na melhor das hipóteses, um nome daquilo que devemos nos esforçar por apreender. Essa e outras hipóteses, entendidas como hoje são, não farão progredir o empreendimento científico, visto que a ciência requer uma penetração fecunda, e não a mera catalogação e sistematização. Mas a pergunta é: em que situação se encontra de fato a questão? Olhando com mais cuidado, descobrimos um terceiro pressuposto, o de que um processo como o medo é uma questão de consciência. Será isso verdade? Suponha que você veja uma pessoa amável ou benevolente. Alguém supõe que essa pessoa se sente piegas? É possível que ninguém possa acreditar nisso. A característica predominante desse comportamento pouca relação tem com a consciência. Uma das mais fáceis invenções da filosofia é identificar o comportamento real de um homem e a direção de sua mente com sua consciência. Diga-se de passagem que, na opinião de muitas pessoas, a distinção entre idealismo e materialismo implica a que há entre o nobre e o ignóbil. Contudo, será que alguém de fato quer, com isso, contrastar a consciência com a alegre floração das árvores? De fato, o que há de tão repugnante no materialista e mecânico? E o que há de tão atraente no idealista? Será que isso provém das qualidades materiais das peças conectadas? Em termos gerais, a maioria dos manuais e teorias de psicologia, apesar de sua permanente ênfase na consciência, são muito mais “materialistas”, áridos e exangues do que uma árvore viva — que provavelmente não tem nenhuma consciência. A questão não é saber quais são os elementos materiais, mas qual é o tipo de totalidade. Operando em termos de problemas específicos, cedo se percebe quantas atividades corporais existem que não dão nenhum indício de urna separação entre corpo e mente. Imagine uma dança, urna dança cheia de graça e júbilo. Qual é a situação numa tal dança? Teremos uma soma dos movimentos físicos dos membros e uma consciência psíquica? Não. É claro que essa resposta não resolve o problema; temos de começar outra vez. E me parece que um ponto de abordagem adequado e promissor foi descoberto. Deparamos com muitos processos que, em sua forma dinâmica, são idênticos independentemente de variações no caráter material dos seus elementos. Quando um homem é tímido, temeroso ou enérgico, feliz ou triste, com muita frequência é possível demonstrar que o curso de seus processos físicos é Gestalt idêntico ao curso seguido pelos processos mentais. Mais uma vez, posso apenas indicar a direção do pensamento. Toquei na questão do corpo e da mente apenas para mostrar que o problema que discutimos também tem seus aspectos filosóficos Isso nos leva mais perto de uma tentativa de apresentar uma concepção do problema tal como ilustrado por suas manifestações específicas em vários campos. Concluindo, posso sugerir uma certa unificação dessas ilustrações mais ou menos da seguinte maneira. Considero a situação do ponto de vista de uma teoria de agregados e pergunto: como deveria ser um mundo em que a ciência, os conceitos, a pesquisa, a investigação e a compreensão de unidades interiores fossem impossíveis? A resposta é óbvia. Esse mundo seria uma multiplicidade de peças díspares. Em segundo lugar, que tipo de mundo deveria haver a que uma ciência fragmentária se aplicasse? A resposta é de novo bem simples, pois basta-nos aqui um mero sistema de associações pareadas repetidas que sejam cegas e fragmentárias em termos de caráter, uru sistema em que todas as coisas estão disponíveis para a aplicação dos métodos fragmentários tradicionais da lógica, da matemática e da ciência em geral, na medida em que estas suponham semelhante mundo. Mas há um terceiro tipo de agregado que só foi investigado superficialmente. Trata-se dos agregados em que uma multiplicidade não se compõe de elementos adjacentes, mas organizada de maneira tal que um termo em seu lugar nesse agregado é determinado pelas leis totais do próprio agregado. Pictoricamente: suponha que o mundo fosse um vasto tablado no qual há muitos músicos. Ando por ali ouvindo e observando os músicos. Suponha primeiro que o mundo seja uma pluralidade sem sentido. Todos agem como querem, cada qual por si mesmo. O que acontece quando ouço juntos dez músicos poderia ser a base da minha conjetura sobre o que todos eles estão fazendo, mas isso é apenas uma questão de acaso e probabilidade, tal como ocorre na cinética das moléculas de gás. — Uma segunda possibilidade seria que, cada vez que um músico tocasse dó, outro tocasse fá, x segundos depois. Eu formulo unia teoria de acoplamentos cegos, mas a execução como um todo continua sem sentido. É isso que muitas pessoas pensam que a física faz; mas o verdadeiro trabalho da física o desmente. — A terceira possibilidade é, digamos, uma sinfonia de Beethoven na qual pudéssemos selecionar uma palte do todo e trabalhar a partir disso rumo a uma idéia do princípio estrutural motivador e determinante do todo. Nesse caso, as leis fundamentais não são elementos fortuitos, concernindo o próprio caráter do evento. Os Princípios Gestaltistas da Organização da Percepção Os princípios da organização da percepção de Wertheirner foram apresentados num artigo de 1923. Ele propôs que percebemos os objetos da mesma maneira como percebemos o movimento aparente, isto é, como totalidades unificadas, e não como aglomerados de sensações individuais. Os princípios de organização da percepção, descritos na maioria dos manuais introdutórios de psicologia, são essenciahnente leis ou regras a partir das quais organizamos o nosso mundo perceptivo. Uma premissa básica desses princípios é que, na percepção, a organização ocorre instantaneainente sempre que vemos ou ouvimos diferentes formas ou padrões. Partes do campo perceptivo se combinam, unindo-se para formar estruturas que são distintas do fundo. A organização da percepção é espontânea e inevitável sempre que olhamos ao nosso redor. Não temos de aprender a formar padrões, como querem os associaciomstas, se bem que a percepção de nível superior, como o é, por exemplo, rotular objetos pelo nome, de fato dependa da aprendizagem. Segundo a teoria da Gestalt, o processo cerebral primordial na percepção visual não é um conjunto de actividades separadas. A área visual do cérebro não responde a elementos separados do que é visualizado, nem vincula esses elementos mediante algum processo mecânico de associação. O cérebro, na verdade, é um sistema dinâmico em que todos os elementos que estejam activos num dado momento interagem entre si; elementos semelhantes ou próximos uns dos outros tendem a se combinar, e elementos distanciados ou diferentes não tendem a se combinar. Vários dos princípios da organização perceptiva são relacionados com Proximidade: Partes que estăo próximas no tempo ou no espaço parecem formar uma unidade e tendem a ser percebidas juntas. . Continuidade: Há uma tendência na nossa percepção de seguir uma direcção, de vincular os elementos de uma maneira que os faça parecer contínuos ou fluindo numa direção particular. Semelhança: Partes semelhantes tendem a ser vistas juntas como se formassem um grupo. Por exemplo os circulos parecem formar uma classe e os pontos, outra, e você tende a perceber fileiras de círculos e fileiras de pontos em vez de colunas. Complementação: Há uma tendência na nossa percepção de completar figuras incompletas, preencher as lacunas. Simplicidade: Tendemos a ver uma figura tio boa quanto possível sob as condições do estímulo; os psicólogos da Gestalt denominaram isso prãgnanz ou ‘boa forma”. Uma boa Gestalt é simétrica, simples e estável, não podendo ser tomada mais simples ou mais ordenada. Figura Fundo: Tendemos a organizar percepções no objecto observado (a figura) e o segundo plano contra o qual ela se destaca (o fundo). A figura parece ser mais substancial e destacar-se do seu fundo, ou seja, a figura e o fundo são reversíveis, você pode ver dois rostos ou uma taça, a depender da maneira como organiza sua percepção. Esses princípios de organização não dependem dos nossos processos mentais superiores nem de experiências passadas; eles estão presentes, nos próprios estímulos. Wertheimer os denominou factores periféricos, mas também reconheceu que factores centrais no interior do organismo influenciam a percepção; por exemplo, os processos mentais superiores de familia idade e atitude podem afectar a percepção. De maneira geral, no entanto, os psicólogos da Gestalt tendiam a se concentrar mais nos factores periféricos da organização do que nos efeitos da aprendizagem ou da experiência. Os Princípios Gestaltistas da Aprendizagem Vimos que a percepção foi o primeiro foco dos psicólogos da Gestalt. Eles assumiram a posição de que a aprendizagem desempenha um papel principalmente nos processos perceptivos de nível superior. Algumas das experiências mais significativas na história da psicologia são as concebidas por Kôhler para estudar a aprendizagem, especificamente a solução de problemas por macacos. Desde o início, os psicólogos da Gestalt se opuseram à concepção da aprendizagem por tentativa e erro de Thorndike, bem como à de estímulo-resposta (E-R) de Watson. Os gestaltistas acreditavam que sua crítica coerente às teorias da aprendizagem associacionista e por estimulo-resposta constituía uma contribuição significativa ao desenvolvimento da psicologia. A concepção gestaltista da aprendizagem está expressa na pesquisa de Kõhler sobre a mentalidade dos macacos e no trabalho de Wertheimer sobre o pensamento produtivo em seres humanos. A Mentalidade dos Macacos Mencionamos a estada de Kóhler na Ilha de Tenerife entre 1913 e 1920, quando ele investigou a inteligência dos chinipanzés tal como demonstrada na sua capacidade de solucionar problemas (Kõhler, 1917). Esses estudos foram realizados nas jaulas dos animais e em tomo delas, e envolviam apetrechos muito simples, como as barras das jaulas (usadas para bloquear o acesso), bananas, varas para puxar as bananas para dentro das jaulas e caixas onde os animais podiam subir. Coerente com a concepção gestaltista da percepção, Kõhler interpretou os resultados dos seus estudos animais em termos da situação como um todo e dos relacionamentos entre os vários estímulos ai encontrados. Ele considerou a resolução de problemas uma questão de reestruturação do campo perceptivo. Num estudo, uma banana era colocada fora da jaula e um barbante amarrado nela era deixado na jaula. O macaco puxava a banana para a jaula com pouca hesitação. Kõhler concluiu que, nessa situação, o problema como um todo era facilmente compreendido pelo animal. Contudo, se vários barbantes fossem da jaula até a direcção geral da banana, o macaco não reconhecia, no início, qual deles puxar para obter a fruta. Isso indicou a Kiihler que o problema não pôde ser compreendido claramente de imediato. Em outro estudo, um pedaço de fruta era colocado fora da jaula pouco além do alcance do macaco. Se se colocasse uma vara perto das barras da jaula diante da fruta, a vara e a fruta eram visualizadas como parte da mesma situação, e o macaco usava a vara para puxar a fruta até a jaula. Se a vara fosse colocada na parte posterior da jaula, os dois objectos (a vara e a fruta) eram vistos de forma menos imediata como partes da mesma situação. Nesse caso, a solução do problema requeria uma reestruturação do campo perceptivo. Outra experiência envolvia a colocação de uma banana fora da jaula, além do alcance, e o posicionamento de duas varas de bambu dentro da jaula. Cada vara por si mesma era demasiado curta para alcançar a banana. Para fazê-lo, o animal tinha de juntar as duas varas (inserindo a extremidade de uma na extremidade da outra) a fim de construir uma vara de comprimento suficiente. Logo, para resolver o problema, alcançando a banana, o animal tinha de perceber uma nova relação entre as varas. Sultão, o macaco mais inteligente de Kchler, fracassou em seu primeiro confronto com essa situação. De início, ele tentou alcançar a banana com uma das varas. Depois, empurrou uma delas o mais longe que pôde, empurrando-a para ainda mais longe com a segunda até que a primeira tocasse a banana. Ele não teve sucesso pelo período de uma hora, mas imediatamente depois do fim da sessão experimental, enquanto brincava com as varas, Sultão resolveu o problema, como conta seu tratador: Primeiro Sultão se agacha indiferentemente sobre a caixa, que tinha ficado um pouco atrás das grades; então ele se levanta, pega as duas varas, senta-se outra vez na caixa e brinca descuidadamente com elas. Enquanto faz isso, vê-se de repente segurando uma vara em cada mão de uma maneira que as faz ficar em linha reta; ele empurra a mais fina um pouquinho para dentro da abertura da menos fina, pula e corre na direção das grades, para as quais até agora estivera quase de costas, e começa a puxar a banana para si com a ajuda da vara dupla (Kõhler, 1927, p. 127). Em tentativas ulteriores, Sultão resolveu problemas semelhantes sem dificuldade, mesmo quando algumas das varas fornecidas não se encaixavam uma na outra. Kohler conta que o macaco nem sequer tentava encaixar as varas inajustáveis. Estudos como esse foram interpretados por Kõhler como evidência de introvisão (in sight), a apreensão ou compreensão aparentemente espontanea e imediata de relações. Noutro exemplo de descoberta independente e simultânea, o psicólogo animal americano Robert Yerkes descobriu evidências em orangotangos para sustentar o conceito. Ele deu ao fenómeno o nome de aprendizagem ideacional. Em 1974, o tratador dos chimpanzés de Kõhler, Manuel Gonzalez y Garcia, então com oitenta e sete anos, contou a um entrevistador muitas histórias sobre os animais, particularmente Sultão, que costumava ajudá-lo a alimentar os outros. Gonzales dava cachos de banana para Sultão segurar. “Então, diante da ordem duas para cada’, Sultão andava pelo lugar e dava duas bananas a cada um dos outros macacos” (Ley, 1990, pp. 12- 13). Um dia, Sultão viu o tratador pintar uma porta. Quando o tratador saiu, Sultão pegou o pincel e começou a imitar o comportamento que observara. Noutra ocasião, o filho mais novo de Kõhler, Claus, estava sentado diante de uma jaula, tentando sem sucesso enfiar uma banana entre as barras. Sultão, dentro da jaula e aparentemente sem fome, virou a banana noventa - Um chimpanzé usa varas de diferentes comprimentos para alcançar um pedaço de fruta e diferentes graus graus para que ela coubesse entre as barras, momento em que Kõhler disse a Claus que Sultão era mais esperto que ele. A solução de problemas e a introvisão diferiam drasticamente da aprendizagem por tentativa e erro descrita por Thorndike e outros. Kõhler criticou com veemância a obra de Thomdike, afirmando que suas condições experimentais eram artificiais e só permitiam o comportamento aleatório do animal. Kõhler alegou que os gatos na caixa-problema de Thomdike não podiam explorar todo o mecanismo de libertação (todos os elementos pertencentes ao todo), razão por que só podiam se comportar em termos de tentativa e erro. Do mesmo modo, um animal num labirinto não pode ver o padrão ou projecto geral, mas apenas cada corredor que encontra; por isso, tudo o que pode fazer é experimentar cegamente seguir por um ou por outro. Na concepção gestaltista, antes de a introvisão poder ocorrer, o organismo tem de ter capacidade de ver os relacionamentos entre os vários elementos do problema. Esses estudos de Kõhler sustentam a concepção molar do comportamento proposta pelos gestaltistas, em oposição à visão molecular promovida pelos associacionistas e comportamentalistas.Essa pesquisa também reforça a ideia de que a aprendizagem envolve a reorganização ou reestruturação do ambiente psicológico. O Pensamento Produtivo em Seres Humanos A obra póstuma de Wertheimer sobre o pensamento produtivo (Wertheimer, 1945) aplicava os princípios da aprendizagem gestaltistas ao pensamento criativo em seres humanos. Ele sugeria que esse pensamento se processa em termos de todos. Não somente o aprendiz considera a situação como um todo como o professor deve apresentar-lhe a situação como um todo. Essa abordagem difere da aprendizagem por tentativa e erro de Thorndike, em que a solução do problema está, num certo sentido, oculta, e o aprendiz tem de cometer erros antes de acertar a trilha correcta. O material do livro de Wertheimer vai da solução de problemas geométricos por crianças aos processos de pensamento do físico Albert Einstein que o levaram à teoria da relatividade. Em diferentes idades e em vários níveis de dificuldade, Wertheimer descobriu provas que corroboravam a ideia de que o problema como um todo tem de dominar as partes. Ele acreditava que os detalhes de um problema só devem ser considerados em relação à estrutura da situação total, e que a solução de problemas deve realizar-se do problema como um todo para as suas partes, e não ao contrário. Wertheimer sugeriu que, se o professor organizasse os elementos dos exercícios em sala de aula de modo a formar todos significativos, a introvisão iria ocorrer. Ele demonstrou que, uma vez percebido, o princípio da solução de um problema poderia ser transferido prontamente para outras situações. Ele atacava as práticas educacionais tradicionais da instrução ou da aprendizagem mecânica, que decorrem da abordagem associacionista da aprendizagem. A repetição raramente é produtiva, argumentava Wertheimer, citando como prova a incapacidade do aluno de resolver uma variação de um problema quando a solução tinha sido aprendida de modo mecânico, e não por meio da introvisão. Ele concordava, no entanto, que materiais como nomes e datas tinham de ser assimilados de modo mecânico por meio da associação e com o reforço da repetição. Ele admitia que a repetição era útil até certo ponto, mas asseverava que seu uso habitual levava a um desempenho mecânico, e não a um pensamento verdadeiramente criativo ou produtivo. O Princípio do Isomoríismo Tendo estabelecido que percebemos totalidades organizadas em vez de feixes de sensações, os gestaltistas se voltaram para o problema dos mecanismos cerebrais envolvidos na percepção. Eles tentaram desenvolver uma teoria dos correlatos neurológicos subjacentes de Gestalts percebidas. Os gestaltistas concebiam o córtex cerebral como um sistema dinâmico em que os elementos activos num dado momento interagem. A ideia contrasta com a concepção mecânica que compara a atividade neural com uma mesa telefônica que liga mecanicamente elementos sensoriais através dos princípios da associação. Nesta última concepção, o cérebro funciona de modo passivo e é incapaz de organizar ou modificar activamente os elementos sensoriais que recebe; ela também implica uma correspondência directa entre a percepção e sua contraparte neurológica. Em sua pesquisa do movimento aparente, Wertheimer sugerira que a actividade cerebral é um processo total confígurativo. Como os movimentos aparente e real são vivenciados de modo idênticos, os processos corticais para os dois têm de ser semelhantes. Supondo que esses dois tipos de movimento sejam idênticos, deve haver processos cerebrais correspondentes a eles. Em outras palavras, para explicar o fenõmeno deve haver uma designacao que é denominado isomorfismo, uma ideia já amplamente aceita na biologia e na química. Os psicólogos da Gestalt compararam a percepção a um mapa, que é idêntico (iso) em forma (mórfico) àquilo que representa, embora não seja uma cópia literal do território. O mapa, no entanto, serve de guia confiável para o mundo real percebido. A posição de Wertheimer foi ampliada por Kohler em seu livro Static and Stationazy Physícai Gestaits (1920). Kôhler considerava que os processos corticais têm um comportamento semelhante ao dos campos de força, sugerindo que, assim como o comportamento de um campo de força eletromagnético em volta de um ímã, os campos de actividade neuronal podem ser estabelecidos por processos eletromecânicos no cérebro em resposta a impulsos sensoriais. Ele fez extensas pesquisas sobre essas ideias como uma fase de um projecto ambicioso para demonstrar que a física, a química, a biologia e a psicologia envolvem, todas elas Gestalts. A Expansão da Psicologia da Gestalt Na metade dos anos 20, o movimento da Gestalt era uma escola de pensamento coesa, dominante e vigorosa na Alemanha, centrada no Instituto de Psicologia da Universidade de Berlim, para onde atraía grande numero de alunos de muitos países. Abrigada numa sala do antigo Palácio Imperial, contava com um dos maiores e mais bem equipados laboratórios do mundo. A revista Psycholagical Research era activa, e os gestaltistas investigavam vários problemas psicológicos. A ascensão dos nazistas ao poder na Alemanha em 1933, com seu violento antiintelectualismo e anti-semitismo e suas acções repressivas, forçou muitos estudiosos, inclusive os líderes da Gestalt, a deixar o país. O movimento passou a ocupar uma posição inferior no sistema académico alemão da época, e o seu centro passou para os Estados Unidos. O trabalho dos gestaltistas os tinha precedido, de modo que eles e suas posições eram bem conhecidos na América quando de sua chegada. A expansão do gestaltismo nos Estados Unidos foi feita através de contactos pessoais, bem como de artigos e livros. Nos primeiros anos do século XX, mesmo antes de a psicologia da Gestalt ser fundada, psicólogos americanos que viriam a se destacar tinham estudado com futuros líderes da escola. Herbert Langfeld, de Princeton, conhecera Koffka em Berlim na primeira década do século e enviara seu aluno Edward Chace Tolman para a Alemanha, onde este serviu de sujeito às primeiras pesquisas gestaltistas de Koffka. Robert Ogden, de Comell, também conhecia Koffla. O pesquisador da personalidade Gordon Allport, de Harvard, passara um ano na Alemanha, onde declarou estar muito impressionado com a qualidade da pesquisa experimental feita pela escola de psicologia da (3estalt. Nos anos 20, alguns livros de Koffka e Khler foram traduzidos para o inglês e resenhados nas revistas americanas de psicologia. Uma série de artigos sobre a Gestalt, escritos pelo americano Harry Helson, publicados na Arnerican Journal of Psychology, também fizeram muito para disseminar o ponto de vista gestaltista nos Estados Unidos (Helson, 1925, 1926). Koffka e Kôhler visitaram os Estados Unidos para dar aulas e conferências em universidades. Koffka fez trinta palestras sobre a psicologia da Gestalt em três anos, e Kõliler foi um dos principais oradores do IX Congresso Internacional de Psicologia, realizado em Yale em 1929. (O outro orador principal foi Ivan Pavlov, no qual um dos chimpanzés de Robert Yerkes subiu.). Embora atraísse atenção nos Estados Unidos, sendo considerada por alguns psicólogos americanos um útil antídoto para o que viam como os exageros do comportamentalismo, a psicologia da Gestalt não encontrou aceitação geral. Por várias razões, seu progresso como escola de pensamento foi relativamente lento. Em primeiro lugar, o comportamentalismo vivia então o auge de sua popularidade. Em segundo, havia o problema da barreira linguistica; as principais publicações gestaltistas estavam escritas em alemão, e a necessidade de tradução retardou a disseminação plena e precisa de suas bases nos Estados Unidos. Em terceiro, como já observamos, muitos psicólogos acreditavam erroneamente que a Gestalt só tratava da percepção. E, em quarto, os três líderes foram para escolas americanas que não tinham programas de pós-graduação, sendo uma dificuldade para eles atrair discípulos que expandissem e divulgassem o movimento. Por essa razão, não havia uma nova geração de discípulos e pesquisadores em treinamento. Temos de considerar isso um factor contextual que restringiu o desenvolvimento da psicologia da Gestalt no país. Contudo, a razão mais importante para a aceitação relativamente lenta da Gestalt nos Estados Unidos foi o facto de a psicologia americana já ter ido bem além das ideias de Wundt e de Titchener. O comportamentalismo era a segunda fase da oposição americana. Por conseguinte, a psicologia americana já estava bem mais afastada da posição elementarista de Wundt do que a europeia. Os americanos acreditavam que os gestaltistas tinham ido para o país protestando contra algo que já não estava em questão. Isso foi perigoso para a escola da Gestalt. Como vimos, os movimentos revolucionários precisam de algo a que se opor, algo para atacar, a fim de sobreviver. Quando perceberam as tendências da psicologia americana, os gestaltistas logo encontraram um novo alvo — a escola reducionista e atomista do comportamentalismo. Os gestaltistas alegaram que o comportamentalismo, à semelhança da psicologia wundtiana, também lidava com abstrações artificiais. Pouca diferença fazia para eles se a análise era em termos de redução introspectiva a elementos mentais ou de redução objetiva a reflexos condicionados; o resultado era o mesmo: uma abordagem molecular, e não molar. Os psicólogos da Gestalt também criticavam a negação comportamentalista da validade da introspecção e sua eliminação da consciência. Koffka alegava não haver sentido em desenvolver uma psicologia sem consciência, como os comportamentalistas tinham feito, porque isso reduzia a psicologia a uma mera coleção de pesquisas com animais. As batalhas entre os psicólogos da Gestalt e os comportamentalistas assumiram tons emocionais e pessoais. Numa reunião social em 1941, quando Clark Huil, E. C. Tolman, Wolfgang Kihler e vários outros psicólogos foram tomar cerveja num bar, depois de um encontro em Filadélfia, Kohler disse a Huil que ouvira dizer que ele costumava insultar “aqueles malditos gestaltistas” em suas aulas. Huil ficou embaraçado — a acusação era verdadeira — e disse a Kohler que questões científicas não deveriam ser decididas com base em alguma espécie de batalha. Kohler disse que “estava disposto a discutir a maioria das coisas de modo lógico e científico, mas que, quando as pessoas se punham a tomar o homem uma espécie de máquina cheia de ranhuras, ele lutava”. Segundo Huil, quando disse a palavra “lutava”, Kohler “deixou o pulso cair sobre a mesa com um barulho ressoante — e ele não sorria quando a disse” (Amsel e Rashotte, 1984, p. 23). Com o tempo, os princípios gestaltistas foram absorvidos nas áreas da psicologia infantil, da psicologia aplicada, da psiquiatria, da educação, da antropologia e da sociologia. Além disso, alguns psicólogos clínicos combinaram a abordagem da Gestalt com a psicanálise. A tendência geral na psicologia americana tem sido considerar os ensinamentos dos psicólogos gestaltistas acréscimos interessantes e potencialmente úteis a outros sistemas, mas não como a base de um sistema abrangente. Os psicólogos americanos têm tentado demonstrar que ocorrem respostas elementares e organizadas e que ambas as respostas são meios proveitosos de explicar processos psicológicos. Para alguns psicólogos, a concepção da Gestalt permanece vital, e ela continua a estimular pesquisas. Já não tem o espirito combativo de uma revolução, mas os seus adeptos trabalham para aprimorar seus pontos básicos. A psicologia da Gestalt não foi totalmente absorvida pela corrente principal da psicologia americana, conservando uma identidade de movimento minoritário. Ela tem exercido uma influência visível em muitas áreas da psicologia, incluindo a percepção, o pensamento, a aprendizagem, a personalidade, a psicologia social e a motivação. A Teoria de Campo: Kurt Lewin (1890-1947). Na ciência do final do século XIX, a tendência era pensar em termos de relações de campo e afastar-se de um quadro de referência atomista e elementarista. Como vimos, a psicologia da Gestalt reflectia essa tendência. A teoria de campo surgiu na psicologia como analogia do conceito de campos de força na física. Na psicologia, o termo teoria de campo refere-se agora quase exclusivamente à obra de Kurt Lewin. Essa obra é bastante gestaltista no tocante à orientação, mas as ideias de Lewin foram além da posição gestaltista ortodoxa. Os psicólogos da Gestalt enfatizavam a percepção e a aprendizagem e propunham construções fisiológicas para explicar o comportamento; o trabalho de Lewin centrava-se nas necessidades e na personalidade e se ocupava das influências sociais sobre o comportamento. Kurt Lewin nasceu em Mogilno, Alemanha, e estudou em universidades de Friburgo, Munique e Berlim. Em 1914, doutorou-se em psicologia pela Universidade de Berlim, onde também estudou matemática e física. Durante a Primeira Guerra Mundial, Lewin foi militar e recebeu a condecoração alemã Cruz de Ferro. Mais tarde, voltou à Universidade de Berlim e se tornou um membro tão produtivo e criativo do grupo da Gestalt que era considerado um colega dos três gestaltistas principais. Fez pesquisas sobre a associação e a motivação e começou a desenvolver sua teoria de campo, que apresentou a psicólogos nos Estados Unidos durante o Congresso Internacional de Psicologia, realizado em Yale em 1929. Quando foi ser professor visitante em Stanford, em 1932, Lewin já era bem conhecido nos Estados Unidos. No ano seguinte, decidiu deixar a Alemanha permanentemente devido à ameaça nazista. Passou dois anos em Comell e, em 1935, foi para a Universidade de Iowa fazer pesquisas sobre a psicologia social da criança. Como resultado desse trabalho, foi convidado a desenvolver e dirigir o novo Centro de Pesquisas de Dinamica de Grupo do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT). Embora tenha vindo a falecer poucos anos depois de aceitar o cargo, seu programa foi tão eficaz que o centro de pesquisas, hoje na Universidade de Michigan, permanece activo. Em seus trinta anos de actividade profissional, Lewin dedicou-se à área amplamente definida da motivação humana. Suas pesquisas enfatizaram o estudo do comportamento huma no em seu contexto físico e social total (Lewin, 1936, 1939). A teoria de campo na física levou Lewin a considerar que as actividades psicológicas da pessoa ocorrem numa espécie de campo psicológico, que ele denominou espaço vital. O campo total compreende todos os eventos passados, presentes e futuros que possam influenciar uma pessoa. Do ponto de vista psicológico, cada um desses eventos pode determinar o comportamento numa dada situação. Assim, o espaço vital consiste na interação das necessidades do indivíduo com o ambiente psicológico. O espaço vital pode revelar graus variáveis de diferenciação, a depender da quantidade e do tipo de experiência que a pessoa acumulou. Como não tem experiências, um bebê tem poucas regiões diferenciadas no espaço vital. Um adulto altamente educado e sofisticado revela, em função de experiências passadas, um complexo e bem diferenciado espaço vital. A teoria de campo de Kurt Lewin tem influenciado o trabalho no campo de outras áreas da psicologia social. Lewin queria usar um modelo matemático para representar sua concepção teórica dos processos psicológicos. Como ele estava interessado no caso particular, e não em grupos ou médias, as estatísticas não tinham utilidade no seu trabalho. Ele escolheu uma forma de geometria chamada topologia para mapear ou diagramar o espaço vital, a fim de mostrar, a qualquer momento dado, os alvos possíveis da pessoa e os caminhos que levam a eles. Para representar a direcção, Lewin desenvolveu uma forma de geometria qualitativa chamada espaço hodológico, em que usava vetores para representar a direcção do movimento rumo a um alvo. Para completar a representação esquemática do seu sistema, ele usou a noção de valências para designar o valor positivo ou negativo dos objectos no âmbito do espaço vital. Objectos que atraiam a pessoa ou satisfaçam necessidades têm valência positiva; objectos ameaçadores têm valência negativa. Essa abordagem da teoria de campo, que foi apelidada de psicologia de quadro-negro, inclui complexos diagramas para representar fenõmenos psicológicos. Para Lewin, todas as formas de comportamento podem ser representadas por um diagrama. Um comportamento simples que ilustra uma situação em que uma criança quer ir ao cinema mas os pais a proibem. Lewin postulou um estado de equilíbrio entre a pessoa e o seu ambiente. Quando esse equilíbrio é perturbado, surge uma tensão (o conceito de motivação ou necessidade de Lewin) que leva a algum movimento, numa tentativa de restaurar o equilíbrio. Ele acreditava que o comportamento humano envolve o contínuo aparecimento de tensão-locomoção-alívio. Essa sequência é semelhante à de necessidade-actividade-alívio. Sempre que uma necessidade é sentida, existe um estado de tensão, e o organismo tenta descarregá-la agindo de modo a restaurar o equilíbrio. A primeira tentativa experimental de testar essa proposição foi feita sob a supervisão de Lewin por Biuma Zeigarnik em 1927. Propôs-se aos sujeitos uma série de tarefas, simplificado de espaço vital, lhes completar algumas mas interrompendo-os antes de poderem terminar outras. Lewin previra que (1) um sistema de tensão se desenvolve quando se propõe a sujeitos uma tarefa a realizar; (2) quando a tarefa é completada, a tensão se dissipa; e (3) quando a tarefa não é completada, a persistência da tensão resulta numa maior probabilidade de que a tarefa seja recordada. Os resultados de Zeigarnik confirmaram as previsões. Os sujeitos se recordaram mais das tarefas interrompidas do que das terminadas. Muitas pesquisas subsequentes foram feitas sobre o que hoje é conhecido como o efeito de Zeigarnik. Nos primeiros anos de sua carreira, Lewin se preocupava principalmente com indagações teóricas, mas a partir dos anos 30 se interessou pela psicologia social. Bastam os seus esforços pioneiros nesse campo para justificar sua posição na história da psicologia. Alguns psicólogos sociais proeminentes associados com Lewin na qualidade de alunos ou colegas no Centro de Pesquisas de Dinámica de Grupo são Dorwin Cartwright, Leon Festinger, J. P. French, Harold II. Kelley, Renais Likert, Stanley Schachter e Alvin Zander. A característica notável da psicologia social de Lewin é a dinâmica de grupo, a aplicação de conceitos relativos ao comportamento individual e grupal. Assim como o indivíduo e o seu ambiente formam um campo psicológico, assim também o grupo e o seu ambiente compõem um campo social. Os comportamentos sociais ocorrem no interior de entidades sociais simultaneamente existentes como subgrupos, membros de grupos, barreiras e canais de comunicação, e delas resultam. Assim, o comportamento do grupo é uma função do campo total existente em qualquer momento dado. Lewin fez pesquisas sobre o comportamento em várias situações sociais. Um experimento clássico envolveu estilos de liderança autoritária, democrática e liberal, e seus efeitos sobre a produtividade e o comportamento de grupos de rapazes (Lewin, Lippitt e White, 1939). Estudos como esse iniciaram importantes novas áreas de pesquisa social e contribuíram para o desenvolvimento da psicologia social. Além disso, Lewin acentuou a importância da pesquisa de acção social, o estudo de problemas sociais relevantes voltado para a introdução de mudanças. Ele se preocupava com os conflitos raciais e fez estudos comunitários sobre os efeitos da habitação integrada sobre o preconceito, sobre a equalização de oportunidades de emprego e sobre o desenvolvimento e a prevenção do preconceito em crianças. Sua pesquisa de acção social transformou problemas como a discriminação e o preconceito em estudos controlados, aplicando o rigor da abordagem experimental sem a artificialidade e a esterilidade do laboratório académico. Lewin também foi fundamental na promoção do treinamento da sensibilidade, que tem sido aplicado a muitas situações no campo da educação e do mundo dos negócios para reduzir os conflitos intergrupais e desenvolver o potencial individual. Seus grupos de treinamento da sensibilidade (grupos T) foram o começo do movimento mais tarde popularizado pelos grupos de encontro. De modo geral, seus programas experimentais e descobertas de pesquisa são mais aceitáveis para os psicólogos do que suas concepções teóricas. É considerável sua influência sobre a psicologia social e infantil e, até certo ponto, experimental. Muitos dos seus conceitos e técnicas experimentais são amplamente usados nas áreas da personalidade e da motivação. Em 1984, realizou-se na Universidade Temple, em Filadélfia, um Simpósio Internacional Kurt Lewin. Que Críticas a Psicologia da Gestalt? As críticas à posição gestaltista incluem a acusação de que os psicólogos da Gestalt tentavam resolver problemas transformando-os em postulados. A organização da percepção consciente, tal como se manifesta no fenõmeno não foi tratada como um problema a requerer solução, mas como um fenómeno que simplesmente existia por si. Alegam os críticos que isso equivalia a resolver um problema por meio da negação da sua existência. Do mesmo modo, afirmou-se que os gestaltistas nunca explicaram as leis do seu sistema. Para muitos psicólogos experimentais, sua posição era vaga, e os conceitos e termos básicos não foram definidos com rigor suficiente para serem cientificamente significativos. Os gestaltistas se defenderam insistindo que as tentativas de uma jovem ciência para explicar e definir têm necessariamente de ser incompletas, mas que ser incompleto não é o mesmo que ser vago. Também se alegou que as bases da psicologia da Gestalt não eram, na realidade, novas — o que de facto é verdade. O movimento gestaltista, assim como outros que discutimos, teve seus antecipadores, mas isso não tem nenhuma relação com os méritos relativos da posição gestaltista. Outros críticos disseram que a psicologia da Gestalt se ocupava demais da teoria em detrimento da pesquisa experimental e dos dados empíricos comprovatórios. A escola gestaltista de pensamento tem orientação teórica, mas também tem acentuado, desde a época de seus fundadores, a experimentação, tendo sido directa ou indirectamente responsável por um considerável volume de pesquisas. Vincula-se com esse ponto a sugestão de que o trabalho experimental dos gestaltistas é inferior ao dos teóricos E-R por lhe faltar controles e porque os seus dados não quantificados não são suscetíveis de análise estatística. Os gestaltistas alegam que, como os resultados qualitativos têm precedência, boa parte de suas pesquisas foi deliberadamente menos quantitativa do que consideram necessário psicólogos de outras escolas. A maioria das pesquisas gestaltistas é preliminar, investigando problemas no âmbito de um outro referencial. A noção de introvisão proposta por Kõhler também não escapou. Tentativas de reproduzir a experiência das duas varas com chimpanzés forneceram pouco apoio ao papel da introvisão. Esses estudos sugerem que a solução símia do problema não ocorre de repente e pode depender da aprendizagem ou de experiências prévias (Windholz e Lamal, 1985). Uma última crítica tem relação com o que alguns psicólogos consideram pressupostos fisiológicos mal definidos e mal sustentados. Os gestaltistas admitem que sua teorização nessa área é conjuntural, mas acrescentam que suas especulações são um útil auxiliar do seu sistema. A psicologia da Gestalt tem inspirado muitas pesquisas, e a validade dos resultados não é diminuída pelo referencial especulativo no âmbito do qual elas são realizadas. Que contribuições nos deixa a psicologia gestaltista? O movimento gestaltista deixou uma marca indelével na psicologia. Tal como outros movimentos que se opuseram a concepções mais antigas, ele teve um efeito revigorante e estimulante sobre a psicologia como um todo. O ponto de vista gestaltista influenciou as áreas da percepção e da aprendizagem, e trabalhos recentes derivados da escola sugerem que o movimento ainda tem contribuições a dar. Ao contrário do seu principal concorrente temporal, o comportamentalismo, a psicologia da Gestalt conserva boa parte de sua identidade distinta, visto que os seus principais pilares não foram absorvidos por inteiro pela corrente principal do pensamento psicológico. Ela continua a estimular o interesse pela experiência consciente como problema legítimo para ao menos alguns psicólogos. Esse foco na experiência consciente não é da variedade de Wundt e Titchener, tendo como centro uma versão moderna da fenomenologia. Os actuais adeptos da posição gestaltista estão convencidos de que a experiência consciente é um facto e tem de ser estudada. Admitem, contudo, que não é possível investigá-la com a mesma precisão e objetividade com que se estuda o comportamento manifesto. São numerosos os defensores europeus de uma abordagem fenomenológica da psicologia, e essa perspectiva está ganhando apoio nos Estados Unidos, podendo-se ver sua influência no movimento da psicologia humanista. Muitos aspectos da psicologia cognitiva devem sua origem à obra de Wertheimer, Koffka e Kõhler e ao movimento que eles fundaram há mais de oitenta anos. Uma Observação Final Caros estudantes do ISEDEF, primeiro Ano do Curso de Psicologia Escolar, se nos diz alguma coisa, a história da psicologia retratada nestas discussões, diz que, quando um movimento é formalizado como escola, ele ganha um impulso que só pode ser interrompido pelo seu próprio êxito na derrubada da posição estabelecida sucessivamente. Quando isso acontece, as artérias desobstruídas do movimento um dia vigoroso e jovem começam a endurecer. A flexibilidade se torna rigidez, a paixão revolucionária se transforma em defesa de uma posição e os olhos e mentes começam a se fechar a novas ideias. Assim nasce uma nova posição estabelecida. E assim é no progresso de toda ciência: há uma construção evolutiva para níveis cada vez mais elevados de desenvolvimento. Não há ponto culminante — nenhum término nem fim —, mas um processo interminável de crescimento, à medida que espécies mais novas se desenvolvem a partir das antigas e tentam se adaptar a um ambiente em contínua mudança. Este curso tem como propósito formar o homem ideal de Moçambique “HOMEM SÁBIO E APRENDENTE SOBRETUDO UM CÉREBRO DE BIOINOVAÇÃO”. BIBLIOGRAFIA www.dr-anly.blogspot.com 1. BOCK, Ana Mercês Bahia. FURTADO , Adair. TEXEIRA, Maria de Lurdes Trassi(2008) .Psicologias, Uma Introdução ao estudo de Psicologia.14ª edição, Saraiva Editores, São Paulo. 2. CAPARRÓS, António.(s/d) História da Psicolgia, 1ª edição, Platano Edições Técnica. 3. DAVIDOFF, Linda,L.(2001) Introdução à Psicologia, 3ª edição.Editora Pearson Makron Books, São Paulo . 4. MUELLER F.L(1987) História da Psicolgia II: A Psicologia Contemporânea I, colecção a saber, 5ª edição , editora Europa/América . 5. MUELLER F.L(1976) História da Psicologia, da Antiguidade a Bergson I, 2ª edição , editora Europa/América. 6. PENNA, A.G..(1981) História das Idéias Psicológicas. Editora Zahar Rio de Janeiro 7. ROSENFELD, Anatol.(2006) O Pensamento Psicológico, Debates, 2ª edição, Editora Perspectiva S.A, São Paulo. 8. RUBINSTEIN, S.L.(1972) Princípios de Psicologia Geral. 2ª Edição Editorial Estampas. Lisboa. 9. WEITEN,WAYNE.(2012) Introdução à Psicologia: Temas e Variações. 4ª Edição. Editora Pioneira Thompson. São Paulo.

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